Soluções para o Interior

por, Afonso Miguel


Folgo em ver que ainda há pessoas que se preocupam com o que verdadeiramente importa no contexto da Regionalização: a problemática da desertificação das regiões interiores do território português.

A problemática da Regionalização não pode mais ficar-se por uma "guerra" entre o Porto e Lisboa que, embora sejam os dois maiores centros urbanos do país, não deixam de representar uma pequena parte do território português. Ao longo destes últimos 30 anos, a Regionalização foi debatida, metida e tirada da gaveta, mapeada, referendada, apoiada e repudiada. Mudaram os políticos, sucederam-se governos, alguns "notáveis" mudaram inclusive diversas vezes de opinião sobre este tema, fazendo com que Portugal ficasse parado a ver, primeiro Lisboa, depois a Estremadura e Ribatejo, depois o restante litoral evoluir (embora numa escala menor).

Entretanto, entre 1960 e 2001, o Interior perdeu praticamente metade da população. Primeiro, foi a emigração, para a França, a Suíça e a Alemanha, principalmente, depois foram as migrações para o litoral: Lisboa e Porto. Os distritos de Bragança, Vila Real, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Beja ficaram praticamente vazios. Apenas algumas cidades se afiguram como "oásis" neste "deserto". Só para dar um exemplo:

Entre 1960 e 2001, na Beira Interior:
-O distrito da Guarda perdeu 59 781 habitantes;
-O distrito de Castelo Branco perdeu 108 467 habitantes.
-No total, a Beira Interior perdeu, nestes últimos anos, mais de 150 000 habitantes, o que equivale, por exemplo, à população de cidades como Braga ou Coimbra.

Para além disto, faliram empresas, o desemprego aumentou, não houve investimento, e a população acabou por envelhecer. O índice de marginalidade funcional só é considerado crítico nas regiões do interior. O índice de envelhecimento nas regiões de Trás-os-Montes e Alto Douro, Beira Interior e Alentejo foi superior a 170 %, sem que qualquer concelho fique de fora desta realidade.

Para os sucessivos governos, as soluções pareciam fáceis. Até 1990, nem sequer havia problema, diziam os políticos. A partir de 1990, as soluções pareciam fáceis: a "política do betão" resolveria tudo. Abriram-se vias-rápidas (IP2, IP3, IP4 e IP5), que se revelaram um verdadeiro desastre, ceifando milhares de vidas. Foram o problema em vez da solução. Entretanto, continuaram-se a fechar escolas, serviços de saúde, empresas, linhas de caminho de ferro. Resultado: a população decresceu cada vez mais.

Estamos em 2008. O Interior bateu aparentemente no fundo. Em vez de trazer mais infra-estruturas para o Interior, os governos só se preocupam com auto-estradas. E, claro, em construir megalomanias como o aeroporto de Alcochete, as pontes de Lisboa e o TGV no litoral.

O Interior precisa de verdadeiros incentivos. Os responsáveis políticos, os empresários e a população têm-se acomodado com esta situação de "litoralização", esquecendo as grandes desvantagens que este processo traz, tanto para o Litoral como para o Interior. Já percebemos que, a nível nacional, os responsáveis maiores da nação não estão interessados em mudar de políticas: o centralismo continua a imperar. Por isso, só há uma saída, que é uma inevitabilidade: a REGIONALIZAÇÃO.

Cada vez mais o povo percebe isso, e se começa a mobilizar para estas questões, demonstrando saudável independência dos partidos políticos. Muita gente hoje mostra que não está de acordo com o centralismo, mas também não quer uma Regionalização administrativa sobre as 5 "regiões-plano". Tudo isto porque há grandes fracturas no território nacional.

