Distritos e Inconstitucionalidades

298 por, Oliveira Dias


Dão-nos notícia de um relatório elaborado por uma comissão de missão cujo objectivo é fazer propostas no sentido de se encontrarem soluções de racionalização da administração pública. Esta comissão é liderada por um Madeirense, o Prof. Doutor João Bilhim, actualmente Presidente do Conselho Científico do Instituto Superior de Ciências Sociais e Politicas da Universidade Técnica de Lisboa.

Serve esta pequena introdução para dizer que sendo indiscutível o elevado mérito e rigor científico que se reconhece ao responsável da comissão de missão para a racionalização e modernização da administração pública, sempre existem num ou noutro ponto discordâncias materiais em razão de matéria.

Aquela comissão, entre outras coisas, conclui pela necessidade de se extinguirem 13 Distritos, consequentemente desaparecendo 13 Governos Civis, e manter apenas 5.
Esta é uma questão da maior importância, e impõe-se aflorar os seus contornos, ainda que de forma muito geral.

Efectivamente os Distritos Portugueses estão condenados desde a Constituição de 1976, mas directamente dependente da concretização das Regiões Administrativas. Ora estas foram “chumbadas” em referendo nacional, e o estado das coisas é, actualmente uma lacuna no sistema de Poder Local preconizado na Constituição da República Portuguesa, o que equivale a dizer manter-se uma situação de “Inconstitucionalidade por omissão”.

Se bem nos recordamos o principal diferendo entre os partidos quanto à “Regionalização” foi, à época, o “Mapa” Regional. O consenso foi pois obstaculizado por uma questão de somenos.

Estiveram em confronto várias propostas, desde um mapa com 8 regiões, outras com 10, outras ainda com 5 e não inocentemente, pois esta proposta das 5 regiões visava aproveitar as circunscrições territoriais das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (a CCDR do norte, a do centro, a de Lisboa e Vale do Tejo, a do Alentejo e a do Algarve).

A minha preferência, embora isso não seja importante eram uma de duas ou ressuscitando as Províncias (ainda hoje os continentais oriundos das várias regiões do País se identificam como Transmontanos, Alentejanos, Extremenhos, Algarvios, Minhotos etc), a outra era a divisão em “prateleiras” ligando a fronteira com Espanha ao litoral, de forma a cada região possuir um litoral, onde se concentram a maioria da população continental, e um interior, desertificado e com problemas de interioridade graves.

Ora afigura-se muito obvia a intenção de ao eliminar 13 distritos fazer aproximar as pretensões dos apologistas das Regiões Administrativas aos desígnios de descentralização do governo.

Porém não é possível, nesta matéria, agradar a gregos e a troianos. A redução dos governadores civis, para além de uma poupança ao erário público sem impacto orçamental substancial, não deixa de ser a manutenção do princípio da desconcentração governamental em detrimento de uma descentralização do Estado efectiva tal como o impõe a Constituição.

Não se me afigura que seja uma medida de modernização ou de racionalização administrativa de fundo, na medida em que é meramente conjuntural, e na pratica para os cidadãos implica até um decréscimo da oferta de um serviço, e dou um exemplo: a emissão de passaportes, no Continente é competência dos governos civis, e o cidadão pode requerer um passaporte em qualquer governo civil. Se o passaporte for requerido em Lisboa leva bastante mais tempo a ser emitido do que se for requerido em Santarém.
Mas uma outra questão se levanta a propósito da extinção de alguns Distritos: o artigo 291º da Constituição da República Portuguesa determina que enquanto não se verificar a concretização das Regiões Administrativas, subsistirá a divisão distrital, no espaço por elas não abrangido.

