Os políticos não querem redistribuir a governança

(via Barlavento)

Por
Helder Nunes

A reforma administrativa do Estado com a implementação da regionalização volta a ser um tema na ordem do dia. São autarcas e líderes locais da periferia que levantam a questão, principalmente porque sentem na pele as agruras de um centralismo desenvolvido, principalmente, por este Governo.

Começa a ser preocupante, também, tomarmos conhecimento de que os líderes dos dois maiores partidos – José Sócrates e Manuela Ferreira Leite – não querem ouvir falar das regiões administrativas. A líder dos social-democratas é coerente, pois sempre se opôs à regionalização. Do seu lado, pouco ou quase nada há a esperar no capítulo da descentralização da administração pública.

Quanto a José Sócrates, agora que esteve no poder e com poder para impor as regras do jogo, começa a duvidar que a regionalização seja algo de precioso para o país e já fala em atirar para as calendas qualquer referendo ou coisa que se aproxime de uma tentativa de retirar o poder ao Terreiro do Paço.

Miguel Freitas, líder regional dos socialistas, vai apregoando a regionalização, fala de um roteiro para a sua concretização, e, veja-se, aponta a data de 2013 para o referendo em conjunto com as eleições autárquicas, isto é, no final da próxima legislatura. O mesmo será dizer que, eventualmente, só na legislatura de 2013/17 se poderia avançar com a institucionalização das regiões. É tempo de mais e um atirar de areia para os olhos dos algarvios e dos portugueses.

Porque não querem os líderes nacionais dos maiores partidos que se fale na regionalização? Há várias razões, entre elas, por exemplo, o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) com as verbas a serem geridas por Lisboa. Tudo está centralizado e o dinheiro é aplicado como o Governo central entende.

As regiões, ou os distritos, ficaram arredados de programarem seja o que for, e recebem o que Lisboa lhes manda e pouco mais. E o QREN termina em finais de 2013. Depois, haverá dinheiro para distribuir? Ninguém consegue prever o que vai acontecer, daí, e como diz o povo, mais vale um pássaro na mão do que dois a voar.

Quem tem o poder não quer abdicar dele. Sabe bem, quando não existe uma formação básica na democracia plena, na solidariedade e na subsidiariedade e o conceito de dever público é muito dúbio, governar com arrogância e sobranceria, impondo aos súbditos uma vontade ditatorial.


A incompetência e a mediocridade são o apanágio de um muito vasto extracto da nossa classe política. Obediente e subserviente, porque os valores democráticos e de uma sociedade livre são colaterais para quem bajula na área do poder. O egocentrismo é a regra.

Nos últimos tempos, a bagunça, a irresponsabilidade, as golpadas, as atitudes anti-constitucionais têm vindo a caracterizar este pequeno país à beira-mar plantado. E quando julgávamos que iríamos moralizar a sociedade, com justiça e verdade, entramos no mundo da mentira, do faz-de-conta, do palavreado vergonhoso para um país que quer ser europeu. Já nada espanta ou só espanta aquilo que é normal.

Quando na Europa se discute a coesão territorial e o papel das regiões na competitividade entre territórios, em Portugal vai-se concentrando tudo no Litoral e no centralismo lisboeta, numa política assimétrica que vai levar à desertificação das zonas do Interior. Só a regionalização pode dinamizar as cinco regiões-plano já criadas. Ninguém esteja à espera do Governo central para ver crescer as zonas onde o chamado PSI 20 não quer investir.

O Algarve tem um plano de ordenamento, falta-lhe um plano de desenvolvimento sustentável, estratégico e importante para programar o crescimento sócio-económico da região. Fala-se avulso neste e naquele campo, mas a interdependência entre sectores não está coordenada nem implementada. Só a regionalização pode desenvolver esta política pela sua proximidade.

Os Tratados da União Europeia espelham objectivos que apontam para a promoção e coesão económica e social, reduzindo as disparidades entre as regiões e alargando de modo mais equitativo as vantagens do mercado comum em todo o território a União Europeia. Só as regiões devidamente organizadas podem programar uma política territorial, ultrapassando o capelismo de cada pequeno concelho.

O Algarve está ligado à Andaluzia, mas as realidades são bem diferentes. Com uma administração regional, o diálogo seria muito mais frutífero e as candidaturas a fundos comunitários trariam benefícios para ambas as regiões.

O Algarve está emparedado com Portugal nos ombros e muito dificilmente a regionalização vai chegar a esta terra. Os políticos que têm o poder não querem redistribuir a governança. Um dia alguém afirmou que Portugal estava à beira do pântano e foi-se embora. Será que já de lá saiu? Ou será que caiu mesmo no pântano?
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Comentários

Anónimo disse…
Grande Helder Nunes!
Anónimo disse…
Vale para o texto deste "post" o meu comentário escrito para o "post": "O Algarve 2000-2006", com a anotação adicional que necessitamos de deter paridade real de decisão política em relação às Regiões Autónomas de Espanha, com vista à preservação da nossa independência política de decisão sem pôr em causa as exigências decooperação inter-regional em termos internacionais, se alguma vez tivermos força política e cultural suficientes para isso, face ao reconhecimento das cada vez mais insistentes, estudadas e mobilizadoras uniformidades culturais ibéricas.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)