O porquê de um NÃO rotundo às 5 regiões

Artigo retirado da página de discussão pública do Projecto de Programa Eleitoral do Bloco de Esquerda


A afirmação de que a regionalização não é um assunto consensual na sociedade portuguesa e a imposição de um novo referendo popular não deveriam obrigar o BE a aceitar uma qualquer regionalização. De facto, o PS irá incluí-la no seu programa eleitoral, o que deveria levar o BE a debater este assunto e, depois, apresentar aos portugueses a sua proposta. Aquilo que está escrito no projecto de programa não é, no meu entendimento, uma proposta alternativa ao que o PS defende, nem é uma proposta que consiga dar resposta ao problema efectivo que são as assimetrias regionais, a interioridade e o centralismo vigentes em Portugal.



Contributo de Luís Vale

O BE defende um modelo de descentralização e de regionalização que assenta, essencialmente, nos territórios das actuais CCDRs. Apresenta o exemplo da NUT Alentejo (como poderia apresentar outras com os mesmos ou ainda piores índices). Com isso apresenta um mapa de 5 regiões (tal como o PS faz), mas não explica porquê, nem fundamenta a escolha por tal divisão administrativa, nem sequer as suas vantagens.
Antes de mais, deveríamos ter começado por debater seriamente este assunto, com tempo e disponibilidade, de forma a consciencializarmo-nos da existência de diferenças regionais muito expressivas e que ultrapassam largamente a visão centralista e dicotómica para a divisão administrativa do país. E esta não é uma atitude ou postura de guardador de rebanhos ou de quem está apenas e só preocupado com o seu quintal. É, fundamentalmente, a tentativa de percepcionar o território tendo em conta todas as partes que compõem e permitem o todo, naquilo que serão as continuidades e as descontinuidades endógenas que compõem o território nacional.
Porque o documento não fundamenta as 5 regiões e assim não sabemos porque é que o BE defende esta regionalização, procurarei argumentar porque não acredito nessa divisão administrativa e suas desvantagens:

-Defender as 5 regiões é não percepcionar as idiossincrasias actuais das várias regiões que compõem o nosso território continental;
-Defender as 5 regiões é não estar atento às diferentes actividades económicas, sociais, educativas, culturais e ambientais que caracterizam cada uma das regiões;
-Defender as 5 regiões com o argumento da expressividade demográfica não colhe, pois mesmo aqui ao lado em Espanha encontramos regiões com grande expressividade e outras com pequena expressividade demográfica;
-Defender as 5 regiões é não perspectivar diacrónica e sincronicamente o que originou, o que uniu e une, o que desuniu e desune os territórios;
-Defender as 5 regiões é não apostar nas regiões mais desfavorecidas e mantê-las afastadas dos centros de decisão;
-Defender as 5 regiões é não defender os equilíbrios sociais e não promover o pretendido e programa do contrato entre o interior e o poder central;
-Defender as 5 regiões é apenas transferir o centralismo e o poder de Lisboa para outras 4 cidades que, a seu tempo, promoverão novas centralidades e novas assimetrias regionais;
-Defender as 5 regiões é não ter em consideração as simbologias identitárias locais e regionais, que em muitos casos se afirmam através da oposição e/ou confrontação, criando espaços de pertença e espaços de não-pertença. Por exemplo, naquilo que pretendem designar região Norte, não encontramos concerteza uma identidade nortenha, mas sim várias identidades: minhotos, beirões, transmontanos, durienses, tripeiros ou portuenses, entre outras e para não referir outras de carácter mais local, mas com uma forte componente identitária, muitas vezes superior à própria nacionalidade.
-Defender as 5 regiões e pelas razões apresentadas, será em última análise, não querer uma regionalização, pois havendo necessidade de um referendo, esta divisão administrativa promoverá a vitória do Não.
-Sem esquecer os critérios de racionalidade territorial temos que perspectivar o país prismaticamente, aceitando que cada um desses prismas possa ter a sua lógica e a sua racionalidade. São várias as manifestações de desagrado perante a possibilidade desta proposta de divisão administrativa do país vir a ser apresentada. A Norte, ao Centro e a Sul são muitas as opiniões que divergem e se insurgem contra esta regionalização e o BE, se acredita na descentralização, deveria estar atento e escutar essas opiniões. Para bem da regionalização.

