Moção sobre Regionalização no Congresso do PS em Espinho

O nosso objectivo é centrar o argumentário da regionalização numa perspectiva de uma Regionalização Justa, Coerente e de proximidade;

Por isso, não concordamos com a proposta de regionalização assente nas cinco regiões plano.

A Regionalização na nossa perspectiva deve ser forte administrativamente e fraca politicamente (conforme prevê a constituição).

A divisão em cinco (5) regiões é um modelo de regiões demasiado grandes face à dimensão do País. São regiões que pela sua dimensão tenderão a construir um crescente peso político, e, a reivindicar cada vez mais e mais autonomia politica. O que promove o afrontamento ao Estado em nada contribuindo para a coesão nacional;

Na proposta das cinco regiões é evidente um forte desequilíbrio, entre regiões, em termos de desenvolvimento. Quando se analisa/comparam regiões como “Lisboa e Vale do Tejo” (3,6 milhões de habitantes, e, representa 46% do PIB Nacional) com a região do “Alentejo” (535 mil habitantes, e, representa 4,9% do PIB Nacional) as disparidades são tremendas.

Num comparativo entre a região “Norte” (3,7 milhões de habitantes, e, representa 28% do PIB Nacional) e a região “Algarve” (395 mil habitantes, e, representa 4,4% do PIB Nacional) as disparidades aumentam. Mesmo a região “Centro” (1,7 milhões de habitantes, e, representa 15% do PIB Nacional) não encontra paralelo nas outras regiões. Nesta perspectiva, no modelo proposto das grandes regiões a tendência será para o alargamento dessas disparidades e não para um caminho de convergência.

Quando a análise passa para dentro de cada uma das cinco (5) regiões propostas subsistem, talvez de forma mais evidente, as disparidades entre Interior e Litoral e entre Urbano e Rural (Lisboa 1,8 milhões de habitantes, VAB 40 000 (106 Euros) - Oeste 393 mil habitantes, VAB 4 168 - Lezíria 240 mil, VAB 2 639). Nesta perspectiva, criar novos centralismos (5) assentes numa transferência do centralismo de Lisboa em nada contribuirá para a coesão regional tendo em conta que esses novos centralismos, por via de terem menores recursos para gerir, evidenciarão de forma mais perversa a lógica de concentração;

A experiência do PRACE provou incapacidade de organizar equilibradamente o poder interno nas cinco (5) regiões. Nesta perspectiva o modelo de grandes regiões em nada contribui para a construção estratégica regional, para a proximidade às comunidades, nem para a boa gestão dos recursos locais/regionais;

Ainda, nesta reflexão, importa referir que quanto às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto o modelo associativo autárquico, em vigor, não resolve os constrangimentos existentes. Só com a criação de Regiões Metropolitanas de Lisboa e Porto se conseguirá um modelo com capacidade de superar os constrangimentos municipais e ter legitimidade política para intervir na necessária coordenação dos sistemas urbanos metropolitanos.

Lisboa e Porto não devem integrar uma região administrativa mais vasta porque a sua hegemonia seria negativa para o desenvolvimento e autonomia do restante território a elas subordinado.

Na experiência europeia existem modelos de todos os feitios. Existem países com regiões grandes e países com regiões pequenas. Nesta perspectiva o argumento de comparação internacional não é relevante, no entanto, vale a pena referir que existem países europeus com divisão administrativa diferente das NUT e vivem bem com isso;

Nos países que têm regiões grandes isso só acontece porque há razões históricas e de nacionalidades internas, linguísticas, ou geográficas que levaram a tal, mas nos casos em que há regiões grandes teve de ser sobreposto um modelo provincial, de menor dimensão, para possibilitar a aproximação à escala humana e a descentralização administrativa (Itália, Espanha …). As regiões grandes, geralmente, supõem uma dupla matriz.

Assim,

Uma boa regionalização, conforme previsto na constituição, que é a única coisa que interessa, faz-se bem para regiões pequenas e não para grandes, tendo em conta que as pequenas privilegiam a proximidade administrativa às pessoas, empresas e instituições, logo, são mais ágeis numa perspectiva de construção estratégica bem como na gestão dos recursos e promotoras da coesão interna.

Porque todos, à pergunta “de onde somos?”, responderão conforme o seu sentimento de pertença, nomeadamente, como se sentem e como vivem. Apostaria que ninguém dirá que é da região de “Lisboa e Vale do Tejo”, muito menos da região do “Centro”. E isto é muito importante numa perspectiva de sucesso do próprio processo de regionalização.

