REGIONALIZAÇÃO, COMPETITIVIDADE E COESÃO NACIONAL

Este tema da coesão nacional leva-me a formular algumas breves reflexões, com o intuito de procurar pontos de contacto entre perspectivas que, sendo diferentes, não têm necessariamente que ser opostas.

Em primeiro lugar, parece-me ser de realçar a nossa crença comum de que, se não de imediato, pelo menos a prazo, a criação e desenvolvimento não só de verdadeiras “élites” regionais, potenciada pela instituição das Regiões Administrativas no Continente, como sobretudo de sólidas opiniões públicas regionais com base no amadurecimento das “sociedades civis” regionais, conduzirão as Regiões mais deprimidas do nosso País a níveis de desenvolvimento mais equilibrados e consentâneos com aquilo que poderíamos designar como a sua “riqueza intrínseca”.

Foi aliás um processo desta natureza, pelo facto de ser a Capital de Portugal durante séculos, que fez de Lisboa a Cidade portuguesa mais próspera, apesar de eventualmente não possuir, à partida, mais “riqueza intrínseca” do que outras urbes e regiões do nosso País.

Isto para concluir que a implementação das Regiões Administrativas, não sendo nenhuma panaceia mágica para combater o atraso sócio-económico, sobretudo no Interior, pode contudo fazer muito por esse desiderato. Pelo menos a prazo, volto a sublinhar.

O segundo aspecto que me parece ser de salientar consiste na necessidade de ultrapassar a crença simplista de que o “sub-desenvolvimento” se combate com dinheiro, ou seja, investimento público maciço. Não é assim e, se não chegasse o que nos aconteceu na primeira década da nossa adesão à U. E., teríamos um Continente inteiro como é a a África para o demonstrar.

O sub-desenvolvimento combate-se com políticas coerentes, sustentadas em estratégias adequadas e mediante instrumentos específicos, que também passam por investimentos públicos, mas não se esgotam nesse domínio. Mais: a constatação de que o dinheiro nunca faltará, mesmo que os resultados não surjam, constitui um incentivo à ineficiência e ao desperdício, o que significa, a prazo, retrocesso certo dos níveis de “desenvolvimento” artificialmente conquistados (aconteceu com Portugal, como todos sabemos).

Por isso, investir fundos públicos sem garantias da sua correcta aplicação e gestão pode ser bem pior do que não investir de todo: transformando-se num incentivo à indolência e à desqualificação social!

Por último, a competitividade é sem dúvida um factor estimulante, se bem que não deva ser elevada a objectivo em si, mas apenas um meio, geralmente eficaz, para se atingir a excelência – mas indissociável de estratégias globais de complementaridade e coesão.

As Regiões devem por isso saber competir entre si, mas também e sobretudo devem saber cooperar, na busca de soluções mutuamente vantajosas, sempre que possível.

Posto isto, exemplifico sumariamente estas ideias simples, mas basilares, nomeadamente sobre a suposta riqueza do Algarve e a escassez de fundos comunitários.

Em minha opinião, o investimento público deve ser usado como fonte de geração de riqueza e não como dispêndio em “objectos” de consumo. A realidade mostra que, tal como a maioria das famílias se endivida para consumir e não para investir, os fundos a aplicar no Algarve, ou em qualquer outra Região, devem servir para “ensinar a pescar” e não para “comprar peixe”.

Infelizmente, não é isso que se tem constatado, por todo o País (Lisboa obviamente incluída) na aplicação dos fundos comunitários.

É por esta razão que, antes de se “esbanjar” o pouco que ainda nos resta dos quadros comunitários de apoio, precisamos de exercer uma saudável auto-crítica para com os poderes existentes – central e autárquico -, como forma de evitar que o poder regional enferme dos mesmos defeitos. Ou que muita gente se oponha à sua instituição para que o “mal” se não propague…

Permitam-me assim os amigos algarvios a pergunta, muito directa: se os fundos a canalizar para o Algarve fossem superiores ao que ficou negociado em Bruxelas, haveria onde aplicá-los com elevada rentabilidade?

Dito de outra forma: há algum modelo de desenvolvimento sustentado para a Região do Algarve que não passe pela contínua e exaustiva transformação da ocupação do solo em empreendimentos turísticos de rentabilidade LOCAL muito duvidosa e futuro mais do que incerto? E é com base na "riqueza" gerada nesse modelo que se pretende ver o Algarve ascender a níveis de vida muito semelhantes aos das regiões mais prósperas do País?

E não nos esqueçamos de que a Região de Lisboa e Vale do Tejo já só vai receber umas parcas “migalhas” dos fundos comunitários, por habitante, e que obviamente terá que continuar a aplicar-se muito, para que os seus níveis de riqueza, pelo menos, se mantenham no futuro.

Porque a verdade é que, com PIB gerado nesta Região ou sem ele, são de facto os Cidadãos de Lisboa e Vale do Tejo os que, individualmente, mais financiam o OGE, ou seja, que mais dão o que é seu às restantes regiões do País! E se o dão, não é seguramente por não lhes fazer falta no seu orçamento...

Mas até para que esta noção de saudável solidariedade inter-regional se não perca, acho que o debate sobre a Regionalização não deve usar, muito menos abusar, da identificação da Região mais "rica" do País como “inimiga” das outras e do processo descentralizador. Antes pelo contrário: precisa igualmente de órgãos de efectivo poder descentralizado tanto ou mais do que qualquer outra!

Concluindo, penso que só mesmo dando as mãos, apesar das nossas (pontuais) diferenças de opiniões e de pontos de vista, poderemos um dia ver o nosso sonho concretizado: Portugal na senda do progresso e ombreando com os seus parceiros comunitários, também na questão regional! Mantendo a competitividade, em níveis saudáveis, mas não esquecendo a complementaridade e a solidariedade, indispensáveis a uma efectiva coesão social, territorial e nacional.

E sobretudo não olvidando que as quezílias de tipo “bairrista” são o gérmen de muitos dos argumentos anti-regionalização…

|A. Castanho|

Comentários