Douro: Custa mais uma garrafa de 75 centilitros depois do vinho feito do que custa uma pipa de 750 litros»

Ao mesmo tempo que cortam as uvas no Douro, os viticultores colhem dificuldades e disparam críticas ao corte no vinho do Porto e ao preço por pipa de vinho de consumo, que custa menos do que uma garrafa.

Há muito que os pequenos e médios produtores durienses se queixam da crise estar a bater à porta. Só que, agora, entrou-lhes pela casa e sem pedir licença.

«Para nós, o corte de benefício foi fatal», afirmou Aurélio Barros, vitivinicultor de Donelo, Sabrosa.

O Douro pode produzir 85 mil pipas de benefício, ou seja, a quantidade de mosto que cada produtor pode transformar em vinho do Porto. São menos 25 mil pipas que na vindima de 2010.

Aurélio Barros contabiliza menos «oito pipas de benefício» e «menos oito mil euros» que vai receber.

Para fazer a vindima, este produtor contratou 12 pessoas. Durante 12, 13 dias, vai pagar 40 euros ao homem e 35 à mulher, «comidos e bebidos».

«É muito para mim, que vivo apenas do que a vinha me dá», salientou.

Ainda por cima, há uma quebra generalizada na produção, muito motivada pelas condições climatéricas que obrigaram também a muitos tratamentos na vinha.

Em Godim, junto à Régua, Teresa Guedes ficou com «lágrimas nos olhos» quando entrou na vinha e viu as uvas «quase todas queimadas».

«Perdi cerca de 90 por cento da produção muito por causa das doenças. O dinheiro gasto com os tratamentos foi dinheiro deitado fora», afirmou.

A vindima teve que ser feita com a prata da casa e uma única pessoa contratada, a mesma que ali trabalha a tempo inteiro. «O que vou receber não vai dar para pagar o que já investi na vinha este ano», salientou.

Teresa Guedes sofreu uma quebra de benefício de oito pipas e fez 40 quilómetros diários para entregar as uvas em São Martinho de Anta, numa empresa que diz que «paga certinho».

Menos sorte teve Aníbal Miguel, que foi «despedido». Ou seja, a empresa a quem vendia as suas uvas há 20 anos recusou-se a aceitá-las este ano. «Queria saber porquê? Eram bons patrões», questionou.

Albano Teixeira não esconde o descontentamento com os governantes e este Douro que parece olhar apenas para os turistas e se esquece de quem construiu a paisagem classificada pela UNESCO há dez anos.

Concilia o trabalho na vinha com um emprego e, por causa disso, não tem férias, fins de semana ou feriados. «Se eu metesse pessoal, então tinha que deixar as vinhas a monte», garantiu.

Perdeu quatro pipas de benefício. «O vinho de consumo não o querem e ainda temos que pagar o carreto para que o levem», salientou.

António Pereira, de Gouvães do Douro, queixou-se do preço a que é pago ao produtor o vinho de consumo, o Douro DOC, designadamente 125 ou 130 euros por pipa.

«Depois, vão vender esse vinho a 70 ou até 125 euros por garrafa. É um absurdo. Custa mais uma garrafa de 75 centilitros depois do vinho feito do que custa uma pipa de 750 litros», frisou.

Este viticultor reivindicou um preço equivalente para o Douro DOC e vinho do Porto.

«Se isso acontecesse, qualquer um de nós já conseguia sobreviver», acrescentou.

Enquanto isso não acontece, os produtores prometem continuar uma luta que pode levar a greves de fome ou acampamentos à porta dos ministérios em Lisboa.

|Lusa|
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