Hoje, as dinâmicas de relacionamento territorial entre regiões são manifestamente diferentes das supostas dinâmicas administrativas, associadas às cinco regiões plano. São muito diversas e com diferentes vectores de relacionamentos culturais, sociais, ambientais e económicos pelo que o processo redutor de divisão regional do país (a régua e esquadro) em cinco territórios, sem contar com essas realidades nada mais fará do que criar cinco novos centralismos cegos e distantes das populações.

Vale a pena pensarmos na regionalização que queremos? Que regiões queremos? Porque isso será o país que teremos amanhã, porque, esta não é uma reforma qualquer. Quando feita, a regionalização, não há volta atrás!

O único modelo que interessa são regiões administrativamente fortes e politicamente fracas! É o modelo que interessa ás regiões e ao país.

Vale a pena pensarmos nisto!

Hélder António Guerreiro
Militante do PS, Membro do Secretariado da Federação do PS de Beja,
Vereador da Câmara Municipal de Odemira

Comentários

Ora aqui está finalmente o que já há muito se previa. Este modelo de Regionalização, completamente descabido, a ser criticado, não só pelas pessoas, mas também dentro do próprio PS.

Está na hora de tomar consciência da realidade de Portugal, e tomar decisões concretas e consonantes com a nossa dimensão e com os contrastes existentes entre os vários quadrantes geográficos de Portugal. Está na hora de dar voz a todos e apostar nas 7 Regiões:

*Entre-Douro e Minho;
*Trás-os-Montes e Alto Douro;
*Beira Litoral;
*Beira Interior;
*Estremadura e Ribatejo;
*Alentejo;
*Algarve
A solução para as zonas urbanas de Lisboa e do Porto é fazer o que já foi feito na maioria das metrópoles de dimensões semelhantes, por essa Europa fora (Barcelona, Valência, Marselha ou Munique são bons exemplos):

Basta constituir Autoridades Metropolitanas com poderes alargados, dentro das próprias regiões, para gerir as questões relacionadas com as zonas metropolitanas.

Outra das precauções a tomar é fazer uma descentralização dentro da própria regionalização, ou seja, os serviços e organismos de poder regional ficariam sempre sediados fora das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, e cada município não poderia ser sede de mais do que um organismo regional.

Assim se evitaria a constituição de novos centralismos, e se criariam regiões homogéneas, que responderiam efectivamente aos problemas específicos de cada área regional.
templario disse…
Excelente reflexão do Sr. Helder António Guerreiro:
as regiões
"tenderão a construir um crescente peso político, e, a reivindicar cada vez mais e mais autonomia politica. O que promove o afrontamento ao Estado em nada contribuindo para a coesão nacional;

Isto é pura verdade, seja para cinco, sete ou 10 regiões. A eleição por sufrágio universal concede-lhes de imediato essa força política com dinâmica imparável. Pena é que o Sr. Helder fique ainda pela defesa da regionalização, pois que todo o seu raciocínio pressupõe que devesse estar contra a regionalização. Saudo, no entanto, a seriedade, quiça independência, da sua análise.

Porque o que se está a passar no debate da regionalização é isto:

Para os defensores da regionalização, Portugal é uma contingência, i.e., pode existir ou não existir: não depende, para ser ou não ser um país independente, do que é a sua essência - o seu povo.
Para quê, então, pensam os regionalistas, investigar todo o seu percurso de vida das raízes da Fundação até hoje, tais como, factores geográficos (físicos e humanos), económicos, históricos e tradições regionalistas(?), nomeadamente, as sempre melindrosas relações com o único vizinho para decidir se Portugal reúne condições para ser retalhado em uns tantos Terreiros do Paço? Tudo isto se apresenta para eles como mera perda de tempo, visto que a nossa realidade não está ao alcance do nosso entendimento, tão pouco temos direito à nossa singularidade, porque tudo, inclusive a Pátria, é contingente. Os regionalistas orientam-se por uma crença rebuscada no missal da UE - os portugueses não têm acesso às razões mais profundas da sua existência. Estamos dependentes de uma casualidade externa, somos hereges, somos a "NÓDOA" da Europa e por isso devemos entrar na uniformidade, na universalidade que só a Sabedoria Infinita externa comanda.

