Trás-os-Montes - Linha do Corgo parada e sem obras vítima da crise

Via férrea foi encerrada por questões de segurança, com a promessa de obras prontas em 2010. Continua sem funcionar.

"Apesar de tudo, Boas-Festas para a senhora do Governo, Paula Vitorino, que nos tirou o comboio com a promessa de que ele voltaria no fim deste ano. E de certeza que nunca mais vai voltar, mentiram-nos." Adelino Craveiro, 76 anos, 45 dos quais como ferroviário na linha do Corgo, olha com desalento o trilho de ferro sem vida que serpenteia o rio que lhe deu o nome, encaixado nos socalcos transmontanos entre Vila Real e Chaves.

"Para mim esta época é muito difícil pois estou para aqui no buraco e não me posso deslocar como dantes para ver os meus familiares. Agora só se o filho se lembrar de mim para me vir buscar", diz.

É neste esquecimento que as populações vivem à beira da via férrea centenária. A Linha do Corgo, inaugurada em Maio de 1906 entre Régua e Vila Real, chegou em 1921 a Chaves. Em 1990 foi encerrado o troço entre Vila Real e Chaves, ficando operacionais os cerca de 25 quilómetros de linha entre Régua e Vila Real. Em Março de 2009 acabaram-se os comboios. A medida foi justificada pela secretária de Estado dos Transportes de então por questões de segurança. Ana Paula Vitorino anunciou na altura que iriam ser investidos 23,4 milhões de euros em obras de reparação da linha, prevendo que estariam terminadas antes do final de 2010. A linha continua parada.

Por agora, restam as recordações. O antigo ferroviário recorda os tempos áureos da Linha do Corgo quando chegava a Chaves. "Era uma alegria, os comboios de cinco e seis carruagens vinham cheios de gente de todo o País que ia passar o Natal à terra. Aqui na povoação o povo fazia negócio com os passageiros, vendiam-se garrafões de azeite e vinho do Porto e até couve troncha para comer com o bacalhau", diz Adelino Craveiro. "O comboio era a vida deste vale. Agora é a desolação e a desertificação, pois os mais novos foram-se todos embora."

A solidão é constante nas aldeias que ladeiam o Corgo. E na época das festas recordar é viver. "Eu ia todos os anos por esta altura no comboio até Chaves para depois comprar em Espanha o bacalhau e arroz que nessa altura era ali mais barato", conta Maria Henriqueta, 81 anos, residente em Ermida, Vila Real. "Eu também e até trazia às vezes um bocadinho de presunto e caramelos. Era uma festa, a viagem de comboio era barata e parava ao pé da porta!" Lucinda Pinto, 82 anos, junta-se à conversa. "Agora é uma tristeza pois já se diz que nos vão tirar o autocarro e vamos ter de pagar mais de 20 euros para ir à Régua ou Vila Real."

Recordações da época natalícia na Linha do Corgo também não faltam a Maria de Fátima, 60 anos, residente em Alvações do Corgo, Santa Marta de Penaguião: "Por esta altura era uma festa, pois os comboios vinham cheios, até se faziam comboios especiais tal a afluência, pois não só vinha muita gente que trabalhava em Lisboa e arredores como muitos emigrantes em França, que vinham passar o Natal a casa" e que na Régua faziam o transbordo para a linha do Corgo que ia até Chaves".

Hoje em troços da linha há hortas e as galinhas debicam a terra. Não se ouve o apito, não passa o "monstro de ferro". O monstro amigo que deixa saudades.

|DN|
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Comentários

Este comentário foi removido pelo autor.
Os transmontanos foram, mais uma vez, enganados. Quando se fala em "unidade nacional" pense-se no que se tem feito a esta região. Pense-se no que estas pessoas sentem em relação à maneira como o País as trata. E pense-se se elas se sentem cada vez mais portugueses ou não.

Vila Real é uma cidade com cerca de 25 mil habitantes permanentes. É também uma cidade universitária, sede de uma das melhores universidades do País, a UTAD, onde estudam cerca de 8000 alunos, a maioria de fora da cidade, e que vivem a maior parte do ano em terras transmontanas. No entanto, Vila Real está sem comboio, que passava inclusive dentro da Universidade. É ver a confusão de autocarros, principalmente ao fim de semana, com milhares de alunos a movimentar-se, no único meio de transporte que os serve.

A Linha do Corgo pode não ser moderna, pode não ser funcional.
Mas é seguramente uma das grandes preciosidades de Portugal, com uma paisagem deslumbrante, atravessando todo o vale do Corgo, em pleno Alto Douro Vinhateiro. Um potencial turístico desconhecido, ignorado e inexplorado.