Apesar de ser mais falada, a fractura Norte-Sul ou Porto-Lisboa é mais cultural do que económica, visto que a área metropolitana do Porto, assim como toda a zona de Entre-Douro e Minho, se tem desenvolvido mais ou menos bem, como é exemplo o crescimento da população, a melhoria dos níveis de vida, o crescimento de cidades como Braga, Viana do Castelo, Guimarães ou Barcelos, a modernização das infra-estruturas e das empresas. Tudo bem que há problemas, não o nego. E problemas graves. A emigração nesta zona é muito forte, há cerca de 100 000 pessoas a trabalhar na Espanha, por exemplo, o que é sinal de que as coisas não vão bem.

Mas a prioridade deve ser outra. A maior fractura no nosso país é entre regiões litorais desenvolvidas, a ganhar população, com menor desemprego, com excelente cobertura em termos de infra-estruturas, e com níveis de vida medianos; e as regiões do Interior, a perderem população galopantemente, e a desertificarem-se, num processo que se pode tornar irreversível.

Por isso, é um erro tornar a Regionalização numa luta centrada no Porto. A Regionalização não pode ter centros, deve ser uma causa mobilizadora do país, de norte a sul, do litoral ao interior. Agora, os habitantes destas regiões esquecidas sentem que a Regionalização é para o Porto, que nada ganham com isso. Actualmente, fala-se na centralização de fundos e recursos em Lisboa: com 5 regiões, vai-se falar daqui a uns anos na centralização de fundos e recursos em Coimbra e no Porto. E o Interior? Vai chegar a um ponto sem retorno!

Precisamos de medidas urgentes para atrair investimento e população para o interior. Concordo com a proposta de Luís Leite Ramos: 5% de IRC. Mais: reduções idênticas em impostos como o IVA e o IRS, e verdadeiros incentivos à natalidade. Para compensar estas descidas, bastaria não construir mais uma auto-estrada, por exemplo o IC2 entre Coimbra e Oliveira de Azeméis, cuja necessidade é duvidosa (bastaria construir variantes á EN1 na Mealhada e em Albergaria).

Não precisamos de mais auto-estradas, em termos viários temos bons acessos: precisamos é que esse dinheiro seja gasto em recuperação de estradas nacionais, regionais e municipais, que desempenham um papel importantíssimo nestas regiões. E, principalmente, precisamos de um transporte ferroviário de qualidade que ligue as cidades médias do Interior (Bragança, Chaves, Vila Real, Bragança, Mirandela, Guarda, Covilhã e Castelo Branco) às maiores cidades do país, com tempos e custos compensatórios. Deveria ser essa a aposta no Interior.

É um pequeníssimo esforço para o Estado, mas uma grande mais-valia para o interior. A vontade política que falta para estas medidas sobra para cortes cegos como o fecho de serviços de educação e saúde, e de linhas de caminho-de-ferro, que condenam ainda mais o interior.

Se estivermos à espera do poder central, podemos esperar sentados. Sentados não, porque nos estamos a afundar cada vez mais. É preciso fazer força para trazer as decisões para as regiões do interior. Para onde elas realmente são precisas. Não para uma cidade em específico, mas para cada região, com serviços distribuídos, com maior autonomia para as regiões do Interior.

Por isso, defendo a única solução para romper o isolamento, a Regionalização a 7 Regiões:

*Entre-Douro e Minho
*Trás-os-Montes e Alto Douro
*Beira Litoral
*Beira Interior
*Estremadura e Ribatejo
*Alentejo
*Algarve

Haja vontade. Pelo Interior, pelo futuro de Portugal.
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Comentários

Al Cardoso disse…
Concordo com tudo o que enumera que poderia ter sido dito por mim, mas com muito menos categoria!
O que ja nao concordo, e com as sete regioes.
A Beira ou Centro em meu ver deve ser uma unica regiao, mas esse facto nao obstaculiza que os servicos sejam repartidos pelas varias localidades regionais e ate como ja eu disse varias vezes de preferencia para localidades de menor desenvolvimento para esbater as rivalidades regionais que as ha e, o meu amigo sabe disso decerto.

