Regionalização

Alberto Regueira


O tema voltou de novo à ribalta da discussão pública, por o Partido Socialista o ter indicado como processo a avançar no decurso da próxima legislatura. Tanto bastou para que o vozear irrompesse imediatamente, toldando o clima de racionalidade necessário a uma discussão proveitosa. Como não fervo de amores nem desamores pelo tema, acho que possa dar uma curta contribuição, porventura não despicienda.

Há várias décadas que tenho a convicção de que o poder deve ser exercido tanto quanto possível junto dos destinatários e em contacto e diálogo com eles.

Nas pequenas comunidades locais, representadas pelas freguesias, hão-de tomar-se as decisões que interessem decisivamente aos seus habitantes e tenham pouca relevância num contexto municipal. A localização de fontanários públicos ou do cemitério local, o período de abertura e as valências disponíveis nas instituições de apoio social, a toponímia , são entre muitas outras matérias que convém tratar no plano das freguesias.

Já, por exemplo, a rede escolar, sobretudo na vertente que ultrapasse o nível do ensino básico, faz sentido ser equacionada no plano municipal e intermunicipal, com vista a assegurar com economia de meios o acesso a oportunidades de ensino adequadas a toda a população.

O mesmo se diga da rede de transportes escolares, do sistema de estradas de interesse municipal (onde as Câmaras assegurarão a interligação entre as suas freguesias, de modo a evitar fenómenos de exclusão social), e da rede de cuidados de saúde, com diferentes níveis de equipamentos, consoante a dimensão e as necessidades da população concelhia.

O nível administrativo correspondente às regiões (independentemente da questão da dimensão e configuração destas) tem uma importância fundamental.

Se os municípios actuarem isoladamente, sem cuidar de conhecer e tentar coordenar-se com os planos dos seus vizinhos, será de esperar e temer que venham a ocorrer duplicações e triplicações de equipamentos raros e caros, cuja exploração será ruinosa porque se manterão subutilizados, podendo mesmo não se chegar a obter apoio técnico à altura para a sua gestão.

É, pois, decisivo que uma entidade de nível superior assegure coerência no ordenamento do espaço de cada região e na correspondente dotação de equipamentos colectivos (estabelecimentos de ensino superior, hospitais de referência, polos de demonstração e extensão agrícola, mercados grossistas, entre outros).

Para além da coordenação geral de políticas económicas e sociais, há domínios e funções que só faz sentido equacionar e gerir no plano nacional. E vêm as funções de soberania (a representação nacional, a defesa e segurança interna, a justiça, as relações internacionais, a política fiscal, …), a política aeroportuária e portuária, a rede de transportes terrestres com ligações internacionais, as grandes plataformas logísticas….

Usando uma linguagem cinematográfica, trata-se de olhar o país e a sociedade não em “plongée”, de cima para baixo como é tradicional, mas antes em “contre-plongée”, de baixo para cima.

Bom, dir-me-ão, se é assim, é certo e sabido que vai a correr votar Sim num próximo referendo sobre a Regionalização.

E aí digo: mais devagar! Alguns dos argumentos apresentados pelos adversários da regionalização merecem ser ponderados, de modo a tomar em tempo as devidas cautelas.
Acho que têm razão quando apontam o risco de ajudar a promover fenómenos de caciquismo regional, com a criação artificial de “bairrismos regionalistas” e de estados de alma de dessolidarização com os objectivos e os problemas nacionais, e o acicatar de egoísmos paroquiais, como só não vê quem quer em pelo menos uma das nossas Regiões Autónomas.

Há também o risco verdadeiro de reproduzir mais um nível burocrático de administração e representação de interesses, a preencher de futuro principalmente por designação da força política maioritária na região, recompensando assim os seus militantes mais carreiristas, obviamente em detrimento da competência e da isenção.

Em compensação, não tenho por adquirido que o processo de regionalização implique cometer erros à escala mais graves do que aqueles que é frequente ver – e alguns de tomo – na Administração Central.

Em suma, para mim é essencial que o desenho da Administração Regional seja o mais leve possível, que a representação de interesses não reproduza uma espécie de Parlamento regional, com todo o tipo de questiúnculas políticas à mistura, que esteja assegurada, no mínimo a colaboração, se possível a coordenação pelas Regiões dos serviços descentralizados da Administração Central.

Só à vista do “figurino” da Regionalização, posso formular uma posição definitiva.

Regionalização Sim, mas …
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Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

O grande equívoco está apenas num único termo e num parêntises utilizados em todo este processo político da regionalização, tendo por base o texto deste "post". Não se trata, contudo, de qualquer confusão e insuficiência semântica ou gramatical.
Com efeito, o que se sublinhou no texto como "o nível administrativo correspondente às regiões (independentemente da questão da dimensão e configuração destas) tem uma importância fundamental" terá de ser substituido por "O NÍVEL AUTONÓMICO CORRESPONDENTE ÀS REGIÕES TEM UMA IMPORTÂNCIA FUNDAMENTAL".
A dimensão e configuração das regiões é igualmente determinante, desde que os aspectos geográficos, antropológicos, culturais, ambientais, humanos, tradicionais e sociais se sobreponham a outros mais utilitaristas e também áqueles que só funcionam como uma espécie de "anticoagulantes" dos circuitos económicos e demográficos como são as auto-estradas. Contudo, o MAL ainda lá permanece apesar da circulação ser feita agora em melhores condições, acabando por se espalhar por todo o corpo social e territorial.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)