Crónica de um interioricídio progressivo...

Macrocefalia arrasa o interior

Uma morte anunciada



As cidades capitais de distrito, Beja, Bragança e Portalegre, se nada se fizer em contrário, correm o sério risco de desaparecer do mapa. Este foi o resultado de um recente estudo efectuado pelo geógrafo Álvaro Domingues, da Faculdade de Arquitectura do Porto. Uma verdade dura que não deixa margem para se esconder a cabeça debaixo da areia, tentando ignora-la.

Lentamente embora, conhecemos, nas últimas décadas, a morte anunciada das nossas aldeias. A recente saída das escolas, de centenas de povoações, é disto um exemplo.

Portugal, como o resto do mundo, estão a mudar a um ritmo tão acelerado e vertiginoso que mal dá tempo para se pensar na organização das sociedades.

No espaço civilizacional em que nos encontramos, conhecemos a primeira centralização urbana, de uma grande dimensão, as cidades do Império Romano. Fundadas para atrair as tribos conquistadas, os romanos fundaram cidades estratégias que lhe permitiram dominar todo o Império, com força militar e administrativa, desenvolvendo a sua economia agrícola e mineira.

Mas como nenhuma cidade é eterna, com a invasão dos denominados povos bárbaros, uma a uma, as cidades romanas foram sendo destruídas e reduzidas a ruínas e, nos últimos tempos, a peças arqueológicas.
Foi necessário esperar pelo séc. XI e XII para que as cidades medievais ganhassem novamente força económica, cultural e religiosa. A crise do séc. XIV, com a peste negra, limitaria este grande surto urbano.

Limitada nas suas forças, a Europa só se conseguiu erguer de novo com os descobrimentos, séc. XV e XVI, altura em que surgiu Lisboa em grande expansão económica e demográfica. Não demoraria muito tempo para que Amesterdão, e depois Londres, nos roubasse o título de centro da economia - mundo.

É assim que chegamos ao séc. XVIII, com a Revolução Industrial inglesa, a imprimir o ritmo do desenvolvimento moderno, baseado na tecnologia – maquinaria - e na mão de obra intensiva e barata. As populações acabam por deixar as suas terras, procurando nas fábricas o seu sustento. Para se instalarem na cidade, criam-se bairros sociais ou de lata que vão acolhendo multidões desenraizadas e sem dignidade.

Foi este movimento imparável que permitiu, chegados ao séc. XXI, ter hoje cidades com vinte e mais milhões de habitantes. Formigueiros humanos a crescerem, deixando os campos vazios. Onde há indústria, serviços e turismo as condições de atracção das pessoas letradas ou não, são muito fortes. As correntes migratórias tornam-se imparáveis.

Chegados aqui, compreendemos que as aldeias têm os dias contados. As cidades, de pequena dimensão, vão seguir-lhe a sorte.

Em Portugal, desde os descobrimentos, nem a Igreja, nem a nobreza conseguiram inverter a macrocefalia do país. Nem a Iª República, nem o Estado Novo travaram o despovoamento do Interior. Apenas os serviços públicos se mantiveram, ainda que em estado de letargia, as nossas cidades raianas. Reduziram-se quase tão só a cidades do super Estado administrativo.

Nos últimos anos, a centralização do país tem vindo a conhecer ainda maiores desenvolvimentos, com a supressão de serviços distritais. Nem o polis salvou as cidades do interior dado que as foi tornando mais parecidas, com identidade menos definida. O turismo não se desenvolve com estas estratégias niveladoras.

Como inverter tudo isto? Ninguém terá a resposta. Algumas tentativas têm sido ensaiadas no sentido de darmos as mãos às cidades da vizinha Espanha. Outra solução, ainda não concretizada, vai no sentido da urgência de uma regionalização equilibrada. Parados como temos estado, apenas nos restará preparar o jazigo de família.

Jornal Reconquista (Castelo Branco, Beira Interior)
17 de Junho de 2010

Comentários

Anónimo disse…
Não é preciso ir para o interior do país. No litoral centro temos exemplos gritantes como é o caso de Leiria.
Regionalização só com o mapa das regiões naturais ou então com o mapa das CCDR`s.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Mas podem descansar que há sempre uma alternativa à desertificação do interior ou memso de algum litoral: a deslocação da fronteira actual na direcção do mar. Basta ver o que está a acontecer no Alqueva e já há muitos meses aqui referi esta inevitável deslocação fronteiriça, mais devido à iniciativa de Espanha tolerada pela apatia nacional.
A tendência é para tudo isto se agravar, seja com estes ou com aqueles, onde o interesse nacional nunca estará equacionado adequadamente.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)