Vale do Ave


Uma crise sem fim numa região marcada pelo desemprego

por Natália Faria, in Jornal Público

O Vale do Ave tem mais de 500 mil habitantes e uma taxa de desemprego de quase 14 por cento, o dobro da média nacional

Fábricas a encerrar, salários em atraso, jovens qualificados sem trabalho, mulheres acima dos 45 anos que já perderam direito ao subsídio de desemprego, homens a emigrar para a Galiza em busca de trabalho. O diagnóstico no Vale do Ave pouco mudou nos últimos anos.

E, poucos dias depois de ter deixado a presidência da Associação de Municípios do Vale do Ave (Amave), o socialista Castro Fernandes, também presidente da Câmara de Santo Tirso, acusa o Governo de José Sócrates de ter votado a região ao esquecimento.

"Por várias vezes desafiámos o primeiro-ministro a vir visitar a região, mas ele nunca veio. Há três anos que andamos a pedir coisas e não acontece nada. Esta região precisa de medidas urgentes que ajudem a minorar os efeitos da crise", alerta Castro Fernandes, incitando José Sócrates a carrear "grandes investimentos públicos" capazes de dinamizar uma região que soma mais de 500 mil habitantes.

"A formação é fundamental e, além disso, a rede nacional de estradas precisa muito de apoios, assim como a área da saúde", especifica.

Depois das grandes, as PME

Se não se vêem, como na década de 90, as célebres bandeiras negras que pontuavam a crise social da região, é porque os efeitos são hoje mais diluídos.

"As grandes fábricas que tinham que fechar já fecharam. Hoje fecham todos os dias, mas são as micro e pequenas empresas. Só no ano passado, em Guimarães, fecharam 52. Mas o subsídio de desemprego e, depois disso, a pré-reforma têm funcionado como válvulas de escape", aponta Adão Mendes, da União de Sindicatos de Braga.

O desemprego no Vale do Ave oscila entre os 13 e os 14 por cento. Muito acima dos 7,9 por cento da média nacional e mesmo dos 9,5 por cento da Região Norte. E o pior, como nota Adão Mendes, é que dos cerca de 50 mil desempregados da região (o Instituto de Emprego e Formação Profissional fala em 37.239 inscritos nos centros de emprego, em Dezembro de 2007, mas não inclui os que estão em programas ocupacionais, nem os que já perderam direito ao subsídio), a maioria são mulheres.
"O desemprego de longa duração atinge quase 70 por cento dos desempregados e, destes, a maior parte são mulheres", diz ainda.

Debandada para a Galiza

Podia ser pior não fosse a debandada geral para a Galiza. "No final de 2007, havia dez mil portugueses a trabalhar legalmente na Galiza. Haverá mais 30 a 40 por cento de clandestinos", soma Adão Mendes.

"Se o sector imobiliário na Galiza entrar em recessão, ficamos entalados. Onde é que vamos encaixar esses milhares de trabalhadores?", acrescenta. De resto, o sindicalista ri-se quando ouve os empresários portugueses queixarem-se da falta de mão-de-obra.

"Querem contratar pessoas por 380 euros/mês. Na Galiza, a chegar tijolo de um lado para o outro, ganham mil e tal euros, já com descontos feitos", assinala, dizendo conhecer vários professores portugueses desempregados a exercerem tarefas desqualificadas naquela região espanhola. Basta chegar a Valença e passar o rio para ganhar o dobro ou o triplo do que se ganha aqui".

Para Castro Fernandes, o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) é o momento para que José Sócrates mostre que quer "dar a mão" ao Vale do Ave.
"Atendendo a que a Região Norte conta receber oito mil milhões de euros, segundo as mesmas regras de proporcionalidade, o Ave tem direito a pelo menos mil milhões", lança, em tom de alerta, convicto de que a região "conseguirá ser concorrencial e apresentar projectos válidos".

O autarca não espera ver repetidas as operações integradas de desenvolvimento ou sequer o Plano Integrado de Desenvolvimento que os governos de Cavaco Silva e António Guterres, respectivamente, gizaram para alavancar a região na década anterior.

"Mas - alerta - não podem continuar a ser as câmaras, sozinhas, a combater a crise, porque os cabazes alimentares e os apoios ao arrendamento não chegam para resolver os problemas."

