O que faltou ao interior do país

"A política de dar tudo ao interior [do país] não funcionou". Esta frase é de Luís Menezes, deputado do PSD eleito pelo círculo do Porto - e foi publicada na edição do JN do passado dia 2 de agosto. É daquelas sentenças que criam uma certa comichão a quem, como eu, nasceu e cresceu no interior do país.

O contexto antes do comentário. A frase foi dita no âmbito de uma série de cinco entrevistas que o JN decidiu fazer a outros tantos deputados eleitos por círculos do Norte. Objetivo: ouvi-los falar sobre o que fizeram, neste primeiro ano de legislatura, em defesa das populações que os elegeram, por um lado, e perceber, por outro lado, com que olhos veem os problemas locais e regionais e que soluções têm, ou defendem, para eles.

A frase surge como resposta a uma pergunta sobre as consequências do (previsto) fecho de urgências e do já concretizado encerramento de um conjunto de outros serviços. Menezes responde que o Estado deve ser criativo, logo capaz de engendrar soluções que, com a ajuda de privados, possam ajudar a fixar populações no interior do país. O deputado conclui: "A política de dar tudo ao interior não funcionou".

O problema desta frase é que ela é, à primeira vista, quase inatacável. Na verdade, quase nenhum município do interior pode queixar-se de não ter equipamentos básicos, de não ter parques empresariais, de não ter um tribunal e um centro de saúde, de não ter um hospital relativamente perto de casa, de não ter uma biblioteca composta, de não ter um posto de correios ou um serviço de Finanças na sede de concelho, de não ter uma IPSS comparticipada pelo Estado...

À falta de tudo gerada pelo salazarismo seguiu-se o acesso a tudo trazido pela democracia. Problema: não foi por isso que a desertificação parou; não foi por isso que o litoral inchou até ao ponto em que hoje está: a rebentar pelas costuras.

Mas a frase de Luís Menezes é também o melhor atestado de incompetência que podia passar-se ao Estado central e à parafernália de instituições que supostamente o representam pelo país fora.

Apesar dos sucessivos diagnósticos (todos nos lembramos do famoso relatório Porter) que apontam a infinidade e a qualidade de recursos de que o interior dispõe para se reinventar, a verdade é que, até hoje, nenhum Governo teve capacidade para atuar nas fileiras agroalimentar, florestal, turística e cultural (só para citar alguns casos) com a criatividade de que Luís Menezes fala.

A escala municipal já provou toda a sua incapacidade para intervir a sério na economia e no emprego. Falta quem junte as peças.

A frase de Menezes tem, portanto, um erro de base. Ao interior não se deu tudo. Faltou dar-lhe o essencial: atenção e rigor no desenho de políticas sérias e a sério. O betão serviu para cobrir a razão. O resultado está à vista.

@JN
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