Os regionalista não querem mesmo discutir a sério a questão da regionalização; preferem focalizar o debate na actualidade e procedência à luz de uma doutrina exterior à nossa realidade que se case com os interesses de alguns que vêem na sua implementação um maná do céu...

É por isso urgente sermos todos sérios e não lançar o país na via da derrocada, "cozendo Portugal, como um farrapo, à Espanha" - que dará uma grande ajuda....
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(a expressão em itálico é de Eça de Queiroz)
templario disse…
Sr. Afonso Miguel,

Pelo seu segundo comentário, depreende-se que o Sr. Afonso Miguel está muito baralhado: descentralização das regiões.... O que vai propor mais para esfarrapar mesmo o país?

Sinceramente.... não tem a noção que num país sem tradições regionalistas (quando muito poderá encontrar algumas reminiscências no nordeste transmontano), os poderes políticos regionais iriam entrar em choque com o municipalismo e as comunidades e abririam a médio e longo prazo o caos em Portugal?
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Torna-se claro que a regionalização, mesmo dentro do partido que tem tido responsabilidades de poder, não é assunto que mobilize unanimidades favoráveis a única solução e ainda bem que é assim.
A reflexão traduzida por este "post" é bem uma consequência disso mas enferma de uma questão de princípio, ao defender a prevalência do administrativo sobre o político, associando esta última fórmula à causa de todos os males para o desenvolvimento do nosso País, com o devido e oportuno aproveitamento do nosso caro contraregionalista Templário.
Com efeito, o que se deverá propôr é precisamente o contrário, ao instituir-se não 5 regiões administrativas mas 7 Regiões Autónomas, cada vez mais fortes políticamente para se evitar o prolongamento de um sistema de governação centralizado e centralizador através de tentáculos regionais, verdadeiros condicionadores do desenvolvimento regional e nacional.
Por outro lado, as metrópoles de maior dimensão não precisam que as governe uma determinada Área Metropolitana, mas de serem integradas numa determinada região para ser associadas às condições regionais de desenvolvimento da região autónoma de que são parte integrante e jamais parte predominante ou condicionante seja do que for.
Relativamente à anexação pelo nosso vizinho espanhol, será bom entendermos que uam integração será tanto mais fácil quanto menos desenvolvidos e competitivos nos apresentarmos perante a situação internacional, pactuando com uma fragilidade que é como o código postal, é meio caminho andado para uma absorção política em todas as vertentes que se possa imaginar. Os que defendem a regionalização administrativa, talvez não tenham conseguido ainda aperceber-se disso, mas estão a defender a abertura de brechas no desenvolvimento e na coesão social através do enfraquecimento da nossa estrutura económica em todos os sectores e da fragilidade das condições de competitividade e internacionalização e, com isso, justificar a prazo a nossa não permanência como País independente e facilitar a sua progressiva integração na estrutura organizativa económica e política do nosso vizinho espanhol.
A única opção política em direcção ao desenvolvimento terá de ser tomada a favor da regionalização autonómica, prejudicando a vertente administrativa em favor da política, capaz de nos reorientar numa política económica que potencie o aproveitamento dos nossos recursos próprios numa produção diversificada e competitiva, tanto para assegurar a substituição de importações como para incrementar o fluxo das nossas exportações, em todos os domínios sectoriais.
Complementarmente, terá de reconverter-se todas as condições actuais de distribuição do rendimento nacional, o verdadeiro factor de destruição da coesão nacional, onde os dados quantitativos e estatísticos conhecidos nos colocam miseravelmente com assimetrias de desenvolvimento mais características de países do terceiro mundo do que de país integrado na União Europeia e fundador do Euro.
Se não formos capazes de entender a dramática situação económica e social em que nos encontramos, mesmo sem considerar os efeitos da eclosão da crise financeira actual, jamais poderemos compreender que a única saída para o desenvolvimento tem de ser alicerçada na produção de riqueza escondida dos nossos recursos próprios em cada uma das 7 Regiões Autónomas, sem tiques de novo- riquismo nem de estonteantes abusos de poder, tanto por manifestações de caciquismo como de sobreinfluência nos órgãos de comunicação social.
E não compreendendo jamais se tomarão as soluções mais adequadas; logo, uma vez tomadas jamais haverá volta atrás.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Sou a favor da regionalização e, se assim penso, isso deriva de há muito termos um estado que divide os portugueses em "filhos", os que moram em Lisboa e arredores, e "enteados", nós, os que vivemos no litoral e no interior, cada vez pior servidos de estradas, caminhos-de-ferro e transportes públicos, com uma agricultura quase inexistente em certas zonas, uma indústria cada vez menos competitiva, escolas, centros de saúde e outros serviços a fechar e o interior cada vez mais deserto, com a emigração outra vez em crescendo.
Perante os grandes investimentos, sempre ou quase, nos mesmos sítios, é natural que muitos portugueses procurem uma solução, que, para eles, é a regionalização, com cinco, sete, menos ou mais regiões. Naturalmente que essas regiões devem ter órgãos governativos e representativos eleitos e que sejam responsabilizados, para acabar com a "palhaçada" actual em que os membros de um círculo eleitoral elegem deputados (muitas vezes caídos nesse círculo de pára-quedas ou por clientelismo partidário)que não os representam nem defendem os interesses desses portugueses.
Perante o continuado centralismo e a discriminação existente e já referida, é lógico que o poder central do Terreiro do Paço e os muitos milhares que vivem à sua sombra ( não falo sem saber pois já vivi mais de 2 anos em Lisboa e conheci centenas de pessoas, desde licenciados em várias áreas até pessoas humildes)vão perder poder e importância, veja-se a Madeira e os Açores.
Por isso, a existência de regiões autónomas no continente com poderes políticos e administrativos é algo de necessário, até para aproximar as decisões dos cidadãos. Claro que se os governos de Lisboa e não de Portugal, como os que temos tido, continuarem com a mesma política, isso poderá levar a movimentos que reivindiquem ainda mais autonomia e a unidade nacional poderá perigar, mas e de quem será a culpa? Dos que durante décadas ou séculos nada fizeram ou dos que recusam continuar a ser tratados como cidadãos de segunda ou terceira classe, embora nos afirmem que pertencemos ao mesmo país. Pertencemos? Sou português, gosto de Portugal, não aceito lições de muitos que para aí andam e falam muito, mas que em 1974-75 queriam fazer de nós a Albânia do Ocidente ou parecido.Nem de outros que, bem instalados em Lisboa e arredores, assistem sobranceiros ao que se passa na "paisagem" e no "deserto" a que reduzem o resto do País.
Concordo com alguns dos comentadores que me antecedem,mas claro que discordo de um deles, que é sempre a favor do centralismo.
É por muitos, lá na zona dele, pensarem assim que o que ele não quer ainda vai acabar por acontecer, como já esteve eminente no 25 de Novembro de 1975.
Cumprimentos
templario disse…
Caro "Zangado" (hoje estou de serviço neste Blog...),

