Regionalização e Equitatividade Territorial



MADEIRA E AÇORES: MAS AUTÓNOMOS PORQUÊ?

Na fundamentação simplista de muitas opiniões negativas sobre o processo de Regionalização é comum invocar-se o mau exemplo da Madeira e do Presidente do seu Governo Autónomo para desacreditar e ridicularizar os futuros órgãos e políticos regionais.

No entanto, ninguém de nenhum quadrante político ousa pôr em causa o actual estatuto autonómico das outrora designadas “Ilhas Adjacentes”. No entanto, há mais do que um motivos fortes para nos interrogarmos sobre esta questão crucial: por que razão foi dado à Madeira e aos Açores o actual estatuto de Regiões AUTÓNOMAS?

Não havendo quaisquer motivos de ordem política, histórica, étnica, religiosa, cultural, ou linguística que suportassem claramente uma tal distinção, só existem duas explicações, ambas muito débeis, para a concessão desse estatuto:

1ª) A Geografia (pelo facto de estes dois Arquipélagos estarem fisicamente separados do restante território nacional);

2ª) A proximidade temporal, histórica e política, com o fenómeno da independência das ex-colónias portuguesas, também designadas então por ex-Províncias Ultramarinas, ou (nos breves anos do consulado marcelista) por “Estados”…

Sendo esta segunda uma razão meramente conjuntural, que se esgotou por si própria com o passar do tempo e a natural consolidação do nosso Estado de Direito Democrático, resta apenas a questão geográfica, tornada porém quase irrelevante com a banalização dos transportes aéreos e a modernas tecnologias de comunicações.

Admitamos, no entanto, que a distância ao Continente constitui um bom motivo para a implementação em concreto de um sistema administrativo muito descentralizado: fará sentido e será política e socialmente saudável que, num Estado unitário e centralizado, essa descentralização assuma a forma de uma AUTONOMIA?

Não teria sido mais correcta a opção por “meras” Regiões Administrativas? Analisemos algumas questões contraditórias e que carecem de solução.

Ao conceder Autonomia às suas Ilhas Adjacentes, o Estado português erigiu estes dois territórios em entidades politicamente mais significantes do que toda e qualquer parcela do seu restante território, continental, para onde continua apenas a providenciar uma Administração Central e uma Administração Autárquica. Por outras palavras: com “meia dúzia” de habitantes e de quilómetros quadrados e sem quaisquer outro motivo que sustente, os Arquipélagos da Madeira e dos Açores constituem, de per si, parcelas de território mais importantes e com maior dignidade institucional do que Lisboa, do que o Porto, do que o Alentejo, do que a Beira, do que o Minho, do que o Algarve, e assim sucessivamente!

Estes dois Arquipélagos possuem, assim, para além de uma representação própria no Concelho de Estado, o direito a constituírem círculos eleitorais próprios para a Assembleia da República e a disporem de total autonomia para gerirem os seus recursos financeiros, quer próprios (os impostos cobrados na Madeira e nos Açores NÃO contribuem para o O. G. E.!!!), quer os que lhe são destinados pelo Governo Central, isto é, pelos contribuintes continentais!!!!

Comparem-se todas estas benesses com, por exemplo, a situação do Norte de Portugal, com quase três milhões de habitantes, ou com a Região da Grande Lisboa, com mais de dois milhões e meio. Será prudente manter por muito mais anos esta singular e gritante disparidade de tratamento?

Pior do que isso, aquilo que foi prodigalizado sem conta nem medida à Madeira e aos Açores não só tem sido negado a todas as restantes parcelas do território nacional, como até uma simples solução de descentralização muito menos arrojada como é a instituição de Regiões Administrativas de carácter exclusivamente autárquico, NÃO-AUTONÓMICO, apesar da muitíssimo maior relevância económica, social, política e demográfica das unidades territoriais do Continente. Será isto sustentável sem a acumulação de tensões graves?

