Razões Ponderosas no PROTAL

Sérgio Martins, Técnico Superior, in barlavento - semanário regional, 01.02.07

O Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) propõe o fim das razões ponderosas para a construção de habitação fora de zonas urbanas. Este regime talvez nem sequer represente 5% das construções aprovadas.

Na minha Freguesia de Santa Bárbara de Nexe (Faro), que não tem tradição de zonas urbanas, caracterizando-se sempre pela habitação dispersa em sítios e pequenos aglomerados, alguns conterrâneos meus, especialmente jovens, por não terem habitação própria, conseguiram construir a sua casa ao abrigo das razões ponderosas.

Mas, muitos também foram os que não conseguiram. O Gilberto casou-se e teve que ir morar para São Brás, o Ricardo com a esposa e filha foi para São Brás, outro Ricardo e a companheira foi para Loulé, o Joel com a esposa e filho foi para o Montenegro, o Didier foi para Loulé. O Celso e o Nelson também correm esse risco. E tantos outros, da minha geração. Tantos outros pelas Freguesias do Barrocal e Serra do Algarve.

Porque não tinham habitação própria, porque a oferta habitacional na Freguesia de Santa Bárbara de Nexe é altamente inflacionada pela sua vocação turística, porque a alguns lhes foram recusadas razões ponderosas.

É um grito de alerta, angústia e revolta por ver os jovens da minha terra, que amam esta Terra de Nexe, que querem cá viver, partirem para outros destinos porque não lhes deixam construir a sua própria casa. E assim se vai perdendo as gentes locais nas aldeias do Algarve, as gentes que mantêm as tradições, as gentes sem as quais as aldeias se vão descaracterizando e perdendo parte da sua atracção turística.

Nem sequer querem construir nos bicos dos serros, mas em terrenos perto de estradas, servidos ou a servir muito brevemente por água e esgotos, em terrenos que por razões várias não têm aproveitamento agrícola e que ficarão ao abandono. Entretanto vão intensificar alguns caos urbanísticos citadinos.

É obvio que sabemos que em alguns casos, mas nenhuns ou poucos nesta Freguesia, terão havido aproveitamentos abusivos das razões ponderosas para construir para negócio. Mas, o PROTAL em lugar de estudar e aplicar mecanismos de salvaguarda, obrigatoriedade, reversão, penalização ou outros que evitem esses abusos, previu simplisticamente proibir a habitação própria e recusar o direito à habitação.

A Junta de Freguesia de Santa Bárbara de Nexe, em período de discussão pública, discordou do PROTAL e propôs cláusulas de excepção, claras e ponderadas na habitação dispersa para pessoas com ligações familiares, profissionais ou culturais à(s) Freguesia(s). A Câmara Faro também discorda, assim como 500 Nexenses num abaixo-assinado. Também porque a prevista, mas muito limitada, ampliação de alguns aglomerados ficará presa sob a inflação da vocação turística da Freguesia e da sua procura por gente com poder aquisitivo elevado para habitações suburbanas.

Vamos ver qual será a proposta final do PROTAL. Vamos ver se a discussão pública não foi em larga medida um simulacro. Vamos ver se o Conselho Regional da CCDR-Algarve não se vai pronunciar sobre a proposta final, que é da sua competência, abrindo-se espaço para a impugnação do PROTAL. Vamos ver se vai imperar uma lógica de muito desconhecimento dos gabinetes das capitais, em Faro ou Lisboa, sobre a vida real das pessoas que habitam fora dessas capitais.

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