O sr. diz:
"Sou a favor da regionalização e, se assim penso, isso deriva de há muito termos um estado que divide os portugueses em "filhos", os que moram em Lisboa e arredores, e "enteados", nós, os que vivemos no litoral e no interior, cada vez pior servidos de estradas, caminhos-de-ferro e transportes públicos, com uma agricultura quase inexistente em certas zonas, uma indústria cada vez menos competitiva, escolas, centros de saúde e outros serviços a fechar e o interior cada vez mais deserto, com a emigração outra vez em crescendo.
Perante os grandes investimentos, sempre ou quase, nos mesmos sítios, é natural que muitos portugueses procurem uma solução, que, para eles, é a regionalização, com cinco, sete, menos ou mais regiões"
.

O Caro "Zangado" não deve fazer uma mínima ideia do que é viver em Lisboa ou na sua área metropolitana; a esmagadora dos assalariados que por aqui vivem passam as passas do Algarve para viver e quase arrisco a dizer-lhe, se vive no interior defenda a qualidade de vida que tem e que vai ser melhor mais depressa do que julga.

Para quê carpir por uma situação, no litoral e interior, que se transformou tanto nas últimas décadas? Fala em Saúde e Educação: não seja injusto, puxe pela sua boa vontade e optimismo e verificará que foram as áreas onde a democracia mais êxito teve. Só é preciso mais organização, profissionalismo, seriedade no recrutamento de recursos humanos.

Cada vez pior em estradas?! Ferroviário sim, mas em estradas... Deve referir-se às acessibilidades, problema dramático na área metropolitana de Lisboa. Tem razão quanto à emigração.

