Normalizar as divisões regionais portuguesas

Eduardo Moura

O silêncio da regionalização



Um dia António Guterres deu uma explicação muito interessante sobre as razões profundas que justificavam o empenho do seu governo no processo de regionalização. Dizia o ex-primeiro-ministro que Portugal tinha uma multitude de regiões que se atrapalhavam umas às outras e, em conjunto, impediam o desenvolvimento coerente do país («mais de três dezenas de modelos de organização territorial do Estado»).

Os tribunais tinham as suas regiões e os militares as deles; os correios, os telefones, as electricidades e as águas tinham cada qual as suas regiões; a educação, as finanças e a saúde tinham também as suas regiões muito próprias; e finalmente, o país político também tinha os seus distritos, uma outra espécie de regiões, enquanto o país estatístico e dos fundos estruturais tinha regiões plano e outras subdivisões estatísticas.


É claro que aceitando esta linha de raciocínio depressa se imaginava que Portugal vivia num caos orgânico. O simples exercício mental de sobreposição dos variadíssimos mapas de regiões conduzia-nos à conclusão pretendida por Guterres: a de que era impossível continuar assim e era necessário normalizar as divisões regionais portuguesas.

Depois veio a alteração constitucional, acordada entre o PS e o PSD, que introduziu o princípio das regiões administrativas e a obrigatoriedade de submeter a constituição das regiões a referendo nacional.

E a seguir veio o referendo carregado de uma imensa celeuma sobre qual a quantidade certa de regiões, quais as suas fronteiras exactas, quais os seus efectivos poderes e a sua relação com os municípios. Além de que muita gente não estava a perceber qual a vantagem de criar um novo patamar de poder, entre o local e o central, com as respectivas eleições, orgãos, instalações e orçamentos. E assim, quando se chegou à altura de ir a votos, a classe política portuguesa estava francamente dividida, partidos contra partidos e militantes do mesmo partido uns contra os outros.

Correram rios de tinta, extremaram-se argumentos, os jornais transformaram o assunto numa prioridade noticiosa. A modernidade do país jogava-se no grande lance da regionalização.

Esta vertiginosa discussão, porém, soçobrou como um baralho de cartas com o resultado negativo do referendo.
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Comentários

Anónimo disse…
1998 foi uma boa intenção, mas os resultados não foram os melhores.

Uma das causas para a recusa da instituição em concreto das regiões foi, concerteza, a insurgência partidária, e principalmente as posições inexplicáveis de alguns partidos (PSD e CDS), que voltaram atrás sem mais nem menos com os seus ideais regionalistas com as justificações incompreensíveis da "manutenção da unidade nacional". Ora bem, não podia ter funcionado mais ao contrário: o novo centralismo em que caímos leva a que muita gente deixe de acreditar cada vez mais no nosso país: há quem o queira até entregar a Espanha, e não é uma corrente assim tão pequena...

Outra das razões para a recusa da Regionalização foi, provavelmente, a morfologia destas. Ninguém me tira da cabeça que contruir regiões desenquadradas dos sentimentos dos Portugueses, apenas pela sobreposição dos distritos, foi um erro de palmatória. Só conseguiremos com que Portugal aceite regionalizar-se se contruirmos um mapa equilibrado. Um mapa que satisfaça as necessidades administrativas e promova as autonomias, um mapa com regiões homogéneas e equilibradas entre si, que atenue o fosso litoral-interior. Um mapa que não satisfaça os interesses de certas cidades (em 1998, foi proposta a Região de Lisboa e Setúbal: porquê?), em deterimento do que realmente importa, que é Regionalizar e promover uma coesão entre as várias regiões do nosso país, acentuando os contrastes. E, acima de tudo, um mapa que se baseie na junção de províncias tradicionais, com que os portugueses mais se identificam. É preciso ter muita atenção à questão dos limites, pois é necessário ouvir as populações e os autarcas antes de avançar, através de debates e palestras: foi a questão dos limites um dos maiores factores que levou à rejeição das regiões de 98. Por isso, sem arrogâncias, proponho democraticamente a divisão em 7 Regiões, tal como demosntrei em posts anteriores (onde podem ver inclusive os mapas que preconizam estas divisões).

Há quem diga que são regiões a mais, que se criariam mais tachos,ao que eu posso responder que, comparativamente com o que acontece actualmente, com a confusão de divisões que o nosso país tem, conseguiríamos reduzir muitos e muitos "tachos" (directores regionais para isto e para aquilo, comissões de coordenação regional, e outros organismos que poderiam ser fundidos e/ou reestruturados) com a uniformização das divisões em 7 regiões (hoje existem regiões e sub regiões educativas, judiciais, agrárias, turísticas, estatísticas, já para não falar nas Associações de Municípios, todas com divisões diferentes entre si.).

Porque Portugal precisa da Regionalização para se modernizar e conseguir apanhar o comboio da Europa entes de ele sair da plataforma.

Pela Regionalização
Anónimo (Beira Interior).
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Perante tudo o que vem sendo escrito e, por maioria de razão, neste "post" de Eduardo Moura, o único critério de uniformização das "divisões regionais portuguesas" é o do INTEGRAL RESPEITO PELA DIVERSIDADE DAS 7 REGIÕES AUTÓNOMAS NO CONTEXTO NACIONAL E UNITÁRIO, a partir das 11 Regiões Naturais ou Históricas, exactamente aquelas que melhor se identificam com as populações e as podem MOBILIZAR.
A versão das 5 Regiões Administrativas é como a noiva que vai muito contrariada para um casamento pré-combinado para defesa "pragmática" de interesses fortunais, sem nunca ter tido pelo noivo aquela afeição profunda desencadeada pela paixão dos íntimos concordantes e compatíveis.
A tal afeição que permite, por exemplo, uma apreciação do tipo seguinte:

"Ler"

Ter um livro para ler e não ler
Se contentava assim Pessoa
Mas não lhe deu para ver e saber
Quer ler tem cara e coroa

A cara é a face nobre
Do conhecer e a coroa
Muitas vezes sina do pobre
Na vida que tanto magoa

Mas, melhor ainda, por tudo
É ler a riqueza d'um rosto
Belo sem se mostrar sisudo

Deixar ler nos olhos o gosto
Dum sentir vindo só da alma!
Já o li! Como tudo acalma!

(Manuel de Tormes)
FEP, 2008.

Estão a ver como gostaram? Até pelo enigma de tudo isto. Este soneto é a diversidade na unidade do olhar, como alguns já perceberam.
Peço-lhes que não se distraiam, com o final lírico, para se concentrarem no ESSENCIAL: o facto 100% compatível da diversidade regional na unidade nacional só poder ser assegurado pela criação e implementação das 7 REGIÕES AUTÓNOMAS.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Como costuma dizer um defensor convicto da regionalização, o Professor Doutor Nuno Grande: "QUEM SABE SÓ DE MEDICINA, NEM DE MEDICINA SABE"; a bem dizer, é mesmo assim.
templario disse…
CARO pro-7RA.,
Gostei do soneto.

Quanto às 7 "Regíões Autónomas", alistava-me na tropa.

Cumprimentos
Anónimo disse…
Caro Templário,

Os meus agradecimentos pelo gosto manifestado pelo soneto.
Na tropa, já estive, há anos. Agora, nem sequer é preciso para os fins que então me foram propostos, nem para outros.
Por isso, para as 7 Regiões Autónomas, basta um "casamento falhado" que é o que vai acontecer, com divórcio nada pacífico (bem, ver vamos se o casamento não se consuma e a noiva encontre o noivo de quem realmente goste).

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)