Afigura-se de de regiões as quais não têm forçosamente de “nascerem” em simultâneo. difícil compatibilização constitucional esta proposta de eliminação de alguns distritos, pois segundo aquela sede isso só será admissível (a existência de alguns municípios) por criação

Se o legislador constitucional quisesse permitir ao legislador ordinário extinguir ou até criar novos distritos, ao invés de dispor que subsistiria a divisão distrital, até à criação das regiões, disporia “subsiste uma divisão distrital até à concretização das Regiões”. Daí que a leitura da rigidez do actual mapa distrital se impõe como a mais curial.

Deste modo a proposta da comissão para a modernização e racionalização da administração pública esbarra com preceitos constitucionais, e no caos duplamente: Por um lado porque pela leitura acima defendida não é possível eliminar distritos, porque as Regiões Administrativas não são, ainda, uma realidade substantiva, e por outro lado porque aquela comissão perde uma oportunidade de ouro para propor o avanço no sentido de se criarem as Regiões Administrativas, e dessa forma dar-se forma ao preceito constitucional da descentralização do Estado através, não só das Freguesias e dos Municípios (razão pela qual estas entidades não fazem parte do Estado: A descentralização do Estado pressupõe entregar a terceiros, fora do Estado, Atribuições e competências), mas também das Regiões Administrativas.

E mais aqui se defende ser inconstitucional, à luz da alínea n) do artigo 288º (limites materiais de revisão) a eliminação das Regiões Administrativas do texto Constitucional, como alguns apologistas pretendem, porque a autonomia das autarquias locais não pode ser ofendida, e tudo quanto seja reduzir o sistema configurado no artigo 236º da CRP, que determina serem as autarquias locais, no continente as Freguesias, os Municípios e as Regiões Administrativas, é ofender a autonomia das autarquias locais.

Espero que a lógica que subjaz à proposta de redução dos Distritos não seja a satisfação dos defensores anti regiões. Mas que parece … lá isso parece.
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Comentários

Anónimo disse…
Boa analise, o Dr.BILHIM que desculpe qualquer coisinha.

Mas a lei 56/91?

Eu não me cansarei de pedir esta opinião.


Joaquim Teixeira
Porto
Anónimo disse…
pois parece que sim... os anti-regiões e alguns pró-regiões apenas querem reduzir os distritos para cinco... para criar um mapa sem sentido e ficar tudo na mesma...
Algumas imprecisões de pormenor (quem disse que as Autarquias fazem parte do Estado?!!) não deslustram o essencial deste Artigo muito perspicaz: de facto reduzir os Distritos para cinco é a solução mais óbvia... quando forem implementadas as REGIÕES ADMINISTRATIVAS!


Antes disso é, claramente, comprar o carro antes de tirar a carta...
Corrijo-me (senão nem faz sentido):

"quem disse que as Autarquias NÃO fazem parte do Estado?"


As Autarquias são, evidentemente, parte integrante do Estado, como Administração Local, pois o Estado não se limita à Administração Central, antes integra ambas, MAIS a Administração Regional (como as futuras Regiões e as Autonomias insulares, já existentes, as quais também FAZEM PARTE DO ESTADO PORTUGUÊS!).
Anónimo disse…
Pensava eu que os regionalistas estariam satisfeitíssimos, pelo facto de a grande máquina da regionalização estar em andamento.
É que, sem que se apercebam, a regionalização está quase feita. Um dia destes só falta definir o que fica dependente dos ministérios e o que fica dependente das Juntas Regionais.
O Continente está dividido em CINCO regiões e quase tudo já funciona assim, ou para lá caminha, em passo largo.
Na nova legislatura, não haverá matéria para refendar, porque o trabalho está feito. Finalmente... Felizmente...
Caro Anónimo,

Não estou assim tão optimista. Na minha perspectiva ainda há algum caminho a percorrer.

Cumprimentos,
Anónimo disse…
Sr. Almeida Felizes, já regressaram de Bragança?

se forem boas noticias que venham pela AUTO-ESTRADA, caso contrário que venham pela estrada do SSSS, pelo menos vomitam.

Anónimo 4
Caro Anónimo 4,

Essa de Bragança ... não deve ser comigo!

Cumprimentos,