Investimentos nos mesmos sítios: não se esqueça que temos uma costa marítima com 840 kms que nos projecta para todo o mundo, mesmo para a Europa e que junto a esse imenso oceano temos 3 aeroportos internacionais, uns não sei agora quantos importantes portos marítimos, bem como uma evidente ind. turística. Este litoral continuará a ser polo de atração dos mais importantes investimentos. E o interior ganha com isso se....

Se... E aqui é que julgo que está mesmo equivocado: não é a regionalização que resolve as contradições que realça, são as políticas; não é com novas dimensões de poder com o seu peso oficial, meramente oficial, que lá vamos. É com políticas correctas.

Com essa visão das coisas está a ilibar os responsáveis das más políticas, os mesmos que estão prestes a criar um acordo para a regionalização (os partidos) para os tomarem e colocar lá os seus afeiçoadas, ensinados e assalariados. São os partidos que devem ser reformados. Mas aqui... ainda não sei como.
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as expressões em itálico são de Eça de Queiroz - este Eça...
Anónimo disse…
O Hélder Guerreiro tem aqui uma posição que me parece lógica. Só uma questão: não foi em Odemira que o PS local promoveu um referendo à regionalização? Não foi no PS Odemira que foi defendida a Região Baixo Alentejo e Alentejo Litoral? Então estamos a falar de mais regiões - oito no total - certo?
Anónimo disse…
Ver noticia neste blog de 17 de Fevereiro "Regionalização: Socialistas de Odemira defendem Região Baixo Alentejo e Alentejo Litoral" ou http://www.ps-odemira.com/noticias_show.htm?id=54
Caro templário:

"O que vai propor mais para esfarrapar mesmo o país?"
Eu, sinceramente, a isto, já nem respondo. É o típico argumento do Velho do Restelo. Diga-me só uma coisa: a Holanda está regionalizada. Vê a Holanda estar esfarrapada?; a Suíça está regionalizada: vê a Suíça estar esfarrapada?; a França está regionalizada: vê a França estar esfarrapada?; a Alemanha está regionalizada: vê a Alemanha estar esfarrapada? E daqui não sairíamos se fôssemos falar em todos os países que estão regionalizados, desde os mais pequenos até aos maiores, da Europa e da América superdesenvolvidas, até à África subsariana. Em quase todos os países do Mundo há um nível intermédio de poder, entre os governos nacionais e o poder local, um nível de poder da máxima importância e que tem dado frutos. Em Portugal, não: continuamos "orgulhosamente sós" (estou-me a lembrar de alguém que disse isto... e não acabámos lá muito bem...), e vêm dizer que isto é "retalhar um país". Sem comentários.

"não tem a noção que num país sem tradições regionalistas (quando muito poderá encontrar algumas reminiscências no nordeste transmontano)"

Esta afirmação entra já no campo da hipocrisia. Se "não temos tradições regionalistas", explique-me como é que falamos em Minho, Trás-os-Montes, Alentejo, Ribatejo e Algarve com tanta naturalidade. Explique-me porque é que todos nos sentimos minhotos, transmontanos, beirões, ribatejanos, alentejanos, algarvios, etc., com tanta naturalidade. Explique-me porque é que em Portugal sempre existiram unidades territoriais regionais, desde o século XIII (províncias, comarcas ou distritos), muitas vezes dotadas de governadores, deputados, e outros soberanos, que representam a sua região, e porque é que atravessamos precisamente hoje em dia um dos períodos de maior centralização de Portugal em toda a nossa já longa história enquanto nação. E, por acaso, este período coincide precisamente com o período em que há mais desigualdades em termos de distribuição de riqueza e população entre as várias regiões do nosso país? Será que precisamos de um novo povoador, um novo D.Sancho I? Se calhar precisamos, mas lembre-se do que ele fez para atrair população para as áreas desertificadas: promoveu o fortalecimento de um poder até então quase inexistente, o poder local. Mas nós já não estamos no século XIII. Não estamos, mas parece, porque o nosso ordenamento pouco evoluiu desde então. Continuamos com governo central e municípios, e um fosso enorme entre eles. Desde o século XIX que se fala em Regionalizar, por algum motivo deve ser. Somos dos países mais atrasados da Europa, mas temos uma das regiões mais ricas: Lisboa. Porque será? E porque será que as regiões que se lhe seguem no nosso país são logo os Açores e a Madeira que, por acaso, gozam de autonomia? Porque resiste tanto à aplicação da Regionalização em Portugal? Tem medo de quê? Temos experiências, boas práticas, até mesmo dentro do nosso país, que nos mostram que a Regionalização é positiva... Tem medo que fiquemos pior do que já estamos? Acha que a Regionalização é assim uma coisa tão má? Não estou a ver porquê...