Para se poder falar de região, enquanto unidade administrativa, é preciso que os contrastes inter-regionais sejam superiores aos intra-regionais, ou de outra forma, não poderemos falar de região sempre que nesta se verifique que as descontinuidades são superiores às continuidades. Assim, considero que as 5 regiões serão insuficientes para traduzirem fielmente a realidade do Portugal actual. Se algumas das regiões propostas estão correctamente definidas, outras há que não. Portanto, parece-me que a alternativa mais adequada para a promoção da descentralização será sempre um mapa com um mínimo de 7 regiões:


-Trás-os-Montes e Alto Douro
-Minho e Douro Litoral
-Beira Interior
-Beira Litoral
-Estremadura e Ribatejo
-Alentejo
-Algarve


Bragança, 29 de Maio de 2009
Luís Vale

Comentários

Anónimo disse…
OK. E a «Grande Lisboa» e o «Grande Porto»? Como fazer uma regionalização deixando de fora estas duas realidades que se impõem em todos os aspectos aos territórios limítrofes? Gostava de ter a sua opinião.
Por ex. Eu sou e moro em Alenquer, uma zona de charneira entre o Ribatejo e o Oeste ( de facto não há lógica nemhuma em as separar. Históricamente esta é a «grande Estremadura», o Ribatejo é uma criação mais recente ) e, embora às portas da Grande Lisboa e em nada me identifico com ela, mas... necessidades de saúde, educação, emprego, etc. é para lá que me empurram. Em que ficamos?
Cumprimentos
José Lourenço
Caro José Lourenço:

Para o caso das Áreas Metropolitanas (de Lisboa e do Porto), proponho uma solução semelhante àquela que foi encontrada noutros países da Europa, com cidades de dimensões semelhantes. Ou seja, estas áreas metropolitanas ficam integradas nas suas regiões de origem (Lisboa na Estremadura e Ribatejo; Porto no Entre-Douro e Minho), mas adquirem um estatuto especial dentro da respectiva região, com poderes alargados e competências específicas em áreas que lhe dizem directamente respeito, como o planeamento urbano, os transportes (por ex., ficariam responsáveis por planear as respectivas redes de metropolitano, eléctrico e autocarros, dentro de um orçamento definido pelo respectivo Governo Regional), as políticas de ambiente e melhoria da qualidade de vida, etc.
Deste modo, defendo ainda que os serviços regionais (Governos Regionais, Secretarias e Direcções Regionais), aquando da sua criação/remodelação no contexto da Reforma da Regionalização de Portugal, devem sempre ser localizados em cidades diferentes (ou seja, nenhum concelho poderia receber mais que um serviço destes), de preferência o Governo Regional nunca se deveria situar na maior cidade de cada região nem em cidades com mais de 100 000 habitantes, dando-se primazia às cidades médias, principalmente às mais centrais no contexto de cada região (por ex, Santarém na Estremadura e Ribatejo; Guimarães no Entre-Douro e Minho; Fundão na Beira Interior, etc.). No caso das regiões em que estão incluídas as áreas metropolitanas, defendo que nenhum organismo regional deve ser sediado em qualquer concelho pertencente a uma Área Metropolitana). Assim, estes organismos teriam mais espaço para se preocupar com os problemas das áreas menos urbanizadas de cada região. Esta medida contribuiria também para descongestionar o Porto e Lisboa. Por seu turno, nas áreas metropolitanas, existiriam as tais Autoridades Metropolitanas, como em Barcelona, por exemplo, que teriam a sua sede no Porto e em Lisboa e se ocupariam das áreas urbanas, com as atribuições que acima referi.

Espero que esta proposta vá de encontro àquilo que referiu.

Cumprimentos,
Afonso Miguel
Anónimo disse…
Caro José Louenço,
Caro Afonso Miguel,

Folgo em reconhecer que se começa lentamente a perceber a inevitabilidade da criação das 7 Regiões Autónomas como suporte territorial da regionalização, esta não como objectivo em si mesmo mas como um importante instrumento político de desenvolvimento.
Abstraindo o facto de o mapa aqui impresso não ser o mais adequado, realça-se ainda a necessidade de as actuais grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto não deverem ter nenhum estatuto político-administratico especial mas deverem integrar-se na Região Autónoma a que pertencem: a AML na Região Autónoma de estremadura e Ribatejo e a AMP na Região Autónoma de Entre-Douro e Minho.
Criar excepções, sejam de que natureza forem só contribuirão para cedências progreesivas e absolutas que inquinarão todo o processo político da reguionalização e inviabilizarão todos os objectivos de desenvolvimento (DESÍGNIOS NACIONAIS) que lhe estão subjacentes, a saber:
(a) Soberania
(b) Desenvolvimento económico e social
(c) Conhecimento e tecnologia
(d) Equilíbrio social

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Caro anónimo pró-7RA:

Viseu NÃO É BEIRA INTERIOR!!!!

um viseense
Apesar de ser fortemente a favor da regionalização, reconheço que o anterior mapa (referendado) não era, de todo, adequado, e por sinal há gente que insiste em repetir erros do passado, com certeza no intuito de ver a história repetir-se.

