Revisitar Ideias


Luís Filipe Menezes
Publicado em 6/Abril/2006 no
http://luisfilipemenezes.blogspot.com/


OPORTUNIDADE PERDIDA

O debate sobre a regionalização foi reaberto da pior maneira. De um lado, o governo socialista a dar a entender que vai avançar com esse processo, mas de uma forma ínvia, disfarçada e envergonhada. No outro extremo, os habituais defensores do templo centralista, que nem precisam de argumentar. Basta-lhes a notoriedade que lhes oferecem os media que detestam a ideia e o esgrimir de meia dúzia de lugares comuns requentados. Tudo isso, encenado com um ar preocupado e indignado.

É pena. O tema merecia ser revisitado e debatido com serenidade e abertura de espírito.

Ninguém contesta a necessidade de desconcentrar a administração, contudo, tal reforma exige a pré-definição de fronteiras regionais coerentes. Um nosso concidadão da região da Beira Douro, tem de ir a Vila Real quando se trata de ir a um hospital central, a Viseu requerer o passaporte, a Lamego tratar da reforma ou da pensão e ao Porto para desbloquear a colocação do familiar professor do Ensino Básico! Este absurdo só poderá ser contornado quando a transferência de funções e responsabilidades da Administração Central se concretizar de acordo com uma lógica coerente.

Se os organismos desconcentrados da Administração estivessem a ser revitalizados de acordo com o modelo das cinco regiões administrativas, quantos dos agora famosos "custos de contexto" se traduziriam em poupança real? E se houvesse a ousadia de os sediar em Trás-os-Montes, no caso da região Norte, na Beira Interior, no caso da região Centro, no Ribatejo ou península de Setúbal, no caso da região de Lisboa e Vale do Tejo, na margem esquerda do Guadiana, no caso do Alentejo, ou, no Interior Norte do distrito, no caso do Algarve, o que aconteceria?
Estou convicto de que se poderiam transformar em âncoras incontornáveis, talvez as únicas possíveis, de processos de regeneração do interior. Com fixação de população, atracção de investimento e criação de riqueza.

A definição, por agora sem compromissos fechados, de um modelo de organização regional, impediria ainda que se consolidassem as loucuras decorrentes da criação a esmo de associações de municípios estruturadas sem ter em conta qualquer tipo de ligação à ancestralidade das nossas províncias e distritos. Essa "regionalização" sub-reptícia está perigosamente no terreno. Multiplicando mordomias, carros pretos, motoristas, secretárias, burocracia e despesa.

Quem vai esfregando as mãos são os nossos vizinhos do lado. As regiões espanholas transfronteiriças, com projectos de desenvolvimento definidos e estrategicamente dirigidos, vão colonizando a nossa raia. Tudo perante a inoperância de um contra poder frágil, fraccionado entre autarcas, funcionários transitórios das CCDR e membros do governo intermitentemente interessados num interior onde "não abundam os votos". Os governos das regiões espanholas reinam perante uma crónica falta de interlocutor do lado de cá da fronteira.

Infelizmente, ao contrário de um debate responsável, resvalamos de novo para a demagogia do confronto político partidário puro e duro. E pena, perdemos todos. É Portugal que perde.
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Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas e Centralistas,

O que aqui está escrito está correcto, mas não justifica nem explica a implementação das regiões administrativas, através do método "como quem não quer a coisa" de descentralização de problemas em vez de competências. Muito menos assim às "pinguinhas", sendo inevitável que não se conseguirá obter resultados positivos em termos de REGIONALIZAÇÃO.
Mas neste revisitar de ideias, aconselho vivamente que continuem a ler os meus "posts" anteriores e os de outros defensores das Regiões Autónomas, para confirmar que, se estas regiões não vierem a ser implementadas nas condições em que repetida e convictamente propomos, os desequilíbrios no exercício das competências políticas regionais, no reforço das dinâmicas política, económica e social das regiões e na operacionalidade inter regional transfonteiriça irão acentuar-se consideravelmente.
Por último, os políticos habituaram-se a afirmar que "é Portugal que perde", para eu preferir escrever que são as Regiões Autónomas que perdem com o perigoso acentuar das assimetrias regionais que já retalharam e continuam a retalhar PORTUGAL, para além de nos enfraquecer perante a modernidade e a pujança das REGIÕES AUTÓNOMAS ESPANHOLAS.
Tudo isto é de uma grande tristeza mas é a verdade actual e, muito provavelmente, futura, para nossa grande desgraça.

