REGIONALIZAÇÃO PROTELADA

Quando em 1980, o governo publicou o Livro Branco sobre Regionalização, já antes (e depois) dessa data, se tinham desenvolvido projectos de divisão regional, elaborados tanto por organismos oficiais como por partidos políticos, em que as principais diferenças residiam na integração ou diferenciação dos territórios do litoral e do interior. Contudo, está cada vez mais distante o idealismo regionalista da revolução de 1974 e da crise económica subsequente.

Os anos que se seguem à adesão comunitária são de acentuado crescimento económico nacional, com desvalorização do apelo à promoção dos recursos endógenos das áreas mais rurais e periféricas; Lisboa vê reforçada a sua centralidade: as privatizações das grandes empresas levam à reconstrução dos principais grupos económicos, geralmente sediadas na capital; as importantes ajudas financeiras da União Europeia são redistribuídas a partir de Lisboa e, por último, na valorização da escala europeia (Vandermotten et al., 1999), surge como decisivo para Portugal a projecção das suas duas maiores cidades – esforço que explica, em grande medida, a Exposição Mundial de Lisboa, de 1998.

A regionalização prevista na Constituição vai sendo protelada; apenas em 1991 é aprovada a Lei-Quadro das regiões administrativas.

Só sete anos depois, a Assembleia da República institui regiões administrativas em Portugal peninsular: Entre Douro e Minho; Trás-os-Montes e Alto Douro; Beira Litoral; Beira Interior; Estremadura e Ribatejo; Lisboa e Setúbal; Alentejo e Algarve.

O esforço de recuperação do mapa corográfico tradicional é evidente, em detrimento das cinco regiões-plano em vigor; no norte e centro, divide-se o litoral e o interior, na valorização das suas assimetrias.

A área metropolitana de Lisboa é consagrada, sob a designação dos seus dois principais pólos urbanos, Lisboa e a mais distante Setúbal; nela incluem-se os municípios mais rurais do norte do distrito de Lisboa, a significar, uma vez mais, a subsistência do vínculo distrital.

Na designação da região de Estremadura e Ribatejo esquece-se que os territórios de Lisboa e Setúbal integram tradicionalmente a Estremadura.

É difícil dividir o Centro, onde Coimbra carece de uma inequívoca liderança perante Leiria, Aveiro, Viseu, Castelo Branco ou, mesmo, Guarda, cidades agora repartidas por três regiões administrativas diferentes.

A área metropolitana do Porto não se individualiza – o que tanto permite a leitura de um menor dinamismo regional, como o esforço em liderar todo o Norte.

Quando ainda ecoavam os ecos do sucesso nacional da EXPO, solicitados a pronunciarem-se sobre a instituição das regiões administrativas e daquela da sua área de recenseamento eleitoral, a maioria dos portugueses alheia-se desta votação (participam 48,29% dos eleitores) e os que nela participam recusam tanto a regionalização administrativa (60,84%) como a instituição da sua região da sua área de recenseamento (58,92%) .

A recusa da regionalização surge ao arrepio do projecto político da União Europeia. Com uma política regional instituída apenas a partir de meados dos anos 70, a integração territorial pretendida pelos seus responsáveis compagina-se menos com uma Europa de países, herdeiros directos de estados-nação ciosos das suas identidades e interesses, e mais com o de uma Europa das Regiões, com as quais as autoridades comunitárias desenvolvem um diálogo mais fácil e de alguma cumplicidade frente aos governos nacionais.

Em nome de uma coesão territorial que exige a aposta nas regiões mais desfavorecidas, como se lê na mal sucedida Constituição Europeia, os fundos estruturais mais importantes têm matriz regional, como sucede com o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e o Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA).

A própria Comissão Europeia lamentou publicamente o resultado negativo do referendo português sobre a regionalização.