Um país dividido num número de regiões tão mais próxima do número de distritos, serve o mesmo propósito que a divisão actual com adicionada descentralização de poderes e competências - uma bandeira do passado, que em nada surtiu efeito.

Este mapa acentua, por outro lado, a grande divisão do país, que não é Norte-Sul, mas sim Litoral-Interior, e incorre no risco de dividir a união cultural em determinadas regiões, como pudemos comprovar com a intervenção do amigo de Viseu, referindo que "Viseu não é Beira Interior".
Como exemplo, duas regiões no Norte do país é um atentado à comunhão cultural que se vive no Norte; por esta razão qual é a justificação em propor um Alentejo "unido" e um Centro e Norte "fragmentados"? Ridículo!

Sou daqueles que acredita que a matriz base para a regionalização devem ser as "regiões culturais" em que o país se pode dividir e essas não são muitas. As regiões deveriam ser o mais vastas possíveis dentro dos princípios de identidade e união cultural.

Como é óbvio as AMs de Porto e Lisboa têm de estar integradas na respectiva região.
Isso nunca aconteceria no Porto pela natureza da cidade e da sua relação com a região, já em Lisboa, sendo a capital, haveria tentação de se concretizar assim; porém se Lisboa quiser realmente fazer parte do país de que é capital só tem ela mesma de se incluir em vez de se auto-excluir como têm feito até esta parte.

Anseio para que todo este processo se desencadeie de forma célere. A autonomia deve ser garantida a quem tem a iniciativa de ser autónomo, uma questão de liberdade e identidade em favor de um país mais justo, equilibrado e desenvolvido.

Cumprimentos.
Augusto Bastos-R
"Comunhão cultural que se vive no norte?"

De que é que está a falar. Não deve estar a falar do mesmo país que eu. Em Trás-os-Montes há uma oposição enorme à "região norte", porque os transmontanos têm uma identidade muito própria, não têm nada a ver com os minhotos ou os portuenses. Isso é indesmentível. O "norte" não une, só desune. Para lá do Marão, muito poucos são os que defendem a "região norte". E os motivos são tão evidentes que dispenso de os repetir, mais uma vez. O mesmo acontece aqui na Beira Interior. Para cá da Estrela, muito poucos aceitam ser incluídos no "centro".
Este mapa de 5 regiões, esse sim, acentua os contrastes litoral-interior, porque as regiões mais pobres vão ser incorporadas em regiões mais ricas, e vão ficar mais uma vez, esquecidas, e à mercê do Porto e de Coimbra. Um mapa destes de pouco adianta a Trás-os-Montes e à Beira Interior. Eu sei que é difícil a quem vive no Litoral ver isto. Mas venham ao Interior e vejam como é verdade.

A conclusão é inevitável: os motivos que levam a uma divisão Entre-Douro e Minho/Trás-os-Montes e Beira Litoral/Beira Interior são tantos e tão ou mais fortes do que aqueles que levam à divisão Alentejo/Algarve.

E, falando no amigo de Viseu, ele tem razão. Viseu não é Beira Interior. A zona de Viseu, Mangualde, Nelas, Penalva do Castelo, Sátão, Carregal do Sal e Oliveira do Hospital, hoje em dia, é quase unanimemente incorporada na Beira Litoral. Viseu e a região Dão-Lafões atingiram já um nível de desenvolvimento equivalente à região de Coimbra. Por isso é mais que certo que se incorporem na Beira Litoral. Beira Interior englobará já concelhos como a Guarda, Fornos de Algodres, Celorico da Beira, Trancoso, Seia, Gouveia, Covilhã e Manteigas, entre outros.
Ao sr. Augusto Bastos proponho uma visita a estes concelhos, para que veja, (como é possível?) concelhos tão próximos serem tão contrastantes, uns serem desenvolvidos e em crescimento (Beira Litoral), e outros estarem a empobrecer e em progressivo abandono e desertificação (Beira Interior).

Não ignoremos as realidades. Saibamos distinguir aquilo que é diferente. E numa coisa concordaremos: as cidades, vilas e aldeias da Beira Interior e de Trás-os-Montes nada têm a ver com as cidades, vilas e aldeias de Entre-Douro e Minho e da Beira Litoral.

Como resolver este problema de contrastes? Criando regiões litorais e interiores, dando-lhes autonomia, e criando mecanismos de desenvolvimento (a chamada discriminação positiva) para estas regiões. Por exemplo, crie-se um Fundo de Coesão Nacional. Outra sugestão: peçam-se fundos europeus e aproveitem-se até ao último cêntimo! Mas que as coisas sejam geridas in-loco, por quem sabe e conhece a realidade, do Interior, no Interior e para as pessoas do Interior.

