Perspectiva Municipalista

Regionalização e Pátria


Existe desde há longo tempo um debate, uma decisão pendente em Portugal: a de saber se a estrutura central do Estado deve ser quebrada, e se as suas competências devem ser distribuídas pelas periferias.

Recentemente, no fátuo e trágico-cómico governo Santana Lopes assistimos até a uma encenação teatral com a transferência de alguns ministérios para fora do Terreiro do Paço.

Mais recentemente, assistimos a um aumento de volume das pressões dos movimentos e lobies regionalistas a favor de uma retomada do referendo pela regionalização e pela repartição do País em cinco regiões administrativas, decalcando o modelo das já existentes CCRs (“Comissões de Coordenação Regional”).

Existe portanto uma certa “tensão regionalista” na actualidade. E assim, importa saber se esta mesma tensão poderá ameaçar a própria estabilidade, coesão e sobrevivência do Estado português, ou se pelo contrário, a poderá ameaçar. E, em segundo lugar, importa também determinar se existe modelos de regionalização alternativos a este modelo de “cinco regiões” que nos procuram impor.

Quando na década de cinquenta, o economista austríaco E. F. Schumacher recebeu do governo britânico a missão de estudar formas de aumentar a eficácia e o rendimento da então indústria do carvão britânica, ... concluía que quanto menores fossem as organizações económicas de produção, menores seriam os seus desperdícios e ineficiências e maiores seriam os seus dinamismos, criatividade e rendimento.

Não é impensável estabelecer um paralelismo entre estas conclusões e os benefícios que poderiam resultar de uma distribuição dos poderes e competências alocadas actualmente ao Estado central por entidades regionais ou de um outro tipo, menores, mais distribuídas pelo território, e logo, necessariamente mais próximas das populações e com maiores capacidades para re-potenciar a adormecida dinâmica democrática e participativa das populações

Mas esta distribuição, esta descentralização radical iria afectar a estrutura e a viabilidade do próprio “Estado Central”? É uma questão importante e que é tanto mais vital, quanto Portugal é um dos Estados mais centralizados da Europa e igualmente um dos raros Estados europeus que não resultaram da congregação – por anexação ou união pacífica – de diversas entidades nacionais separadas, mas o único Estado cujas fronteiras coincidem com a da Nação e da Língua.

Isto é, Portugal tem essa idiossincrasia rara que é a de encerrar em si mesmo uma Língua, uma Nação e…um Estado. Descentralizar iria destruir esta características única e idenditária da Portugalidade? Não nos parece que tal risco pudesse ocorrer… Desde logo, porque estas características únicas não nasceram hoje. Isto é, são primordiais e quase tão remotas como a própria nacionalidade, com excepção única para a anomalia que é Olivença e para a proximidade linguística e cultural que ainda hoje é evidente com a Galiza.

Portugal já se assumia como uma entidade nacional, cultural e linguística no século XI, e nessa época – por necessidades decorrentes da própria tecnologia da época – existia uma forte descentralização administrativa e a influência centralizadora só começou a impor-se entre nós com a importação das concepções de Maquiavel e sobretudo, a partir dos reinados de Dom Manuel I (sobretudo com a reforma manuelina dos forais) e com o governo de um dos mais prejudiciais dos monarcas portugueses: o ultra-católico e centralista Dom João III.

Se Portugal, já era “Portugal” num Estado profundamente descentralizado, em que as competências judiciais, penais, fiscais, administrativas e até militares estavam nas mãos dos Concelhos, então porque estaria ameaçada a própria coesão do Estado se este modelo municipalista de descentralização administrativa fosse reinventado?

Esse risco existe contudo, se em lugar de um modelo de uma descentralização regional assente no reforço e na delegação de poderes e competências nos municípios ocorresse uma forma diversa de descentralização que dividisse artificialmente, sem fundamentos nacionais, linguísticos, culturais ou étnicos um dos territórios mais homogéneos e coesos da Europa. Forjada apenas para servir interesses partidários de partilha de Poder e de divisão de cargos políticos, esta divisão arriscar-se-ia a criar o mesmo tipo de caciquismo regionalista cuja expressão mais acabada pode hoje ser encontrada naquele tipo de “democracia limitada” que encontramos na região autónoma da Madeira.

