SOBRE O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

por Tiago Barbosa Ribeiro

O João Tunes, que muito prezo, considera que este meu texto revela bairrismo. Discordo, como se compreenderá. Não lhe chamaria bairrismo mas sim memória e crítica do que tem sido o modelo de desenvolvimento português dos últimos trinta anos, alimentado por um investimento público centralista que agrava claramente desigualdades regionais. A dualização e a estratificação são marcas de água do desenvolvimento português, numa sociedade que se tem localizado estrutural e relacionalmente no conjunto de países da semi-periferia europeia.

A dualização do território português aprofundou-se nas últimas décadas em dois sentidos fundamentais: rural e urbano, por um lado; Área Metropolitana do Porto e Área Metropolitana de Lisboa, por outro.

Dualização

Tal como existem actualmente, as duas áreas metropolitanas são consequência directa dessa territorialização assimétrica e concentram cerca de dois terços da população portuguesa. Surgiram legislativamente no início da década de 1990 e prefiguram uma mera delimitação administrativa que é resultante de uma composição demográfica e social, por oposição a uma organização de nível político e institucional como é a regionalização.

Ora, a tendência tardia da urbanização metropolitana dá-se à custa da fragmentação e diluição das cidades médias portuguesas e da absorção do êxodo rural, num movimento de polarização de duas áreas em relação ao resto do país, mas também da AML em relação à AMP. A alteração sócio-demográfica dos últimos vinte anos decorre da litoralização do espaço, que foi ele próprio um processo heterogéneo nas duas áreas metropolitanas, com traduções diferenciadas em cada uma delas e uma evidente preponderância para a AML.

Isso resulta não de características endógenas de Lisboa, que nunca teve o dinamismo comercial e industrial do Porto ou de outras regiões, mas de opções políticas erradas, de concentração local da alta burocracia do Estado e do seu investimento público. A transumância da banca privada para Lisboa, independentemente das suas sedes se manterem no Porto, é apenas um dos exemplos mais óbvios das consequências desse artificialismo que reproduz assimetrias entre regiões.

PortugalUm estudo recente liderado por Augusto Mateus, intitulado Competitividade e Coesão Sócio-Territorial, comprova isso mesmo: duas décadas de fundos estruturais não impediram a divergência de enormes manchas regionais em relação à coesão e competitividade territoriais. E este não é um problema de afirmação específica da região Norte, mas sim de todo o país porque a reconfiguração do tecido urbano nacional após o 25 de Abril é completamente atípica no contexto europeu.

A tendência europeia assentou numa estratégia politicamente orientada e assumida de fortalecimento das cidades médias como pólos aglutinadores de população. Tal deu-se à custa de um processo de regionalização, assim como da participação indirecta do Estado na economia ao libertar recursos outrora centralizados. As cidades médias tenderam a especializar-se em alguns domínios produtivos e tecnológicos, correspondendo a territórios activos. Consequentemente, este foi um modelo que conseguiu manter a população autóctone, ao mesmo tempo que captava população exterior. A Teoria dos Pólos de Crescimento esteve muito presente nesta estratégia de fortalecimento, através da distribuição funcional de lógicas de desenvolvimento assentes na manutenção e reforço das cidades médias.

Se desde 1960 até à actualidade foi este o modelo predominante na Europa, o contexto português foi precisamente inverso e após o 25 de Abril continuou a assumir-se uma tendência de progressiva fragilização e de desinvestimento nas cidades médias, situação só contrariada muito pontualmente por autarquias como Vila Real, o que impediu um modelo de sustentabilidade e desenvolvimento endógeno. Pior: sem regionalização, o Estado indicou externalidades ao investimento privado, que foi incapaz de contrariar estratégias públicas. Num país com a dimensão do nosso, isso foi determinante para os bloqueios que hoje são óbvios.

Um desenvolvimento local de acordo com os propósitos das instituições centrais acaba por se limitar a um conjunto desarticulado de micro-iniciativas sectoriais. Logo, para que o desenvolvimento regional se torne possível, é necessário uma visão integrada, uma coordenação de iniciativas e uma participação efectiva dos actores locais. Trata-se de um processo de participação-desenvolvimento, o que pressupõe estruturas de apoio regional que sirvam de intermediários entre poderes, sejam eles públicos ou privados. Usando uma expressão de Friedman e Weaver, exige-se uma «autarcia regional selectiva», isto é, acções que visem satisfazer as necessidades regionais no interior da própria região e que se apoiam em medidas políticas adaptadas porque o desenvolvimento regional deve ser um projecto regional. De impacto nacional, naturalmente.

A capacitação de estruturas intermédias e de infra-estruturas públicas na esfera da região, paralelamente à legitimidade de um governo eleito a um nível supra-concelhio, permitirá a gestão dos objectos, meios e estratégias de desenvolvimento locais que devem subordinar-se às necessidades e projectos da própria região, não da que se situa a 300Km.

Em suma, embora não se esgote aí, a autonomização do aeroporto Sá Carneiro integra-se nessa perspectiva de afirmação regional e no comentário que fiz à localização do novo aeroporto de Lisboa. Aparentemente, ele não implicará um emagrecimento administrativo do volume de voos, rotas e passageiros do Porto, o que me apraz. Apenas isso, o que no actual contexto já é tanto.
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Comentários

Sobre a questão principal, de acordo. Mas parece-me claramente um exagero falar no exemplo de Vila Real e esquecer os bem mais significativos de Braga, Viseu, Castelo Branco e Évora.


Apesar disso insificientes para contrariar a forte tendência de litoralização e de bi-metropolização do território continental português...
Anónimo disse…
preto no branco, Sr. Castanho.
sou contra os "bi".
ou estou enganado?

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Anónimo 4
Anónimo disse…
Não está nada enganado, 5 a 4: está é muito baralhado!


E está sempre perdoado, pela sua insignificância...
Anónimo disse…
vivam os bi-cefalos...
bi-se.....

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Anónimo 4
Anónimo disse…
Bem me pareci que há baralhamento a mais. Atenção que isto não é "sueca".

Anõnimo pró-7RA.
Anónimo disse…
Quem tem as cartas na mão é o Pró 7RA...eu so tenho uma decisão do Governo...


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Anónimo 4
Anónimo disse…
quem defende as 5 RA esquece-se que há zonas do Norte que estão quase tão longe do Porto como o Porto está de Lisboa...

Anónimo (Beira Interior)
Anónimo disse…
Quem me dera ter as cartas na mão. O Governo tanto diz como desdiz, de acordo com as últimas intervenções, revelando-se de um pragmatismo pouco esclarecido.

Anónimo pró-7RA.
Anónimo disse…
antigamente de burro ou cavalo, até se demorava mais.
O Vinho do Porto vinha para o Porto de rabelos.

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Anínimo 4
Anónimo disse…
Pensei que vinha de barco ...
Sabedor ... hein?

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Logo vi, que não sabe o que são barcos "rabelos"
isto é possivel?

de facto ponto final pró 7

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Anónimo 4
Anónimo disse…
É evidente, claro que não; sabe só o senhor que não é desta região. Mais uma vez não percebeu a ironia da resposta. Um político sem ponta de ironia como é que pôde chegar a autarca? Seria curioso, já agora, saber: qual a autarquia bafejada? Alguém sabe?

Prémio: bicicletas (excepto 7, para cada uma das Regiões Autónomas).

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Ninguém pia!