"os poderes políticos regionais iriam entrar em choque com o municipalismo e as comunidades e abririam a médio e longo prazo o caos em Portugal"

Sim, compreendo isto... Traduza-se esta frase em "Politiquês" de Portugal:
os interesses das populações, reforçados por uma autonomia dada a um poder de proximidade conferido pelas regiões, iriam entrar em choque com a política de caciquismo e tachismo quase feudal instalada há várias décadas no nosso país...
Pode ser que assim se perceba melhor...

"a esmagadora dos assalariados que por aqui vivem passam as passas do Algarve para viver e quase arrisco a dizer-lhe, se vive no interior defenda a qualidade de vida que tem e que vai ser melhor mais depressa do que julga"

Frase puramente demagógica. A qualidade de vida no Interior é tanta, mas tanta, e as oportunidades de trabalho são tão abundantes, mas tão abundantes, que metade da população do Litoral até nem migrou para Lisboa, Porto e Litoral em geral (estou a ser irónico, é claro). Olhe para a realidade, não tente tapar olhos. Se no Interior vive meia dúzia de pessoas, e nas cidades vive tanta gente, é normal que haja mais pobres nas cidades do que no Interior... E, se a maioria das pessoas passa "as passas do Algarve para sobreviver" é porque se habituaram a um nível de vida superior ao que podiam ter, e agora com a crise, tudo isso se está a desmoronar. Lá está: gasta-se e não se produz; é a metáfora do país que somos: Lisboa pouco produz mas é rica, o resto do país produz e é pobre...

"Fala em Saúde e Educação: não seja injusto, puxe pela sua boa vontade e optimismo e verificará que foram as áreas onde a democracia mais êxito teve."

Este senhor não deve viver no mesmo país que eu. É mesmo preciso puxar pela minha boa vontade e optimismo, e mesmo puxando, não consigo perceber como é que chega a uma conclusão destas. A nossa saúde é um caos, se chama êxitos a termos uma rede completamente deorganizada, com dezenas de hospitais num centro de Lisboa com 500 000 habitantes, e apenas 3 numa Beira Interior com mais de 300 000, sendo que nesta última, se demoram horas em viagens por estradas horríveis (experimente ir de Coimbra a Castelo Branco, da Guarda a Pinhel, de Seia à Guarda, ou de Figueira de Castelo Rodrigo a Vilar Formoso e veja do que falo: não é só por termos duas auto-estradas que nos tornamos o paraíso em acessibilidades... quanto às ferrovias, são dignas de terceiro mundo), até se encontrar um serviço de saúde condigno, em alguns casos mais vale ir a Espanha (olhe a unidade nacional no que tem dado...), com a agravante de o 112, por vezes, nem sequer funcionar...

"Deve referir-se às acessibilidades, problema dramático na área metropolitana de Lisboa."
Lisboa tem uma rede de estradas ao nível de Barcelona, Valência ou Madrid. Tem uma excelente rede de transportes públicos, quer ferrovias, quer metropolitano, quer autocarros ou barcos. Se as pessoas não os usam não se queixem. As filas de trânsito não são reflexo de má qualidade de vida, são reflexo de um mau ordenamento crónico (veja Portugal, um Retrato Social, quando se fala das cidades, e leia o que os geógrafos portugueses pensam deste tema...). Quando as coisas são feitas à portuguesa, é nisto que dá.

"Investimentos nos mesmos sítios: não se esqueça que temos uma costa marítima com 840 kms que nos projecta para todo o mundo, mesmo para a Europa e que junto a esse imenso oceano temos 3 aeroportos internacionais, uns não sei agora quantos importantes portos marítimos, bem como uma evidente ind. turística. Este litoral continuará a ser polo de atração dos mais importantes investimentos."

