Novo Aeroporto de Lisboa

É pena que na reflexão sobre o Novo Aeroporto de Lisboa alguns deixem de fora o futuro do sistema aeroportuário nacional no seu todo. Porto, Beja e Faro também devem contar. O centralismo e o desenvolvimento regional têm tudo a ver com o NAL. Por outro lado, o DN publica hoje que a CIP propõe Alcochete para Portela+1. Propõe a construção faseada de um novo aeroporto em Alcochete e daqui a uns anos chegaríamos à situação de Alcochete+1. Este 1 já seria a Portela. E põe de lado o contra-argumento de uma duplicação de custos porque não se fala de dois mega-aeroportos mas de um que será sempre secundário e com custos muito mais baixos. São temas que por coincidência abordei no artigo que escrevi para a revista Algarve Mais de Agosto.

Novo Aeroporto de Lisboa
Sérgio Martins in revista Algarve Mais de Agosto 007
Debate relançado?
O debate sobre o Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) foi relançado, mas está coxo. As quatro grandes hipóteses - Ota, Alcochete, Portela + 1 ou só a ampliação da Portela - não estão todas em cima da mesa e em pé de igualdade. Nem se vai ponderar o futuro do tráfego aéreo e do sistema aeroportuário nacional.
Cidade aeroportuária
Alguns defendem o encerramento da Portela e um novo grande aeroporto - uma cidade aeroportuária. A Portela, com limitações, já movimenta cerca de 100 000 toneladas de carga e dizem ser necessário um novo espaço de fortíssima ligação internacional onde seja possível fazer chegar e partir mercadorias, serviços e pessoas de todas as partes do mundo, num aeroporto que sirva turistas, viagens de negócios, voos de baixo custo (“low cost”), voos regulares, transporte de cargas, instalação de novas empresas e desenvolvimento de outras. Mil e um fins. Não existem é garantias que todos ou mesmo algum desses fins sejam bem atendidos. Por outro lado, a ANA previa em 1994 que a Portela movimentasse actualmente 160 000 toneladas / ano de carga e estamos 40% abaixo desse valor. Números fantasiosos não ajudam e não é só Lisboa que negoceia. O Aeroporto Sá Carneiro, no Porto, já movimenta cerca de 40 000 toneladas de carga. Todos os dias a Inditex (Zara, etc.) carrega aviões com destino à Europa e Ásia. No Norte está uma parte importante do potencial industrial nacional.
Sistema aeroportuário nacional
O NAL não pode estar desligado das problemáticas do sistema aeroportuário nacional e da política de ordenamento e desenvolvimento do território nacional no seu todo. O conceito de cidade aeroportuária, a única de Portugal, centralizará ainda mais o país na zona de Lisboa, continuando políticas que têm provocado desequilíbrios regionais, desertificação do interior e até apagamento económico do Norte. Queremos fechar grandes partes de Portugal e que a maior parte da população vá morar para a zona de Lisboa? Tal não é solução, desaproveita potencialidades regionais e potencia problemas e caos indesejáveis. O sistema aeroportuário nacional deve ser pensado num todo e à luz do desenvolvimento de todas a regiões do país. Por isso mais do que uma cidade aeroportuária julgo que necessitamos de um sistema aeroportuário moderno e eficiente. O Aeroporto do Porto - Sá Carneiro já revela potencialidades de segunda base / “hub” para a TAP. A valência de carga deve ser uma aposta na Portela ou no NAL, no Porto - Sá Carneiro e em Beja. Esta cidade alentejana e um aeroporto na margem sul do Tejo podem servir as exportações das indústrias de Setúbal e Sines. O Governo vai investir no aeroporto de Beja e deve-se transferir para lá a manutenção da TAP (da Portela) e da Força Aérea e as OGMA (de Alverca), criando-se um novo pólo de desenvolvimento regional.
Ota ou Alcochete?
No entanto se a cidade aeroportuária for realmente indeclinável, desde também que não ameace os aeroportos de Faro e do Porto em nome da rentabilidade dessa cidade, que se compare efectivamente a Ota a Alcochete. Sendo que à partida Alcochete parece oferecer mais vantagens: é mais rápido, mais barato (talvez metade da Ota), mais flexível, com capacidade de expansão (ao contrário da Ota) e no raio de influência da indústria de Setúbal e Sines.
Portela + 1
Mas e se um sistema aeroportuário descentralizado for uma melhor opção? E se em tal sistema couber a alternativa da manutenção e ampliação da Portela e ampliação de um aeroporto secundário em Montijo, Alverca, Sintra ou Alcochete? Na Europa, talvez com a excepção de Atenas e Madrid, com resultados bastante diferentes, tem sido a opção predominante. A Portela para “hub” de voos de ligação, com o apoio do Porto para alguns voos de ligação, mais um aeroporto secundário em Lisboa, bem mais barato, para voos de baixo custo (“low cost”) e carga. Os voos de baixo custo são a maior fatia do crescimento do tráfego aéreo e um aeroporto secundário não terá, de longe, os custos da Portela como alguns dizem quando falam numa suposta (e falsa) duplicação de custos.
Solução 0
Existe ainda a Solução 0. Não construir nenhum aeroporto novo. Em 1999 previram que a Portela iria esgotar entre 2005 a 2008, em 2001 previram que esgotará em 2010, em 2005 que esgotará em 2015… Mas mesmo a previsão de 2015 baseia-se em taxas de crescimento de tráfego pouco prováveis face à assunção de taxas de crescimento económico nacionais e europeias altamente e improvavelmente elevadas e ao descurar do crescimento do custo do petróleo e até a sua eventual escassez. A Portela tem sido e continuará a ser alvo de grandes investimentos até à sua anunciada desactivação. Não parece boa estratégia investir e encerrar, em lugar de aproveitar o investimento. Não faz sentido deitar fora um aeroporto inteiro e todos os investimentos nele. Ainda para mais quando a centralidade da Portela é uma enorme mais valia, com cada vez mais benefícios da evolução tecnológica das aeronaves e de menor geração de poluição e ruído. Porque não utilizar toda a zona adjacente de Figo Maduro (a base da Força Aérea e não só) para uma melhor organização da Portela?
Aeroporto inaugural
Porquê ignorar uma solução de manutenção e ampliação da Portela, com mais um ou sem aeroporto secundário? Se entretanto se vier a verificar a necessidade de um outro grande aeroporto poder-se-á adoptar a solução americana de Chicago de a partir do seu mega e apinhado aeroporto de O’Hare, sem o encerrar, avançar com um “aeroporto inaugural”, só com uma pista e serviços básicos, que crescerá, depois, à medida das necessidades. Ao contrário dos 10 anos de preparação para a Ota, o novo aeroporto de Chicago estará operacional em 5 anos com uma área inicial de 1.600 hectares e uma área reservada para o projecto global de 9.300 hectares e sem que alguma vez fechem o aeroporto de O’Hare.