Já o presidente da Câmara de Famalicão, Armindo Costa, gostaria de ver repostas algumas das medidas sociais extraordinárias que estiveram em vigor nos anos 90.
"Medidas especiais de protecção, sim, mas acompanhadas de medidas especiais de vigilância", reage Adão Mendes, dizendo não querer ver repetido o enriquecimento rápido dos empresários das décadas de 80 e 90.

À margem disso, na óptica de Castro Fernandes, a regionalização surge como a derradeira esperança para a região.

"Veja-se o que se passou na Galiza", argumenta, descrente de que algo possa mudar enquanto "o Vale do Ave continuar a precisar do aval de um ministro para fazer uma simples rotunda numa estrada nacional".

O autarca socialista Castro Fernandes acusa José Sócrates de ter votado a região do Vale do Ave ao esquecimento.
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Comentários

Anónimo disse…
Infelizmente, a região do vale do ave foi vítima da sua própria estratégia empresarial, na parte que diz respeito ao desenvolvimento e conómico e social. Por outro lado, qualquer governo não tem interesse especial em tratar regiões deprimidas, exactamente aquelas que aparecem na comunicação social pelos piores motivos.
Como tem sido visível, nemhum político que se preze, nos tempos últimos presentes e passados, toma a iniciativa de atacar problemas específicos pela sua duradoura dificuldade ou grande probabilidade de insucesso. A região do Vale do Ave encontra-se deprimida, em termos de desenvolvimento, há muitos anos, por inércia e/ou desvio estratégico dos protagonistas políticos e da chamada "sociedade civil", conceito que me custa a compreender por corresponder àquilo que na gíria contabilística se designa por "conta-saco": cai lá de tudo, bom e mau. O que é incompreensível nos tempos actuais em que se exige profunda especialização dos executivos e consultores nos temas e técnicas que propiciam condições de sustentabilidade de desenvolvimento e de segurança nas vantagens competitivas, tanto a nível nacional, regional como local. Desengane-se quem pense que a inovação tecnológica, baseada só nas tecnologias de informação e comunicação e noutros conceitos de moda disseminados pelos "gurus de serviço" relacionados com a gestão das organizações, tanto nacionais como estarngeiros, é a panaceia para resolver todos os nossos problemas. Antes disso, é muito relevante a formação e educação da população activa (trabalhadores, técnicos, gestores e muitos, muitos empresários) e a mobilização das populações das Regiões Autónomas, a criar e a implementar,para prosseguir os desígnios nacionais que ainda ninguém pôs assim "preto no branco" (parece até que têm medo de o fazer):
1) Desenvolvimento económico e social
2) Conhecimento e tecnologia
3) Equilíbrio social
O resto nunca passará de conversa fiada ou confiada, neste último caso muito bem pior.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
templario disse…
É de facto uma situação lamentável.

Não tenho dado conta de qualquer acção firme, persistente e concertada dos deputados dos partidos dessa região na AR, chamando eles as populações a manifestarem-se, exigindo medidas. É revoltante que haja deputados a passear pelo país para conhecer os problemas (que eles e toda a gente conhece), como é agora o caso de Santana Lopes (na política desde "criancinha")que anda por aí com as câmaras de televisão atrás.

Deviam ser corridos pelas populações com caquinha de toda a qualidade da cabeça aos pés, pelo descaramento.

É por estas práticas e de políticos desta laia que alguns querem a regionalização. Iriam fazer a mesma coisa.
Anónimo disse…
Caro Templário,

Concordo com tudo o que aqui afirma, apenas ressalvando que tudo depende da escolha dos protagonistas os quais muitas vezes sabendo todos nós já "o que são" continuam ainda a ser escolhidos para ocupar posições políticas e/ou partidárias de relevo com os resultados já por demais conhecidos.
A regionalização também corre esse risco, mas há meios para os controlar que já os expuz aqui em "posts" anteriores. Assim esse "pequeno" problema estivesse nas minhas mãos resolver.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Finalmente sabemos onde está o mal. É o santana. Mandemos o Santana para o Darfur. Queremos um Portugal livre de Santanas. E todos viveremos felizes.
Anónimo disse…
Se o mal fosse só dele?!
Este mal está demasiado enraizado e só uma solução radical poderá erradicá-lo.