Beira Litoral e Beira Interior: duas regiões muito diferentes

excertos do estudo "AS VANTAGENS COMPETITIVAS DAS CIDADES DO INTERIOR DE PORTUGAL: o caso da Beira Interior", por Pedro Guedes de Carvalho* e Tiago Neves Sequeira**
Na Região Centro, as cidades do interior são pequenas e médias cidades que não ultrapassam os 25.000 habitantes. Contudo nelas vivem cerca de 250.000 mil cidadãos em redor dos 6 centros mais importantes, o que representa 65% da população de toda a região.
Esta realidade sugere que as vantagens da escala só poderão ser alcançadas pela sua organização em rede aproveitando as sinergias da complementaridade. Entendemos que, à sua dimensão, cada uma tem potencialidades que podem ser aproveitadas e dinamizadas.

Sequeira (1999) conclui que embora a Beira litoral tenha vantagens absolutas em todos os factores de competitividade analisados, excepto nos ligados à urbanidade (e seus aspectos negativos) e segurança; encontraram-se vantagens comparativas das cidades da Beira Interior nos factores ligados ao sector terciário (incluindo turismo) e à qualificação dos recursos e dos serviços. O quadro 3 sistematiza as principais vantagens competitivas dos concelhos da Beira Litoral face à Beira Interior e vice-versa.
Um ambiente não poluído, que poderá decorrer da fraca densidade populacional, se aliado a um planeamento urbano cuidado e qualificado, que privilegie os espaços amplos dedicados às pessoas no centro da cidade podem ser um forte factor de atracção. Se adicionarmos uma prestação de serviços de saúde e de cultura de qualidade e um ambiente social qualificado, está criado o mote para a atracção de quadros qualificados desde que acompanhados por novos negócios criadores de novas oportunidades de emprego.
Estas vantagens poderão ser criadas pela dinâmica gerada pelos serviços e instituições de ensino superior que, tendo já capacidade instalada, podem, por difusão, fomentar a criação de empresas inovadoras e dinâmicas fortalecendo laços de parceria que permitam a exportação de investigação e de quadros qualificados, isto é, a utilização por agentes externos da formação superior e da investigação feita na região. Também aqui, a nosso ver, deveriam ser aproveitadas as vantagens competitivas de articulação entre as diversas instituições, fortalecidas por uma estratégia/campanha integrada de marketing das capacidades instaladas nas diversas instituições da região e nos diversos campos: engenharias e tecnologias aplicadas, ciências e tecnologias da saúde e ciências económicas e empresariais, dado o conhecimento específico da cultura empresarial de pequenas unidades.

Identificadas que estão as potencialidades existentes, é necessária uma maior
atenção às relações institucionais e pessoais no fomento da cooperação. Será esse o papel reservado aos activos intangíveis, ao conhecimento, que na sua tarefa de produzir e difundir informação economicamente relevante deve estimular os actores a agirem cada vez mais de acordo com uma racionalidade económica competitiva. As políticas deverão contribuir para a visibilidade dos territórios de acordo com as suas aptidões relativas, sejam elas em equipamentos, recursos humanos ou relações privilegiadas entre os agentes da cidade ou com agentes de outros territórios. Esta estratégia exige maior descentralização sobretudo nos critérios de distribuição de fundos estruturais, que, de outro modo continuarão a ser melhor utilizados pelas autarquias do litoral, conforme resultados obtidos por Ferreira (1999).


Em síntese, foram detectaram-se os seguintes factores fundamentais de competitividade para as cidades da Beira Interior (os quais podem ser eventualmente ser estendidos a outras cidades médias do interior de Portugal):
♦ Acesso à cultura e à saúde, ensino e investigação;
♦ Sector terciário especializado;
♦ Baixa densidade, ambiente e segurança.
A conjugação destes factores poderá atrair quadros qualificados e empresas utilizadoras de tecnologia e investigação e prestadoras de serviços com alto padrão de qualidade.

O esquema 1 identifica os principais clusters empresariais existentes e a desenvolver na Beira Interior, seleccionados por Reigado et al. (1998) com base na ideia de competitividade transmitida anteriormente.
Os clusters 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 são passíveis de ser maximizados, uma vez que existem e estão identificados.
Os clusters 5 e 7 são emergentes, no sentido que as instituições de ensino superior e centros de investigação e a construção civil, têm vindo a demonstrar uma dinâmica crescente. Continuam, no entanto a ser clusters a potenciar, uma vez que se o primeiro está longe de ser maximizado, nomeadamente no apoio às actividades económicas e na atracção de empresas inovadoras, o segundo deve ser reorientado para o desenvolvimento de especialidades com potencial mercado local e regional, como sejam a reconstrução de edifícios em meio rural, a requalificação urbana e novas técnicas de construção e adaptação ao clima (nomeadamente as ligadas à fase dos acabamentos).
O cluster em declínio, ligado à industria tradicional do têxtil lanifícios, terá de continuar a sua reestruturação, agora, sobretudo ao nível organizacional, da gestão e marketing internacional reforçando a capacidade de especialização em gamas elevadas da
fileira têxtil.
O cluster 8 não está identificado embora haja condições para que possa surgir, se se seguir a concepção estratégica apontada para a captação de empresas destes sectores aproveitando o potencial de Investigação e Desenvolvimento instalado.
No que se refere às relações entre clusters, apenas se identificam duas como emergentes: a relação que insere as actividades primárias num modelo de desenvolvimento eco-rural e turístico, exigindo diversificação funcional do espaço rural e a relação de aplicação que liga a ciência e tecnologia aos serviços especializados essencialmente na área da informática. Todas as outras relações estão longe de ser maximizadas e, constituindo lacunas evidentes, são novas oportunidades de crescimento de negócios e aumento das taxas de retorno dos investimentos.

