Regionalização

Ao chumbar a Regionalização, Portugal perdeu, em minha opinião, uma oportunidade histórica para encetar a modernização do país e promover o desenvolvimento harmonioso do território. O país está, com efeito, cada vez mais desequilibrado e assimétrico. Enquanto a região de Lisboa atinge índices de desenvolvimento verdadeiramente europeus, o resto do país vê partir os seus melhores e afasta-se, cada vez mais, dos níveis de desenvolvimento necessários para uma melhor qualidade de vida.

Deixem-me começar por narrar um pequeno, mas paradigmático, episódio: um amigo meu, nos contactos regulares que mantinha com empresas suas clientes da região norte, passou a ser confrontado, cada vez mais, com a informações do género “a empresa mudou-se para Lisboa” ou “a Direcção da empresa passou a estar sediada em Lisboa” ou “quem decide, agora, é Lisboa”. Passado alguns meses, de uma dessas empresas que se tinha mudado para a capital, informam-no telefonicamente que “a Direcção mudou para Madrid”. A custo, este meu amigo conseguiu conter o sonoro Yessssss que quase lhe saía da garganta....

Este episódio e esta reacção são apenas um exemplo acabado de como as pessoas vão sentindo estas coisas, e de como vamos estando todos um pouco fartos disto. O País assistiu, há poucos anos, à visita de um grupo de empresários ao senhor Presidente da República para lhe transmitir a preocupação com o facto de os poderes de decisão se estarem a mudar para Espanha. Alguém os viu preocuparem-se quando alguns desses poderes de decisão se mudaram para Lisboa? O que é que a minha região lucra (em termos de emprego, criação de riqueza, formação, criação de massa cinzenta, etc...) por o centro estar em Lisboa em vez de Madrid ou Barcelona? Nada, nada, nada.

É certo que a Regionalização chumbou, muito por culpa de alguns que a defendiam e muito por culpa de algum oportunismo político de outros a quem dava jeito que ela chumbasse, não por serem contra, mas porque não estavam no poder. (Lembro-me de quem defendia que não queria a Regionalização mas sim a Descentralização - fosse lá isso o que fosse: nunca mais os vi preocupados nem com uma coisa nem com outra).

Muitos foram, de facto, os argumentos brandidos na altura. Diziam uns que o país era pequeno e que se ia dividir ainda mais: como se não houvesse regionalização em países mais pequenos... Outros diziam não haver assimetrias substanciais no país que justificassem tal. Não há? Outros ainda argumentavam que com a Regionalização iam aparecer mais Albertos Joões. A esses gostaria de fazer duas singelas perguntas: a primeira é se já pensaram porque é que o Alberto João foi contra a Regionalização. A outra é a seguinte: se a Regionalização faz aparecer Albertos Joões, como explicar que o Alberto João exista não havendo Regionalização?

A massa cinzenta das várias regiões do País muda-se, cada vez mais, para perto do poder. Não há elites nas regiões? Há, com certeza. Há elites intelectuais, empresariais, artísticas, desportistas, científicas... O problema é que não existe, no ordenamento político português, lugar para o exercício do poder político a outros níveis. Não existe prática de poder político a nível regional. Presidentes de Câmara? Pelo menos o da cidade onde resido porta-se mais como um regedor. Quanto aos outros, que mais podem fazer se não tratar da administração corrente dos seus concelhos? Não há nenhum poder intermédio entre o autárquico e o central. Onde não há massa cinzenta, onde as elites não podem exercer o poder, o terreno torna-se fértil para medrar o caciquismo. Onde não existe uma sociedade civil forte, ele aparece inevitavelmente.

Pasmo quando tomo conhecimento, nos jornais ou nas revistas do social, das relações existentes a (quase) todos os níveis do poder: o político do Partido A é familiar daquele outro do Partido B. O comentador que é família do político. O dirigente desportivo, da família de outro político e que andou na Faculdade com o comentador ou com o artista ou com o jornalista. Tudo, mas tudo, ou melhor, todos andam ligados. Estudem-se as relações de amizade, familiares ou empresariais da nossa elite central e conclua-se o que se tem que concluir: o poder está na mão de meia dúzia de amigos. Regue-se tudo isto com o cimento que é, por exemplo, a Faculdade de Direito de Lisboa, que une muitos deles e tem-se o cocktail completo. É normal, por isso, que corpos estranhos, que não fazem parte da corte, sejam cilindrados na primeira oportunidade, sejam eles ministros, artistas, jornalistas, empresários... Como exercício, tomemos, de cada vez que temos novo Governo, a lista dos ministros, para sabermos quem vai ser afastado na primeira remodelação...

Tenho para mim que a região onde vivo teria muito mais autonomia e muitas mais condições para um desenvolvimento harmonioso se fosse uma região de Espanha do que a babugem de... nada. Ou pior, a babugem de um centro parolo e incompetente.


Gil Teixeira
Porto

Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Deste texto não tenho tanta certeza, mas há algo nele que me faz recordar alguma intervenção anterior sobre a regionalização.
Seja como for, a região onde o senhor Gil Teixeira vive e trabalha teria todas as condições de autonomia e de orientação para o desenvolvimento se fosse a REGIÃO AUTÓNOMA DE ENTRE DOURO E MINHO, formada pelas províncias do Minho e do Douro Litoral, SEM NECESSIDADE DE SER UMA REGIÃO ESPANHOLA.
E, também, sem necessidade de centralidades excessivas e anormais, a seu tempo geradores de insegurança e condições infra-humanas de vida das populações, por ELIMINAÇÃO de políticas centralizadas e centralizadoras, as tais da: babugem, parolice e outros qualificativos nada prestigiantes.
Outros argumentos, a favor das 7 REGIÕES AUTÓNOMAS, estão disponíveis para consulta neste mesmo blogue, em muitas intervenções anteriores deste REGIONALISTA, sem necessidade de "andar" muito trás. Para a frente, só com as 7 Regiões Autónomas.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)