De facto, a situação política madeirense é o melhor argumento possível para rejeitar uma regionalização regionalista… Dado que uma descentralização municipalista ainda que pudesse criar a ascensão de novos Valentins e Felgueiras, nunca os deixaria atingir o mesmo grau de protagonismo e a mesma extensão de Poder que uma figura como Alberto João Jardim detêm na ilha da Madeira.

no "Quintus"
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Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Jà admiti a hipótese de terem consultado este "blogue", logo pela manhã, para verificar se algum texto comentário teria sido dado não à estampa mas ao virtual, com a assinatura deste vosso confrade.
Desta vez, a "coisa" retardou-se um pouco não porque tivesse sido arremetido de dúvidas demolidoras mas pelo simples facto de, com um grupo de amigos de infância, às
5ªs. feiras beneficiar de uma das únicas infraestruturas activamente pró-ambientais como o Parque Biológico de Vila Nova que convido a que o visitem sempre que puderem. Esta foi sem dúvida uma decisão municipalista de grande envergadura política para o Município, e não só, de onde sou natural e onde felizmente resido.
Relativamente ao municipalismo exortado pelo "Quintus", é muito importante que esta componente da regionalização exerça as suas funções políticas da forma mais alargada possível, sem prejuízo de todas as acções que possam ser desencadeadas, a nível regional, que favoreçam e concretizem os objectivos ou designios nacionais a prosseguir por todas as Regiões Autónomas (7), lembrando:
1) Desenvolvimento Económico e Social
2) Conhecimento e Tecnologia
3) Equilíbrio Social
A regionalização conforme é proposta nas 7 Regiões Autónomas não é incompatível com o exercício de competências alrgadas dos municípios nas diferentes diferentes e cada vez mais exigentes dimensões políticas.
Já mais de uma vez aqui se referiu que todo o complexo processo político da regionalização tem os seus riscos assentes em exageros ou "disfunções" de alguns dos protagonistas (centralistas, regionalistas ou municipalistas, abrange todos) que vierem, por influência partidária e por voto, depois, a ser chamados a exercer funções políticas regionais e municipalistas. Mas este risco terá sempre que se correr, independentemente das soluções que vierem a ser implementadas. Contudo, gostaria de chamar a atenção para o facto de, estando já "tudo definido" em termos orgânicos com base nas 5 Regiões Administrativas (como dizem alguns, a esfregar as mãos de contentes), também com elevada probabilidade prevejo que estarão já escolhidos os "protagonistas" para a fase de "cruzeiro" da regionalização. Se assim for, não pensem que existirá uma espécie de cobertura total para os riscos a correr por quaisquer "desvios" face aos objectivos políticos que a regionalização deverá prosseguir.
Tais objectivos são os seguintes, repito:
1) Desenvolvimento económico e social
2) Conhecimento e tecnologia
3) Equilíbrio social
Como sabem, pelas opiniões que tenho expresso aqui, tais objectivos correspondem igualmente a altos desígnios nacionais que nenhum político até hoje teve a clarividência e a coragem de os expôr às populações, por serem de natureza permanente estrutural e até HISTÓRICA.
Por estas características, reconheço e defendo a solução das 7Regiões Autónomas como a mais adequada para garantir a prossecução daqueles objectivos políticos associados a altos desígnios nacionais, aliada a competências e práticas municipalistas reforçadas com peso, conta e medida (isto é, completas). Mais uma vez sugiro que consultem o "site" da Ordem dos Economistas, no tema "Economia Regional" e no trabalho "As Regiões Autónomas" (o regresso às origens como solução para o desenvolvimento)
E alerto ainda para o facto de, ao referir "SOLUÇÃO", se pretender significar "RESOLVER O PROBLEMA" e nunca o habitual e nada sério EMPALEAMENTO, cujos protagonistas são a resultante directa do "VOTO PELA POSITIVA".

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Os mais atentos já repararam que coloquei os centralistas entre os regionalistas e os municipalistas, apenas com a finalidade de os "ensanduichar"; não é neutralizar, mas com os nossos argumentos, procurar que iniciem o percurso regionalista connosco, ao nosso lado e sempre para a frente.
Suevo disse…
Este texto é uma aberração, mas como é uma aberração oficial até estamos habituados a ler isto.