Cumprimentos.
Afonso Miguel, Vilar Formoso (Beira Interior)
Anónimo disse…
agora é que o afonso miguel disse tudo!

Viseu na Beira Litoral já!
um viseense
Anónimo disse…
Caro Viseense,

Para mim, Viseu é a minha segunda cidade, depois do Porto, por razões afectivas e por ter passado largas temporadas nessa excelente cidade, nos últimos 15 anos.
Devo realçar o período de intensos 7 meses entre Janeiro e Julho de 2003, com deslocações e permanências semanais. Deste período, aproveitei para conhecer bem não só o Distrito de Viseu como o Distrito da Guarda e as diferenças entre os dois, em quase todos os domínios, são nulas.
Se insistir na integração do Distrito de Viseu na futura Região Autónoma do Douro Litoral, cedo irá arrepender-se por estar a coartar as potencialidades de desenvolvimento de uma região que, por ser natural e culturalmente interior, em nada beneficiará de uma "colonização" por parte da futura Região Autónoma da Beira Litoral, já com dois potenciais degladiadores: Aveiro e Coimbra (à boa moda das comesinhices lusas).

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
O mapa de 7 regiões é sem duvida o mais correcto. Penso que o maior problema é mesmo a fronteira entre cada uma delas.
Uma reforma dos concelhos também se precisa (existem concelhos a mais).
Concordo totalmente com a criação de um fundo de coesão nacional, apoiado na regionalização.
Este comentário foi removido pelo autor.
Quanto ao norte posso falar melhor que alguns sr.s aqui porque com mãe minhota, pai transmontano, sendo eu duriense, e com família e amigos espalhados por toda a região sinto-me suficientemente qualificado para falar sobre a alegada "desunidade" cultural no norte. Que no resto do país não a têm sei-o bem... mas o problema não é nosso.

Um bracarense gosta pouco de um vimaranense e vice-versa, e um poveiro pouco gosta de um vilacondense, e versa-vice; separados em ambos os casos por meia dúzia de quilómetros quer o sr. dizer que são de culturas diferentes?
Diferenças há sempre, até de bairro para bairro, e não é desculpa. Também não tem que ver com gostar muito ou pouco ou nada, era o que faltava, mas esse comentário só prova que quando se fala em cultura há muita gente que ainda não sabe do que se fala.

Quando for aos livros de história e continuar a não perceber por que é que nós aqui, nom somox lusitanux, max outra couza, benha pra cá cum essa cumbersa pra me rir maix um poucu.

O "esquecimento" de que algumas regiões são alvo não tem que ver com os distritos vizinhos.
Se Trás-os-Montes está "esquecido" de certo não é por culpa de Vila Real ou de Bragança, muito menos do Porto, Braga ou Viana que em nada podem intervir no que se passa por lá (quer administrativamente, quer financeiramente); e para o caso tanto vale falar de Trás-os Montes como do Alentejo.
O nível intermédio de governo regional alteraria esta situação.
E por favor, não tornem isto uma questão de quem dá mais ou quem dá menos, "eu dou 7!", "eu dou 5!", "eu dou 8!"... as regiões, a acontecerem, serão as que forem necessárias, eu sei qual é a minha, e cada qual saberá qual é a sua.

Fique também a saber que em todo o país, Porto, Braga e Aveiro (por esta ordem) são os distritos que menos investimento recebem de fundos públicos, em função da população residente. Por isto, quando se fala em "esquecimento" a questão é mais traiçoeira do que parece à primeira vista - porque os meus impostos valem tanto como os seus ou os de um lisboeta.

Cumprimentos,
Augusto R.
Caro Augusto:

Quanto a isso não haja problemas. Eu só falo daquilo que sei. A minha família paterna é toda douro-minhota e eu próprio nasci e vivi muitos anos em Paços de Ferreira, às portas do Porto (Entre-Douro e Minho).

Apenas acho que deveríamos todos respeitar as diferenças a nível económico, sócio-cultural, paisagístico, etc. entre as regiões. E acho que o Entre-Douro e Minho é tão diferente de Trás-os-Montes como do Alentejo, embora "apenas" o Marão, o Alvão e o Barroso os separe.

E sejamos francos: Se o Porto se apanhasse com a "região norte", não faria com Trás-os-Montes aquilo que Lisboa tem andado a fazer com o resto do país?

Nós não andamos aqui a colocar problemas à toa. A Regionalização tem de ser feita e é indispensável. Mas, se a vamos fazer, que ela seja bem feita. Não é qualquer mapa que serve os interesses do país todo, e é isso que queremos salvaguardar. Independentemente de todas as rivalidades entre "capelas" que têm andado a estragar tudo em Portugal.

Cumprimentos.