Na semana passada, tomei um dos autocarros de substituição dos comboios de Vila Real para a Régua. O tema dominante de conversas daquela gente não podia ser outro: a linha. Todos os que ali estavam davam o encerramento da Linha do Corgo como um facto consumado, definitivo.

Talvez a experiência de anos a fio a ser enganados por palavras soltas vindas lá de longe.
Uma triste realidade, para lá do Marão.
Luis Goncalves disse…
Bom dia a todos. Conheci bem esta linha nos anos 60, 70 e80, pois tinha familiares perto de Chaves. Sou um adepto do meio de transporte ferroviario no conhecimento universal, claro e inequivoco de que se trata do melhor meio de transporte para passageiros, mercadorias e forte na vertente turistica; adicionando-se a isto tudo os impactos positivos assinalaveis nas questões ambientais e na redução de sinistralidade nas estradas. No caso da linha do Corgo (bem como outras da região de TrasMontes) foi um crime o que se tem vindo a fazer: esta linha devidamente reconvertida e modernizada, (mantendo-se mesmo a actual bitola estreita) é imprescindivel para o desenvolvimento regional do distrito de Vila Real (e do país !), nao apenas nas funcoes sociais de transporte de passageiros mas também no transporte de mercadorias o qual traz uma mais-valia de peso a toda esta região - e que o transporte rodoviario está muito longe de o conseguir a todos os niveis (Eficiencia de transporte/ Custos de transporte/ emissoes de CO2). Posto isto, quero informar-vos de que no FaceBook existe um grupo que se constituiu recentemente, e onde se debate, divulga e defende esta linha ferroviaria. Mas é preciso mais, temos consciencia: é necessario a formalização para breve do primeiro MOVIMENTO CIVICO DE DEFESA DE LINHA DO CORGO MCLC, que possa levar o problema aos meios nacionais de informação e aos responsaveis das diversas áreas. Os primeiros passos estao a dar-se, mesmo sabendo que no momento actual pairam nuvens conzentas sobre a ferrovia regional. É mais importante avançar com o nosso MCLC do que baixar os braços....ou desistir. Nós achamos que temos de avançar, pois "desistir" é a atitude que os politicos Portugueses se e desejam nos portugueses: que o seu povo facilmente desista perante certas intenções governamentais e que todos nós como cidadãos sabemos serem catastroficas, incompetentes e com contornos verdadeiramente criminosos. E os actos criminosos tem de ser punidos bem como os seus praticantes. os recursos "roubados" ou aniquilados devem ser repostos e depois disso projectados para o futuro para o interesse do nosso país. Por isso vamos continuar, e o MOVIMENTO MCLC poderá ser um passo entre outros para dar a VOZ DE DEFESA a esta linha do Corgo (tal como acontece com o Tua e o seu MCLT), voz que o Corgo triste e lamentavelmente nao teve na região TrasMontana durante os ultimos 20 anos ! Não temos tempo para lamurias nem para choros, a hora é de avançar. Mas para isso precisamos do maior numero de pessoas envolvidas e a inscrição neste moviemto é essencial: existe uma pagina de embrião no Yahoo onde as poessoas poderão registar-se e onde poderao ler o documento base de estatutos a criarmos. Ficam aqui os links do MCLC e do FaceBook. Por favor, se gosta e quer defender esta linha com actos serios, adira ao MCLC e divulgue-a pelo maior numero de pessoas.

Luis G.

MCLC:
http://finance.groups.yahoo.com/group/mclcorgo/

Grupo FaceBook:
http://www.facebook.com/#!/group.php?gid=115020471868845
Caro Luis Gonçalves:

Antes de mais bem-vindo ao blogue.
Estou plenamente de acordo com a ideia do movimento que pretendem implementar, e aderi já ao vosso grupo no facebook.

Sublinho que defender a Regionalização é também defender infra-estruturas como a Linha do Corgo que, se fosse gerida pela Junta Regional de Trás-os-Montes e Alto Douro, teria certamente outra sorte. Com uma gestão regional da linha, teríamos certamente comboios a circular entre Vila Real e a Régua e, até, quem sabe, mesmo até Chaves.
Porque só em Trás-os-Montes se conhece e percebe as necessidades dos transmontanos, só em Trás-os-Montes é que se deviam tomar decisões sobre estas infra-estruturas.


Cumprimentos,
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Estou convencido que não é por acaso que o Tribunal de Contas defende haver razões para fazer demitir de funções os administradores de 3 empresas ferroviárias.
Lá saberá explicar porquê!

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)