Poder Local - os maus exemplos

Câmaras levam sete meses a pagar factura das obras

75% das autarquias pagam fora do prazo legal. Construção tem a receber 830 milhões.

Sete meses é o tempo que levam, em média, as autarquias e as empresas municipais a liquidarem as suas dívidas às empresas de obras públicas. E a factura em atraso da administração local ao sector da construção já é agora de 830 milhões de euros. Os dado do relatório da Primavera do inquérito semestral aos prazos de recebimento nas obras públicas da Federa- ção Portuguesa da Indústria da Construção e Obras Públicas (Fepicop), a que o DN teve acesso, mostram que houve um agravamento de duas semanas no prazo médio de pagamento.

Mais grave ainda, 75% das câmaras pagam fora de horas (a lei estabelece dois meses) e 5% delas levam mais de um ano a liquidar as facturas.

Alijó, Aveiro, Faro, Melgaço, Tabuaço e Vila Nova de Gaia são as câmaras mais faltosas, com prazos de pagamento acima dos 12 meses. Mas a situação agravou-se de tal forma que no escalão das que pagam no máximo até três meses estão agora apenas 33 câmaras; no último inquérito eram 45.

Para Reis Campos, dirigente da Fepicop, estes dados são a prova da ineficácia das medidas do Governo, que em Fevereiro de 2008 criou o programa Pagar a Tempo e Horas e em Novembro do mesmo ano lançou o Programa de Regularização Extraordinária de Dívidas do Estado.

O Parlamento aprovou também em Março uma lei a obrigar o Estado a pagar juros de mora sempre que se atrasar. "É o reconhecimento da ineficácia das medidas anteriores", diz Reis Campos. Só que mesmo os juros de mora "raramente são pagos" porque as empresas não o exigem. E porquê? "Depois a relação com as autarquias fica difícil, atendendo à questão dos ajustes directos [das obras públicas]", explica.

Para Reis Campos, a situação é tanto mais grave quanto é certo que o sector da construção "atravessa a mais prolongada e profunda crise de que há registo" e que provocou, em oito anos, "a perda acumulada de 31% da produção e a eliminação de 141 mil empregos". Os "crónicos atrasos" nos pagamentos por parte do Estado são um dos aspectos que mais fragilizam as empresas, assegura.

E se é verdade que o montante global em dívida até diminuiu, na medida em que é agora de 830 milhões de euros contra os 900 milhões que chegaram a estar por liquidar ao sector, isso não é necessariamente bom sinal. "Não é por estarem a pagar melhor, bem pelo contrário, é porque há cada vez menos obras públicas lançadas", diz. Isto numa altura em que "nunca a banca emprestou tão pouco dinheiro", acrescenta. Só até Abril o montante de novos créditos caiu 23%, o que corresponde a menos 1,2 mil milhões de euros.

"As empresas estão muito fragilizadas, não têm trabalho, o desemprego está a crescer, os custos de estrutura aumentaram, não colheram os benefícios da descida das taxas de juro porque lhes foram aumentados os spreads e, portanto, o dinheiro é escasso e custa mais, e ainda têm de se debater com os constantes incumprimentos por parte do Estado", lamenta Reis Campos.

|DN|
.

Comentários