Um abraco regionalista e beirao d'Algodres.
Miguel Coelho disse…
Caro regionalista
Partilho as preocupações que expressou de um forma global, não concordo contudo com o mapa proposto
A problema do pais é que cada vez mais esta concentrado em Lisboa e no Porto. Considero que se estas 2 áreas metropolitanas fossem regiões só por isso que seria mais simples e justo definir um mapa para "agradar" a todos em que os diversos serviços das regiões seriam facilmente distribuídos por diversas cidades de media dimensão, podendo desta forma ajudar a fixação de pessoas noutras regiões do nosso pais.
O problema da desertificação é um problema NACIONAL e não apenas LOCAL
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

O problema da desertificação é um problema NACIONAL e não apenas LOCAL, mas a sua solução só poderá ser executada pelas populações locais, e que mais sentem essa desertificação.
Em segundo lugar, a manutenção das Áreas Metripolitanas como o que são ou como regiões só vai agravar as assimetrias e dar aso a novos centralismos de idêntica natureza e se de poder centralizado e centralizador.
Daí, a necessidade de diluição do poder existente no quadro das grandes cidades e da cidade-capital, para que novas oportunidade sujam noutras cidades, concelhos e vilas, ainda longe de serem consideradas "centralidades" para poderem antes ajudar a combater a desertificação galopante.
Para esta finalidade política e de desenvolvimento a única solução que preenche requisitos essenciais é aquela que separa o litoral do interior (para que aquele mais desenvolvido não subjugue este) e que estabelece uma equilíbrio territorial e de forças que não prejudique as áreas territoriais mais subdesenvolvidas, exactamente as do interior e algumas zonas do litoral-interior, NÃO ESQUEÇAM.
Vejam como os desequilíbrios e as assimetrias de desenvolvimento, aliadas à desertificação como sua consequência, são muito mais graves do que possam pensar.
Por tudo, a única solução: 7 Regiões Autónomas, como estão configuradas neste "post".

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Caro amigo d'Algodres:
É sempre importante ter opiniões da minha região neste blog. Certamente considerará que a nossa zona sofre de problemas graves a nível de fuga de população e de falta de investimento, como já enumerei no texto principal, cuja publicação desde já agradeço aos editores deste blog. Certamente notará também, viajando pelas Beiras, que estas apresentam grandes contrastes. É impossível comparar o litoral cosmopolita, com grandes cidades como Aveiro, Coimbra, Viseu, Leiria e a Figueira, em franco desenvolvimento, a ganhar população, com infra-estruturas de qualidade e todos os serviços disponíveis; com as zonas da Guarda e de Castelo Branco, de onde a população e as empresas estão a desaparecer, onde não há dinamismo e os problemas sociais acumulam-se. Há uma fractura Litoral-Interior, ninguém o pode negar. E eu pergunto: será que devemos deixar nas mãos de uma "região Centro", de tal maneira diversificada? Isso iria, concerteza, culminar na retenção de fundos nas áreas litorais, tal como acontece hoje com Lisboa e o resto do país. Já hoje isso acontece: os míseros fundos, destinados à coesão do Interior, que Lisboa deixa escapar para a entidade gestora, a CCDR-Centro, ficam retidos em Coimbra. Investimentos, na Beira Interior, só em programas específicos elaborados pelas autarquias, aos quais os fundos são entregues sem passar por Lisboa. Não vamos deixar que as rivalidades Guarda-Covilhã-Castelo Branco nos destruam! Estas são cidades homogéneas, parecidas, que têm condições para competir com igualdade pelo desenvolvimento. Será que preferimos competir com cidades tão maiores como Coimbra, Aveiro ou Viseu?? Isso é impossível! É hipotecar o nosso futuro... Por isso, há que esquecer estas lutas entre capelinhas, e lutar verdadeiramente por uma coesão entre a nossa zona Raiana, e o resto do país!

Afonso Miguel
Anónimo disse…
ÁMEN POR ESTE POST. Agora... é só esperar que alguém o leia..