Comentários

Cuidado com as comparações simplistas: Lisboa não é Chicago, Portugal não funciona como os Estados Unidos!


Esta nova ideia genial do "Aeroporto Inaugural" provém, como todas as geniais ideias do estudo da CIP, do genial Eng.º José Manuel Viegas, que há alguns anos defendia como melhor solução um AIP, Aeroporto Internacional de Portugal, ali para as bandas de Coimbra, ou de Pombal. Aguardemos então mais alguns aninhos pelas novas e geniais ideias deste Eng.º, antes de se tomar qualquer decisão.


Quanto à ideia peregrina de se ir fazendo, em Portugal, um Aeroporto aos poucochinhos, bem, isso faz-me lembrar outras ideias geniais dos Eng.os dos Transportes, como as obras do Metro do Terreiro do Paço, o fecho da CRIL, o Túnel do Rossio, o contínuo alargamento, "às mijinhas", das nossas principais Auto-estradas, já para não falar do pesadelo da Barragem de Alqueva...


Acreditem no que vos digo: se fossem os Engenheiros a decidir o novo Aeroporto de Lisboa, nunca o teríamos a tempo e horas!
Anónimo disse…
Exmo. A. Castanho:

O que penso sobre o tema não tem nada a ver com Engenheiros, nem J. M. Viegas. Tem apenas a ver com uma reflexão sobre o país, os nossos recursos e as nossas necessidades.
Ex.mo sm,


e o que eu penso sobre o tema também.
Ex.mo sm,


e o que eu penso sobre o tema também.
Anónimo disse…
Excelente reflexão, caro Sérgio.
O que defende inscreve-se no plano da racionalidade.

Pelo que tenho lido e reflectido, apesar de não ser um especialista, a solução da Portela (com benfeitorias úteis e necessárias) mais 1 aeroporto secundário modular (primeiro para voos low-cost e transporte de mercadorias), o qual, em função da procura, poderia passar a principal, parece-me ser uma solução muito interessante e economicamente racional. Infelizmente já me parece muito difícil a não construção de um mega Aeroporto na Região de Lisboa, secando ou constrangendo os demais pólos de desenvolvimento nacional. Nós somos bons a pensar em grande e a construir ainda maior, já temos mais dificuldade nos investimentos imateriais ou infungíveis, como sejam na educação, qualificação e investigação aplicada - os resultados só se vêem a médio/longo prazo e nós não aguentamos estratégias que passem pelo planeamento, debate, maturação, controlo, aferição de resultados, correcção de desvios, etc. Em síntese, preferimos o depressa e "bem"... Os resultados estão à vista!
bb disse…
A base área do montijo com um terminal simples e funcional, e um novo terminal na portela no local do figo maduro resolvia o problema.
Lisboa tem um problema de capacidade aeroportuária que tem que ser resolvido em pouco tempo de de forma eficiente. Não é com investimentos milionários. modelo contractual tb é importante. Em vez de dar todos os aeroportos do pais em concessão a um unico operador, é necessário garantir concorrência entre operadores. só assim se garantem investimentos correctos, preços justos e serviços adequados.