Depois deste discurso, esqueceu-se de um pormenor. Que as regiões do Interior, no contexto Ibérico e até Europeu, estão até bastante melhor posicionadas que as do litoral. Que, por exemplo, o eixo Guarda-Vilar Formoso se encontra a distâncias-tempo semelhantes dos pólos urbanos de Lisboa, Porto e Madrid, e que estas duas localidades do Interior estão às portas da Europa, e precisamente no centro do eixo triangular formado pelas três cidades enunciadas anteriormente... E ninguém investe aqui... Porque será? Apenas porque não há vontade, não há incentivos, ninguém se interessa pelo Interior. Os interesses de Lisboa estão muito à frente dos interesses de Portugal. É a "unidade nacional", ou melhor, o "centralismo patriótico" (já o Eça o dizia no século XIX...) em acção.

De facto, para quem está em Sintra, Cascais, Oeiras ou Lisboa é muito fácil falar. Falar em qualidade de vida, e, se for preciso, dizer que os lisboetas ainda deviam ter mais regalias. Mas Portugal não é isto. Portugal não é só Lisboa, não é só Porto, não é só litoral. Em Portugal vivem-se situações dramáticas de pobreza e desertificação. Situações escondidas, que as televisões e os jornais nacionais não mostram, nem têm interesse em mostrar. Temos de as ver com os nossos próprios olhos. E admito que em Lisboa ou no Porto seja difícil fazê-lo. Mas é a única solução para ver que este país está a caminhar para o descalabro, e que é preciso equilibrar a balança entre o litoral e o interior para que Portugal vá para a frente... E não é o municipalismo caciquista, nem a "solidariedade nacional" (boa pêta contada em 1998...), que vai equilibrar os pratos da balança. Se os Açores e a Madeira tivessem esperado pela "solidariedade nacional", actualmente seriam as Ilhas Desertas. Hoje, são casos de sucesso, a juntar a muitos por essa Europa e esse Mundo fora, que comprovam que a Regionalização é o presente e o futuro.
templario disse…
Caro Afonso Miguel,

Obrigado pela sua resposta que li com a máxima atenção e interesse.

Creia que não sou contra a regionalização para defender interesses pessoais ou os interesses particulares dos que vivem em Lisboa.

Respeito as suas opiniões na defesa da regionalização, mas discordo dos argumentos que as sustentam.

Apenas, permita-me, lhe chamo a atenção para o quanto está errado quando invoca o paradigma de muitos países europeus: se passar, mesmo à pressa, os olhos pelo processo de formação desses estados, logo verá que não têm nada a ver com Portugal. Como pode invocar os exemplos da Suiça, Áustria e mesmo da Espanha?

O Afonso Miguel acha que pode e a partir daí... nada a fazer.
Caro templário:

Se a Suíça, que tem dimensões semelhantes a Portugal, não pode ser invocada, se a Espanha, que tem factores culturais e geográficos semelhantes a Portugal, não têm nada a ver com Portugal, então gostaria que me apresentasse exemplos que se podem comparar com Portugal... Ou será que Portugal é caso único?

Não se limite a dizer apenas que não. Gostaria que apresentasse argumentos que refutassem os meus, já que está tão ciente de que a Regionalização é assim tão monstruosa para Portugal.

Cumprimentos
Anónimo disse…
Caro Templário,

Todos os países no início da sua formação estavam a braços com problemas de afirmação da sua autonomia que nenhyum poderia resistir se não tivesse adoptado um método centralizado de exercício do poder político. Foi assim e continuará a ser com TODOS os Países.
Na era actual, estamos numa fase de sustentar essa afirmação de independência e desenvolvimento que os mais tecnocratas gostam de afirmar em termos de competitividade, borrifando-se para tudo o resto. Já estamos a ver ao que chegamos e as respectivas consequências.
Enquanto outros países mais desenvolvidos assistem no seu palanque mais ou menos estável ao desenrolar da crise, com economias e autonomias afirmadas, defendidas e preparadas para resolver os problemas resultantes desta crise canhestra, apesar das dificuldades que têm encontrado e os tem impelido a uma cooperação nunca dantes acontecida, no nosso País andamos perfeitamente "à rasca" sem saber o que fazer às empresas quanto mais às soluções que políticas regionais diversificadas e complementares poderiam representar para a afirmação da nossa independência e reputação no Mundo e, ainda, do nosso desenvolvimento que só poderá ser equilibrado e autosustentado, portanto sem alternativa.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Seja bem vindo e pode mobilizar-se à vontade neste "blogue", com a devida licença do António Felizes.
Estou à espera que marque a almoçarada na Sub-Região da Bairrada que, como sabe, há-de ser integrada na futura Região Autónoma da Beira Litoral, conforme mapa de A. Castanho, sem tirar nem pôr.