"Norte começou a perder peso quando o país chumbou regiões"

Pedro Ivo Carvalho
Entrevista - Guilherme Pinto (Presidente da Câmara de Matosinhos)


Jornal de Notícias
O Governo tem sido acusado de não fazer um esforço para impedir a caminhada do Norte para o abismo. Enquanto autarca, considera-se prejudicado?


Guilherme Pinto
Não. Acho que o Governo tem centrado as atenções na região, nomeadamente nas infra-estruturas. Temos excelentes equipamentos nesse capítulo. As vias estão cumpridas a 80%, temos um aeroporto com muita qualidade... Não vejo qualquer intenção de menorizar a região. O que há é uma suspeita geral, que decorre da prática de anteriores governos, da forma como vai ser distribuído o QREN [Quadro de Referência Estratégico Nacional].

Outra discussão paralela tem sido a alegada falta de liderança. Concorda?

Sim, acho que nos faltam líderes, sobretudo, porque nos falta uma região. Não é possível haver uma região mais coerente sem regionalização. Curiosamente, as épocas em que o Norte mais perdeu coincidiram com os momentos em que havia mais protagonistas. O problema é que falamos muito em direcção a Lisboa, quando devíamos falar mais entre nós.

A situação é catastrófica?

Não creio. Ao nível infra-estrutural, que é o mais importante, não podemos queixar-nos. Falta-nos, porém, um comboio de alta velocidade que ligue a região à Galiza. E falta-nos, principalmente, uma estratégia que nos permita fazer com que o Norte esqueça a competição com Lisboa e se internacionalize.

E sem regionalização não há boa vontade que chegue?

A regionalização é decisiva. Aliás, a região começou a perder peso exactamente no momento em que o país a chumbou. Acho que quem contestou o modelo das oito regiões fez mal, porque era melhor ter algum modelo do que nenhum.

Qual é o seu modelo?

É o das oito regiões, mas defendo sem problemas a solução das cinco. O importante é que se faça. Porque, neste momento, há um hiato. Há quem, em Lisboa, pense os problemas do país; há quem, localmente, olhe para o seu território municipal; e falta alguém que olhe para a região num escalão intermédio.

E a Comissão de Coordenação, nada tem feito?

Carlos Lage está a fazer um excelente trabalho, mas falta-lhe legitimidade política, sem a qual dificilmente conseguirá aglutinar os agentes do Norte.

Diz que a regionalização podia forçar os líderes regionais a falarem menos para Lisboa. Mas não será que esses mesmos líderes perdem demasiado tempo a degladiarem-se?

Mas isso é normal. Tivemos personalidades importantes no Norte, como Fernando Gomes, Vieira de Carvalho e Narciso Miranda, que marcaram uma época. A questão é outra. Mesmo nessa altura, sentia-se que não tinham legitimidade para representar todo o Norte. Mesmo Fernando Gomes não foi muitas vezes secundado nas suas posições. Importante é haver alguém que aglutine as sensibilidades.

Tem alguma sugestão?

O Norte é rico em gente de todos os quadrantes políticos...

... mas vem-lhe algum nome à cabeça?

Ainda não há regionalização, por isso, ainda não abriram as candidaturas. Mas há figuras como Ludgero Marques, Belmiro de Azevedo, Miguel Cadilhe, Valente de Oliveira, enfim, que têm uma presença marcante no Norte e no país.

O PS tem feito tudo para ressuscitar o debate?

Estou de acordo com a estratégia, que é encontrar um momento a seguir a 2009, para colocar a questão na agenda. Não me adianta nada estar a discutir o assunto de novo para o país o chumbar.

Não o preocupa que, além do metro e da Lipor, não haja projectos metropolitanos?

Sim, mas a Junta Metropolitana do Porto (JMP) está a tentar encontrar caminhos comuns, como a Circunvalação e o rio Leça, por exemplo. Só que a JMP tem uma dificuldade grande, desde logo porque os autarcas têm pouca disponibilidade para as políticas municipais.

E o novo modelo das áreas metropolitanas resolvia essa "lacuna"?

É curioso verificar que, no passado, quem entendeu que as juntas não funcionavam apressou-se a vir defender o modelo, o que é um contra-senso. Toda a gente com quem tenho falado nos últimos anos tem a mesma opinião as juntas metropolitanas não funcionam.

Por que motivo?

Desde logo porque, por exemplo, no caso do Porto, a Junta é o resultado de 14 eleições, 14 sensibilidades diferentes, de partidos diferentes, sem tempo disponível. Este modelo faliu. Mesmo agora que na JMP estamos a fazer um grande esforço de congregação de políticas, sabemos que isso está a ser feito sem um calendário generoso. Vamos ter de arranjar outro modelo. Se houver regionalização, não acho possível haver um presidente da junta eleito, porque seria confundir ainda mais a orgânica do Estado. Ter o Governo, um presidente da região eleito, um líder da Junta eleito, os municpios, as freguesias.... Seria um patamar intermédio a mais. Na perspectiva de haver uma região, deixa de fazer sentido uma junta metropolitana eleita. O Governo propôs um bom princípio, um modelo que funcionaria um pouco como os órgãos da União Europeia. Ou seja, ao lado de um Conselho Metropolitano legitimado pela eleição directa dos presidentes de Câmara, haveria uma assembleia que teria a representatividade decorrente da sua indicação das assembleias municipais. A Junta seria o órgão que responderia perante os dois e que teria um líder, com um perfil entre um político e um técnico, que pudesse, com legitimidade, defender os interesses da região.


No princípio, no meio e no fim, a mesma certeza: para Guilherme Pinto, a regionalização pode ser a cura para (quase) todos os males.

Comentários

Anónimo disse…
Uma entrevista trapalhona. Regiões (oito?) sem eleições directas é brincadeira. Poderes delegados pelos municípios? Cozinhado para figuras mediáticas, com tantos interesses junto das autarquias? Assim é chumbo certo. As regiões não são zonas metropolitanas.
Anónimo disse…
Se a Regionalização avançar (Cinco Regiões), não faz qualquer sentido manter as áreas metropolitanas. Estas seriam, como hoje já são, apenas mais uma NUT III, com características específicas, principalmente na área dos transportes.