Mitos da Regionalização - A unidade nacional em perigo

Mito I - A unidade nacional em perigo

O principal mito associado à Regionalização no território continental é o do perigo duma eventual desagregação do País. Vários políticos e até intelectuais de elevada craveira estão convencidos de que corremos mesmo o risco de Portugal ver a sua unidade nacional desfeita por acção de forças centrífugas que seriam geradas, conscientemente ou não, a partir dos órgãos de poder das futuras Regiões Administrativas.

Sustenta-se este receio no exemplo da vizinha Espanha, esquecendo-se que a unidade nacional espanhola já estava em risco antes da instituição das Comunidades Regionais, que não foi de todo agravada por esta reforma – muito pelo contrário, as tensões existentes foram transferidas para o jogo político democrático –, que são baseadas em diversidades étnicas e linguísticas que não se verificam em Portugal e, sobretudo, esquecendo que as regiões espanholas têm um estatuto de Autonomia, semelhante aos das nossas Ilhas, o qual não é de todo comparável ao estipulado na nossa Constituição para o território continental.

Contrariamente, quem esteja familiarizado com a experiência regionalista em quase toda a Europa comunitária sabe que a implementação das Regiões Administrativas em Países semelhantes a Portugal, constituídos por Povos com características étnicas e culturais muito homogéneas, como a França e a Hungria, por exemplo, não só não pôs minimamente em perigo a coesão desses Estados, como contribuíu muito positivamente para o reforço da identidade e da unidade dos mesmos, através de uma valorização equilibrada e homogénea das suas diferentes parcelas territoriais.

Certamente que um francês não se sente nem um milímetro menos francês por se sentir mais orgulhoso da sua Região, seja ela o Languedoc ou o Rossilhão (tirando talvez meia-dúzia de idealistas lá para a Bretanha…), assim como nenhum dos nossos avós se sentiu menos português quando foram instituídas as célebres Províncias, já que não há qualquer incompatibilidade entre ser-se alentejano, minhoto, duriense ou ribatejano de boa cepa e sentir-se muito orgulhosamente português, ANTES PELO CONTRÁRIO!

Mais complexa será a situação especial do Arquipélago da Madeira, onde um lamentável excesso de protagonismo dos políticos regionais terá já criado a sensação incómoda (e bem real?) de que os madeirenses têm hoje mais orgulho na sua Região Autónoma do que no seu País.

Bom, mas se é assim, então melhor será que o admitam frontalmente, quanto mais cedo melhor, para se encararem as soluções políticas óbvias para esse sentimento, que só poderiam resultar numa total independência do Arquipélago, ao que não me parece haver grande oposição em Portugal Continental e nos Açores, naturalmente desde que fosse essa a vontade expressa do eleitorado madeirense. Contudo, se não for esse o caso, então o referido excesso de vedetismo deverá ser de imediato ponderado e refreado, não só para se evitarem este tipo de dúvidas, como sobretudo para evitar que esse sentimento de incomodidade continue a pairar, muito negativamente, sobre a discussão sobre a Regionalização.

Porém, muito mais grave do que isso seria a instalação, na mentalidade dos portugueses, da suspeita de que a Regionalização seria vista por alguns como um “cavalo de Tróia” esplêndido para a afirmação de interesses locais ou regionais, que se pretenderiam ilegitimamente sobrepor ao superior interesse nacional. Falemos claro: a maioria das pessoas que votaram “não” no anterior referendo fê-lo com esse mesmo receio. Pior do que isso: a maioria das pessoas que possui esse receio desconfia que, mais a Norte do que a Sul, apenas se defende cinica e estrategicamente a Regionalização para se poder “passar por cima” do Governo português!

Por isso, só enfrentando corajosamente e desmentindo rapidamente esta suspeita é que esses votos poderão algum dia ser conquistados pelo “SIM” à Regionalização! Só confiando que seguramente os regionalistas, de Norte a Sul, são tão (ou mais) portugueses do que os anti-regionalistas é que este primeiro mito será definitivamente desfeito!

Por isso cabe-nos a todos nós, beirões, trasmontanos, lisboetas, algarvios, portuenses e por aí fora, defensores acérrimos ou críticos dessa grande reforma do Estado que será a implementação das Regiões Administrativas no território continental português, deixar bem claro, sem margem para dúvidas, de que, em qualquer circunstância, poremos sempre o interesse nacional acima dos interesses regionais!

Da mesma forma, bem entendido, e com toda a coerência devemos demonstrar que, em todas as circunstâncias e seja qual for a fórmula encontrada para a sua “instituição em concreto”, os interesses da nossa Região terão SEMPRE de sobrepor-se aos interesses dos seus Municípios! Como logicamente os interesses concelhios se deverão sobrepor aos da nossa Freguesia!

Só assim, insistindo e respeitando esta perspectiva pedagógica, honesta e coerente, se poderão conquistar as mentes e os corações dos que ainda vivem à sombra deste mito e temem o fim da unidade de Portugal por causa da Regionalização, não obstante as provas do contrário que estão patentes por toda a Europa, já aqui ao nosso lado...

|A.Neves Castanho|
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