SÉRGIO CLAUDINO

Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

No nosso País, não se "protela" para se iniciar uma discussão útil e cívica sobre qualquer assunto de natureza política, mas discute-se sempre primeiro, não para alinhar soluções e concertar acções, mas para protelar sempre seja o que for, especialmente se se tratar de "coisas" políticas essenciais. Na verdade, fomos, somos e continuaremos a ser um País velhacamente protelado, uma sociedade amorfa e igualmente adiada, com dúvidas sobre se a actual crise internacional, de origem genuinamente cretina, imoral e acívica, irá contribuir para o arejamento das mentalidades e para uma alteração radical de atitudes e comportamentos individuais e colectivos.
É precisamente isto que tem justificado a não implementação da regionalização e, o mais grave de tudo, por conselhos e influências espúrias e irresponsáveis, a indisponibilidade referendária do eleitorado para a eleição da melhor solução política de regionalziação: as 7 Regiões Autónomas, profusamente aqui apresentadas e objectivamente defendidas em trabalhos sobre economia regional.
É de grande dificuldade de entendimento que a adopção de políticas estruturais e estruturantes, como as fundamentadas na regionalização, só possa admitir como único método de implementação o da realização forçada por condições adversas que só podem enviesar ou limitar as condições objectivas e eficazes de concretização, originadas ou não por esta ou aquela crise. Esse não reconhecimento da oportunidade e/ou necessidade política de implementação da regionalização, como instrumento político a favor do desenvolvimento da sociedade, só pode ser interpretado como uma dramática FALHA POLÍTICA na percepção ou compreensão das condições idiossincráticas actuais das regiões diferenciadas que caracterizam o nosso território continental e das sociedades que nelas habitam e realizam as suas actividades económicas, sociais, culturais, educacionais, ambientais e sustentáveis. Esta falta de visão política não é nem continuará a ser inédita nos anais da política portuguesa, mas a sua persistência ou continuidade no tempo começa a ser indício de uma doença politica grave e orientada para um centralismo político em ligação directa com uma exclusividade de benefícios distribuidos por um número muito restricto de regiões, de organizações ou de entidades, acompanhado de um ostracismo real das restantes regiões territorialmente mais vastas e de sociedades em crescente indigência e desertificação, em que as suas interligações por auto-estradas funcionam, em grande parte, como anticoagulantes da circulação rodoviária.
A problemática do desenvolvimento da nossa sociedade tende a assumir contornos dramáticos que serão muito acentuados com o evoluir da actual crise internacional e de repercussões parciais no contexto nacional, razão pela qual serão exigidos esforços de natureza política mais profundos e de largo espectro, para que a sua incidência possa alargar-se temporalmente por um período tanto mais longo quanto possível, de forma a combater definitivamente as assimetrias de desenvolvimento e as desigualdades nas condições materiais e qualitativas de vida das nossas sociedades regionais e nacional.
A única solução que pode apresentar resultados positivos nas nossas condições de desenvolvimento económico, social e cultural só pode basear-se na implementação de políticas que respeitem as características de cada Região Autónoma, para ser possível fazer um total e melhorado aproveitamento dos respectivos recursos sem qualquer excepção para o incremento da produção interna diversificada, autosustentada e competitiva.
Esta solução identifica-se, integralmente, com a regionalização autonómica como o instrumento político por excelência a ser utilizado sem hesitações nem limitações em tudo o que se relacione com o ordenamento sustentado do território, a preparação diversificada da produção mineira, termal, agrícola, pecuária, florestal e piscatória, o aprofundamento de todas as valências ambientais, a recuperação de todo o património construído, a valorização de todo o património histórico e arquitectónico e a limitação absoluta de construção nova.
Como sempre, a imprescindível regionalização autonómica formatada por 7 Regiões Autónomas a juntar às duas existentes nos territórios insulares, acompanhada de uma reorganização total e profunda dos organismos que sustentam o funcionamento dos Órgõs de Soberania e da Administração Pública.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)