Mais grave ainda, a negação deste direito constitucional fundamenta-se, desde há vários anos, na realização de um Referendo NÃO VINCULATIVO, pelo qual os eleitores de 1998 entenderam rejeitar um projecto de Regionalização para o Continente, mas cuja leitura política legitimaria, no mínimo, que se questionasse a legitimidade do estatuto autonómico dos Açores e da Madeira, dado que foi outorgado SEM A EQUIVALENTE LEGITIMAÇÃO REFERENDÁRIA exigida, anti-constitucionalmente aliás, para a Regionalização do Continente!

Perante todo este imbróglio político, serão de estranhar os problemas de relacionamento crescentes, a um nível já próximo do insuportável, entre as autoridades nacionais e madeirenses?

Que seria de esperar se, de repente a União Europeia concedesse o estatuto de Estado Independente, por exemplo, ao País Basco? Sem a necessária audição dos espanhóis? Ou à Córsega, sem a dos franceses?

Ora as autonomias dos Açores e da Madeira estão sustentadas numa decisão em que não foram ouvidos os portugueses. MAS AINDA VAMOS A TEMPO!

De facto, não parece possível ultrapassar o problema criado sem uma profunda revisão do actual Estatuto autonómico, tido sempre por “irreversível”, dos Açores e da Madeira. O qual pode e deve incluir também a oposta possibilidade de aprofundamento, até ao nível máximo, ou seja, a independência destes territórios, caso seja do interesse dos seus habitantes e também do Povo Português!

Em simultâneo, e por basilares razões de justiça, haverá que equacionar seriamente a que nível deverá ser colocada a descentralização administrativa de todas as restantes parcelas do território nacional, de modo a que se verifique um efectivo equilíbrio entre todas, atentas as suas importâncias relativas.

Isto para ver se, de uma vez por todas, se resolvem os problemas do relacionamento institucional entre Portugal e, sobretudo, a Madeira e se desaparece de vez o fantasma do líder madeirense como FALSO “argumento de peso” na discussão da Regionalização…

Comentários

Obrigado, também pela ilustração...

Um abraço.
Woodworm disse…
Será que o simples facto de serem regiões insulares e ultraperiféricas não o justifica?

Pois é verdade que nós os insulares temos algumas benesses na qualidade de regiões autónomas, mas e as desvantagens?

Será justo que dentro do território nacional uma simples deslocação seja dificilmente conseguida por menos de € 300?

Na qualidade de continental, que provavelmente visita a Madeira por motivos de lazer… se calhar não se notam as diferenças…
Mas na qualidade de “ilhéu” que por vários motivos, necessita de recorrer ao poder central… a coisa muda de figura…

Ora vejamos…

Se todos os processos, qualquer que seja a sua natureza, necessitarem de ir a Lisboa? O tempo que se perde… (tempo é dinheiro…)
Em casos de saúde… ou profissionais… são inúmeros os madeirenses que necessitam de recorrer a instancias continentais por falta de condições e/ou órgãos superiores na ilha…
As dificuldades que sentimos pela falta de espaço para nos expandirmos…?
Os custos de colocar na Madeira tudo aquilo que chega a Portugal continental por via rodoviária… (é o preço de mercado mais o preço do transporte aéreo e/ou marítimo…)

Entre outros inúmeros factores, será que estas razões não justificaram o estatuto das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores?

Em relação à “meia dúzia” de habitantes… será que somos assim tão poucos… uma região com cerca de 260 mil habitantes, que possui uma densidade populacional (cerca de 300 hab./km²) superior à média do país e mesmo da EU… somos poucos, mas existimos...

Ainda existiram dúvidas que a Madeira, depois do Algarve, é dos destinos turísticos mais procurados em Portugal…

Uma coisa é realidade… não temos capacidade de sermos auto sustentáveis… estamos e estaremos sempre dependentes de Portugal continental… mas ainda bem, pois sou um PORTUGÊS com orgulho na minha bandeira… pena é que alguns não sentem orgulho em todos os portugueses…

Mas estamos num país democrático e acho que todos temos direito a uma opinião…

Com os melhores cumprimentos

Bruno
(http://atlanticpearl.blogspot.com/)