Centralismos

Num comentário recente a propósito da Região Norte, pergunta David Oliveira, da Régua, quais as razões pelas quais o “centralismo do Porto” (supostamente associado à criação de uma Região Administrativa do Norte) será preferível ao “de Lisboa”, isto na sua perspectiva de munícipe da Régua e de eleitor duriense, ou trasmontano.

Posta assim a questão, desta forma (construtivamente) provocatória, dir-lhe-ia que o alegado centralismo do Porto, a existir, será sempre muito mais justo do que o centralismo actual (é incorrecto designá-lo por “lisboeta”). Porquê? Vou tentar responder-lhe a um nível estritamente racional, até porque, emocionalmente, estou totalmente fora do problema (nasci e sempre vivi em Lisboa):

Primeiro, porque o voto do David Oliveira nessa situação passaria a ser pelo menos três vezes mais forte do que actualmente, pois o universo eleitoral da prevista Região Norte (com o Porto) é cerca de três vezes menor do que o universo nacional (isto em ordem de grandeza, claro). Sendo assim, seria muito mais fácil a todos os trasmontanos, durienses e minhotos influenciarem, com o seu voto, as decisões que viessem a ser tomadas, no Porto (ou noutra sede regional), sobre os destinos da sua Região, do que misturados com os votos de alentejanos, beirões, algarvios, lisboetas, ribatejanos, ou ilhéus. Que quando votam pensam em tudo, menos nas necessidades concretas e específicas das outras Regiões que não as suas próprias!

Por outro lado, a Régua e Trás-Os-Montes não ficarão “separados” do resto do País, com a Regionalização, pelo que aquilo que o David Oliveira designa como o “centralismo de Lisboa” continuará sempre a existir, só que limitado exclusivamente aos assuntos de interesse nacional, nos quais o voto de todos os portugueses conta em total pé de igualdade!

No entanto, com a existência de órgãos regionais legítimos e democraticamente representativos, os assuntos e temas políticos de interesse exclusivo de cada Região (e olhe que não são assim tão poucos) seriam decididos apenas pelos respectivos eleitores, como aliás já acontece com os Municípios e as Freguesias (e ninguém questiona), deixando de haver a actual promiscuidade em que todas as Regiões são dirigidas pelo Governo, que não é “de Lisboa” mas sim de todos os portugueses, que quando nele votam estão preocupados com as matérias da sua competência e não com os assuntos regionais! E também os governantes sabem que, quando forem julgados, o serão pelo que fizeram no País como um todo, e não em cada Região!

Pelo que o voto dos portugueses acaba assim por ser “aproveitado”, sem que eles disso se apercebam, para esses dois planos distintos, mas sem qualquer “verdade” no plano regional, pois que nenhum eleitor toma opções nesse plano quando lhe pedem o seu voto para os órgãos nacionais!

Por isso acredito que, apenas quando as questões sobre a Região Norte (e serão “apenas” essas) forem decididas, seja no Porto, em Braga, em Guimarães ou até na Régua, mas desde que com base na legitimidade democrática do universo eleitoral nortenho, só nessa altura essas decisões serão tomadas não só com o conhecimento mais apropriado, mas sobretudo com a eficácia, a transparência e a autenticidade de quem sente estar a “tratar do que é seu”, argumento que é válido, aliás, para qualquer outra Região deste País, incluindo a minha (Lisboa e Vale do Tejo), onde as decisões, apesar de serem tomadas na sua sede, o são com base em critérios de apreciação e numa legitimidade eleitoral nacionais, que tal como nas restantes Regiões em nada favorecem a racionalidade, a justiça e a operacionalidade das mesmas!

Caro David, o que eu quero transmitir-lhe é o seguinte: eu continuaria a ser um acérrimo defensor da Regionalização em Portugal Continental, mesmo que a minha Região, por hipótese, tivesse a sua sede em Alcochete, Cacilhas, Arruda dos Vinhos, Setúbal, Bobadela, ou (por redução ao absurdo)… Badajoz! Desde que os seus órgãos de poder fossem eleitos e politicamente responsáveis perante os meus concidadãos lisboetas, estremenhos e ribatejanos e as suas competências claramente confinadas aos assuntos de interesse regional! Isso sim é que é o mais importante...

|A. Castanho|
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