Uma nova abordagem da dimensão das cidades e a lacuna na aplicação eficiente das NTI levaram a considerar novas oportunidades para as cidades do interior do país que, para além de terem as tradicionais vantagens das cidades intermédias, podem agora encontrar uma nova abertura com o tratamento qualificado da informação pertinente e apropriada para o desenvolvimento proporcionada pela globalização das novas tecnologias da informação. Algumas oportunidades oram já detectadas ao nível dopotencial instalado de serviços qualificados, nomeadamente ligados ao ensino superior público, e ao acesso a serviços sociais e pessoais (saúde, cultura, educação).

Na impossibilidade de avaliar, para já, os activos intangíveis que condicionam a competitividade das cidades do interior, procurou-se, na linha de outros estudos anteriormente desenvolvidos, identificar grupos de cidades com características semelhantes e avaliar os seus pontos fortes e fracos. Fez-se ainda uma síntese dos principais resultados de outros estudos sobre as vantagens comparativas das cidades para o caso da região Centro (Beira Interior/Beira Litoral), procurando reforçar a necessidade de uma visão estratégica da estrutura empresarial/institucional como resultado das vantagens detectadas.

Parece que a identificação dos líderes de rede (pessoas, empresas, instituições públicas e privadas) e a aplicação destas abordagens a factores organizacionais e informacionais em meio urbano poderão constituir o próximo passo na avaliação da competitividade dos territórios, de forma a conhecer, com alguma probabilidade, como é que cidades com características semelhantes e sem autonomia estrutural de rede podem adquirir visibilidade, valor de mercado e oferecer qualidades de vida substancialmente diferentes.

*Assistente no Departamento de Gestão e Economia da Universidade da Beira Interior (UBI). Visiting Scholar na Universidade de Illinois at Urbana – Champaign – E.U.A. Bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia.
** Licenciado em Economia pela Universidade da Beira Interior. Estudante de doutoramento da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (UNL). Bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia.


Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Tudo o que é referido neste importante estudo constituem os factores essenciais e justificativos de uma regionalização política para dirimir definitivamente as assimetrias regionais entre as 7 Regiões Autónomas e entre o litoral e o interior, especialmente a norte do Rio Tejo.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
"Esta estratégia exige maior descentralização sobretudo nos critérios de distribuição de fundos estruturais, que, de outro modo continuarão a ser melhor utilizados pelas autarquias do litoral, conforme resultados obtidos por Ferreira (1999)."

Esta frase é muitíssimo importante. É a principal conclusão deste estudo. Refere-se que todos os processos de desenvolvimento do Interior do País só serão bem sucedidos com a reforma fundamental para o nosso país: a Regionalização. E não pode ser uma Regionalização qualquer: tal como é referido, para que o Litoral não fique mais uma vez beneficiado pelas políticas das futuras Juntas Regionais (nomeadamente na distribuição dos fundos estruturais portugueses e europeus), é fundamental que seja implementada uma Regionalização com distinção entre as regiões do Litoral e do Interior, o que nos leva ao mapa das 7 regiões:
*Entre-Douro e Minho
(ou Minho e Douro Litoral, ou apenas Minho)
*Trás-os-Montes e Alto Douro
(ou apenas Trás-os-Montes)
*Beira Litoral
*Beira Interior
*Estremadura e Ribatejo
(ou Ribatejo e Oeste)
*Alentejo
*Algarve
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Tudo correcto, desde que não nos limitemos à simples e enganadora distribuição dos fundos estruturais da União Europeia, a não ser que nos continuemos a manter o último lugar, mesmo depois dos mais recentes entrantes, nos principais indicadores de desenvolvimento.
Por isso, teremos que orientar a regionalização autonómica, a única descentralização política com efeitos reais nas condições de desenvolvimento, para o incremento da produção em tudo o que corresponda ao maior aproveitamento possível dos recursos próprios de cada uma das 7 Regiões Autónomas, coordenada com o Governo Central para a eliminação definitiva das assimetrias de desenvolvimento, a consistente aproximação às melhores condições de convergência real para com os países mais desenvolvidos e, finalmente, a redução dos défices externos (atente-se na gravidade dos défices das balanças comerciais relacionadas com a energia e com os bens alimentares, entre outros) e do elevadíssimo nível de endividamento externo.
Internamente, a regionalização autonómica terá de implicar uma profunda reorganização do funcionamento de todos os Órgãos de Soberania e da Administração Pública, dois a quem doer, na linha do lema "grandes males exigem grandes remédios".
Em suma, as habituais decisões conjunturais terão de dar lugar a verdadeiras políticas sobre todos os sectores de actividade e de interesse para a sociedade portuguesa; em vez de decisões pontuais, deverá (terá) de se privilegiar decisões políticas sistémicas, tanto ao nível da sua natureza e transversalidade como ao nível do escalão de exercíco do poder político: central, regional e local.
Sem tudo isto, a regionalização autonómica será sempre um fracasso, continuando com o "turnismo político" (oportunista e dispensável) em vez da "política (de) estadista" (sistémica, exigente e necessária).

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)