IDENTIDADE NACIONAL PORTUGUESA

Manuel Villaverde Cabral

(...)

antes de tentar circunscrever a relevância do sentimento identitário, vale a pena fornecer um dado empírico atual e refletir por um momento acerca dele.

Com efeito, todos os inquéritos sociológicos recentes nos quais é feita uma pergunta – obviamente redutora e descontextualizada – a respeito do espaço social com o qual os portugueses mais se identificam têm revelado, estranhamente ou não, um grau limitado de identificação com o espaço nacional.

Embora estejam em maioria relativa, os inquiridos que se identificam prioritariamente com Portugal – sobretudo habitantes de Lisboa e populações do Sul – não chegam, em geral, a metade da população; os outros inquiridos se distribuem sobretudo pelas suas "terras" – aldeias, vilas ou pequenas cidades – ou pelas suas regiões, principalmente no Norte em volta do Porto; por fim, há um resíduo de excêntricos, no duplo sentido da palavra, que dizem identificar-se prioritariamente com o espaço europeu ou mesmo universal.

Em um dos mais recentes desses inquéritos, de uma amostra representativa da população jovem portuguesa (15-29 anos de idade), os resultados foram os seguintes (Fernandes, 1998:311, Tabela 1):

 

 

Por outras palavras, quando a identidade nacional não é ativada do exterior e o sentimento de pertença é referido à experiência quotidiana das pessoas, o que vem ao de cima é uma clivagem – pronunciadamente classista, aliás, sendo a distribuição aquela que os manuais de sociologia prevêem, segundo a qual a identidade nacional é um atributo das elites – entre múltiplos localismos e a identificação espontânea com a Nação.

Só marginalmente poderei entrar aqui na questão da cidadania, mas bastará dizer que é significativa, do ponto de vista estatístico, a correlação inversa entre a força dos sentimentos de pertença local e um déficit, por vezes acentuado, do exercício dos direitos da cidadania democrática.

Por outras palavras, quanto menor a identificação com o espaço nacional, menor também a propensão para o exercício da cidadania política (Cabral, 1997; 2000).

Em suma, por mais paradoxal que possa parecer em um país tão antigo como Portugal, com uma coincidência alegadamente perfeita entre Estado e Nação, a verdade é que o processo de nacionalização das populações – talvez devido aos profundos curtos-circuitos da cidadania, dependentes por seu turno dos atrasos da alfabetização de massas e do distanciamento entre estas e o poder político – encontra-se longe de estar completado em Portugal (Cabral, 2003).

Por motivos históricos mal conhecidos e que não é possível aprofundar agora, o velho Estado português tem ainda muito que fazer no plano da "nacionalização das massas", lembrando às vezes a situação da França antes da Guerra de 1914-18 identificada por Eugen Weber (1976).

(...)

Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Este estudo com mais de 10 anos justifica que se coloque a ênfase na regionalização autonómica como o único instrumento político capaz de fazer do "regresso às origens" a plataforma ideal e necessária de um futuro desenvolvimento global equlibrado e autosustentado.
Por outro lado, também contribuirá ainda melhor para aquilo que o mesmo estudo designa por "nacionalização das populações", a qual parece não estar ainda tão interiorizada como deveria se se atender à consagrada homogeneidade entre Estado e Nação, com integridade territorial secular, sem semelhante em toda a Europa a que pertencemos.
No mesmo estudo, a representatividade local e regional tem um peso relativo a rondar os 50% na identificação das populações com o espaço social, proporção muito aceitável e representativa dado que quem se identifica com o "Lugar" muito dificilmente não se identifica com a "Região" em que se insere. Seria óptimo que este estudo fosse actualizado, mas não haveria um engano de monta se se afirmasse que a preponderância local e regional se intensificaria consideravelmente, nos dias de hoje.
Daqui a necessidade de encarar a regionalização como a forma mais eficaz de incentivar o "regresso às origens" para se construir, no terreno, as condições efectivas de desenvolvimento equilibrado e autosustentado para cada uma e para todas as futuras Regiões Autónomas. Exceptuando os casos de desequilíbrios gritantes, isoladores, ancestrais e escandalosos, não se pense que serão as novas infraestruturas rodoviárias a permitir assegurar perenes condições de desenvolvimento das regiões mais isoladas e, complementarmente, das restantes. Teriam-no sido há dezenas de anos se tivesse havido o bom senso político de as construir em tempos idos e mais aconselháveis que os actuais. As condições de implantação do desenvolvimento nunca poderão ser identificadas com a dinamização de sectores de actividade económica assentes exclusivamente em critérios de crescimento económico, como se tais sectores fossem "a salvação da pátria" como os sectores da construção civil ou da actividade bancária (estes sectores são instrumentos e nunca objectivos económicos a atingir ou a proteger). O crescimento económico é um indicador enganador e insuficiente sobre o andamento qualitativo da economia porquanto, por outro lado, nunca será possível assegurar condições de crescimento permanente em nenhum daqueles sectores de actividade económica (nem em nenhum dos restantes), especialmente no sector financeiro de actividade onde a virtualidade dos produtos financeiros está mais afirmada que nunca. De qualquer modo, para ambos aqueles sectores, com subalternização de todos os restantes sectores de actividade (produção) económica, estão à vista de todos os resultados obtidos e que continuarão com os mesmos resultados negativos se não se aplicarem verdadeiras políticas económicas viradas para o desenvolvimento (até hoje sistemicamente inexistentes, para privilegiar o método de "apaga-fogos" em situações que deveriam ser os próprios interessados a intervir e a resolver e nunca o Estado).
Neste domínio, é triste verificar que o nosso País, nas condições estruturais e funcionais da sua economia, só garante convergência real em relação aos Países da União Europeia quando tem "CRESCIMENTO ECONÓMICO NEGATIVO" e, quando passa a positivo, logo começamos a divergir e com consistência. ESTA É A VERDADEIRA DEBILIDADE DA NOSSA ESTRUTURA ECONÓMICA, A TOTAL INCONSISTÊNCIA DAS NOSSAS CONDIÇÕES BASE DE DESENVOLVIMENTO E A TOTAL INÉPCIA DA NOSSA POLÍTICA.
Se isto não chega para JUSTIFICAR a introdução de alterações qualitativas e profundas nas condições de exercício da política, em geral, e da política económica, em particular, mais atentas ao desenvolvimento global que ao crescimento económico, então nunca se poderão encontrar saídas ou soluções para todos os nossos desequilíbrios de vária ordem. Se, por outro lado, tudo isto, que já não é pouco, chega perfeitamente para reconhecer a necessidade de implementar tais alterações qualitativas, então a regionalização política pode dar um contributo decisivo, permanente e histórico para o nosso desenvolvimento global equilibrado e autosustentado de cada Região Autónoma e de todas as Regiões Autónomas em geral, para além de contribuir SISTEMICAMENTE para a convergência real em relação aos países mais desenvolvidos da União Europeia.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)