“É uma questão importante e que é tanto mais vital, quanto Portugal é um dos Estados mais centralizados da Europa e igualmente um dos raros Estados europeus que não resultaram da congregação – por anexação ou união pacífica – de diversas entidades nacionais separadas, mas o único Estado cujas fronteiras coincidem com a da Nação e da Língua.”

Que é o mais centralizado está correcto, quanto ao resto faz-nos rir, realmente o estado português não surgiu de uma união pacifica, foi muito pior que isso, surgiu de CONQUISTAS MILITARES e À FORÇA. Alguém explique a este jovem ou menos jovem o que eram a Taifa de Badajoz ou o Califado de Córdoba, e onde surgiu a LINGUA e a NAÇÃO (não confundir com estado).

“Portugal já se assumia como uma entidade nacional, cultural e linguística no século XI”

Aqui esta-lhe a fugir o teclado para a verdade, esquece-se é que na tal entidade nacional não estavam incluídos territórios a sul de Coimbra, e tal entidade nacional estava mais próxima de todo o norte de Espanha do que de todo o Al-Andaluz, incluída como é obvio a Taifa de Badajoz.

Nisso há que dar mérito aos povos dos Balcas, apesar de estarem geograficamente unidos há séculos, os e albaneses ainda são albaneses, e os sérvios ainda são sérvios.
Por aqui e graças aos patriotas lusos/lusófonos é tudo português, sejam negros, ciganos ou timorenses, deve ser essa a característica pseudo-identitaria que o autor do texto mais deve admirar, o que é coerente num patriota.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Aquela entidade nacional, cultural e linguística nunca virão a ser postas em causa pela regionalização, especialmente pela versão nossa preferida e recomendável das 7 Regiões Autónomas.
Aquela entidade não resultou de uma "anexação" pacífica de território e populações, mas de uma política de guerra e de (re)conquista, à semelhança do que aconteceu em Espanha. Mas aquela entidade, por via dos descobrimentos e/ou da facilidade de "adaptação" dos nossos antepassados a novos territórios e, sobretudo, a novas populações, a Nação portuguesa nunca soube preservar a sua unidade "étnica", hoje em dia bastante mais difícil de preservar por motivos relacionados com uma grande mobilidade das populações (tendencialmente, passaremos a ser mais Estado que Nação). Isto acontece um pouco por todas as potências coloniais daquela época descobridora e seguintes, activas (Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda) e passivas (EUA, e América Latina, etc.).
Este problema do esbatimento progressivo da unidade´"étnica" dentro dos países europeus, mais nuns países que noutros, complementado pela redução dos índices de natalidade étnica europeia, irá condicionar o futuro das políticas de imigração e até de emigração, para já não referir as consequências nas fórmulas tradicionais de exercício político no espaço europeu (vidé problema actual no KOSOVO).

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Este Senhor sabe o que se passa no KOSOVO??
Estou quase a vomitar...
Anónimo disse…
Ao anónimo disse ... das 11:56:00 PM,

Não parece, mas sei muito bem. O que se passa no KOSOVO devia corresponder a igual tratamento na concretização das pretensões de independência do TIBETE, do CURDISTÃO, da PALESTINA, do DARFUR e de outras regiões do globo em idênticas condições.
Por outro lado, não compreendo como é que a União Europeia (de raiz cristã) procura empenhar-se na independência de parte de um território pertencente a um país soberano - a Sérvia - (de raiz cristã ortodoxa), sabendo que aquela parte de território corresponde a um enclave de raiz muçulmana e ofensiva da génese da cultura e nação eslavas dali originárias e de raiz cristã ortodoxa.
Alguém me consegue explicar objectivamente porquê?

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Pode vomitar à vontade; fica mais limpo e aliviado.
A independência do KOSOVO, para além de ser um acto de enorme hipocrisia política e humana, representa o 2º. tiro no príncipe herdeiro dos Habsburgos austríacos.
Já todos conhecemos as consequências do 1º. tiro.