Assim não venha a ser, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Eu não dizia que, no 2º. assalto, as Regiões Administrativas iam entrar na sua plenitude de "tratamento político"!
Anónimo disse…
Uma ideia a ser revisitada: as benesses da Regionalização para Portugal.

Apesar da lógica centralista que assolou e assola este país há séculos, houve, como já disse anteriormente, algumas "lufadas de ar fresco" que permitiram às restantes regiões uma certa expansão. Um bom exemplo disso é a Junta das Obras Públicas, que passo a expor:

-A Junta das Obras Públicas (1763-1804) foi uma entidade criada pelo rei D. José I que, com amplos poderes, era responsável pela promoção e controlo da urbanização do Porto, em Portugal, e que operou uma autêntica revolução na cidade. À frente dos destinos da Junta das Obras Públicas estiveram João de Almada e Melo e o seu filho Francisco de Almada e Mendonça.

-Criada por iniciativa do Marquês de Pombal, primeiro-ministro do rei D. José I, em 1763, a Junta de Obras Públicas estendeu ao Porto as medidas de excepção então em uso em Lisboa para reconstruir a cidade na sequência da devastação do Terramoto de 1755.

-A acção da Junta introduziu uma abordagem racional na concepção da cidade, defendendo aspectos como a luz, a higiene e a salubridade. Segundo estes novos conceitos urbanísticos, as construções deviam obedecer a planos rigorosos em que se privilegiava o conjunto arquitectónico e não o edifício isolado. O risco das novas ruas era acompanhado pelo desenho dos alçados a edificar. Estas áreas constituem, ainda hoje, paradigma de coerência e equilíbrio na relação rua-conjunto edificado.

-O plano almadino pretendia renovar a cidade antiga e ordenar o crescimento para fora da Cerca Fernandina que, sobretudo desde meados do século XVII, estava a realizar-se de uma forma espontânea e caótica. Visava ainda redefinir as principais vias de acesso tornando-as desafogadas. São disso exemplos as Ruas de Cedofeita, de Santa Catarina, Direita (hoje de Santo Ildefonso), do Reimão (actual Avenida Rodrigues de Freitas), dos Quartéis (agora Rua de D. Manuel II), a Calçada da Natividade (Rua dos Clérigos), a Rua Nova das Hortas (troço inicial da Rua do Almada), o Passeio das Virtudes.

-O plano urbanístico de João de Almada para a cidade do Porto - um dos primeiros planos de conjunto a aparecer na Europa - criou um novo e importante eixo citadino que partia da Praça da Ribeira, seguia pela Rua de São João, Largo de São Domingos, Rua das Flores, Rua Nova das Hortas e Rua do Almada até ao Campo de Santo Ovídio (actual Praça da República).

-A segunda metade do século XVIII foi também a época da construção de grandes edifícios representativos da arquitectura neoclássica de influência inglesa que se prolongaria ainda pelo século XIX:

-Casa da Feitoria Inglesa
-Edifício da Cadeia e Tribunal da Relação
-Hospital de Santo António
-Edifício da Real Casa Pia, mais tarde ocupado pelo Governo Civil
-Edifícios do lado poente da Praça da Ribeira
-Arcos abertos no "Muro da Ribeira"
-Edifício da antiga Real Academia da Marinha e do Comércio, hoje Reitoria da Universidade do Porto
-Igreja dos Terceiros de São Francisco, ao lado da Igreja de São Francisco
-Igreja da Lapa
-Igreja da Trindade
-Igreja de Nossa Senhora da Vitória
-Edifício da Alfândega Nova
-Convento de Santo António da Cidade, hoje edifício da Biblioteca Pública Municipal do Porto.

(retirado de http://pt.wikipedia.org/wiki/Junta_das_Obras_P%C3%BAblicas)

Em suma, foi graças a esta junta, e à atribuição de amplos poderes a gentes do Porto, que esta cidade se desenvolveu, e passou em menos de 50 anos, de um burgo medieval para a cidade que hoje conhecemos. 40 anos chegaram para desencravar o que estava encravado há quase quatro séculos. Isto passou-se no Porto. Agora imaginem o que se passaria em Portugal se a regionalização tivesse sido implementada nos anos 70. Já lá vão 30 anos, quase tantos quantos durou a Junta das Obras Públicas. Nos próximos tempos, tentarei apresentar mais exemplos do que as (infelizmente, poucas) manifestações regionalistas fizeram por Portugal.

REGIÕES JÁ!

Anónimo (Beira Interior), pelas 7 Regiões
Anónimo disse…
bibam e escrebem mesmo bem, Carago.
bale a pena bir aqui.