Contas regionais: Uma análise das assimetrias regionais em Portugal (II)

As assimetrias regionais são mais perceptíveis a nível de NUTS III, conforme foi dito. Em Portugal contamos com 30 dessas unidades territoriais, que só servem para usos estatísticos. Dessas 30 unidades, três têm a sua correspondência com a região à qual fazem referência: É o caso da R.A. dos Açores, Madeira e Algarve. Cumpre salientar ainda que com a reforma de 2002, a NUTS II de Lisboa e Vale do Tejo desapareceu, pelo que a região de «Lisboa» abrange apenas as unidades territoriais da Grande Lisboa e Península de Setúbal, sendo que as restantes NUTS foram repartidas entre a região Centro e a região Alentejo. Vamos focalizar agora o estudo nas NUTS do Continente, isto é, as não regionalizadas.

O destaque dentre as regiões mais ricas vai, o qual não constitui nenhuma surpresa, para a Grande Lisboa, com um valor de 165,3. A segunda região mais rica é o Alentejo Litoral com um valor de 146,8. Neste caso, é de salientar a distorção que representa a presença de grandes instalações industriais na região como é a existência de uma refinaria, designadamente em Sines e Santiago de Cacém, para uma população para a região de pouco mais de 95.000 habitantes. A seguir fica o Algarve, com o valor já referido de 105,6, o Baixo Mondego (103,3) é o Grande Porto (101,0). Em 2007, ano para o qual temos um gráfico mas não os dados numéricos, teria havido uma mudança no sentido do Grande Porto descer para abaixo da média nacional e ter sido superada pelo Pinhal Litoral, que em 2006 apresentava um valor de 99,3. Isto não deve permitir deixar de ver os dados fundamentais: Das 28 NUTS do Continente, apenas cinco superam a média portuguesa! E Lisboa apresenta uns valores superiores em mais de 60% à média do país.

Com valores entre 90 e 100% da média portuguesa ficam NUTS tais como o já referido Pinhal Litoral (99,3), o Baixo Alentejo (92, 4) e o Baixo Vouga (91,6). A referência de 90% é tomada muitas vezes por economistas e geógrafos para equilibrar as possíveis assimetrias derivadas do facto de existirem regiões que centralizam muitas actividades económicas. Mesmo assim, apenas 8 das 28 NUTS do Continente superam esse nível do 90% ou 10 das 30 NUTS, se acrescentarmos as Regiões Autónomas. Note-se ainda que, a excepção do Baixo Alentejo, todas essas unidades territoriais pertencem ao litoral e que, no caso do Norte, a excepção do Grande Porto, nenhuma NUTS atinge o 90% da média portuguesa.

No conjunto de unidades territoriais com valores entre 80 e 90% ficam a Beira Interior Sul (88,0), a Lezíria do Tejo (86,8), o Alto Alentejo (85,6), o Médio Tejo (85,0), o Alentejo Central (84, 3), o Oeste (82,8) e o Entre-Douro-e-Vouga (80,2), única da região Norte. Isto perfazem sete unidades territoriais, pelo que existem ainda treze com valores inferiores.

No grupo das regiões mais pobres, o destaque vai para a região do Tâmega (55,5) e Pinhal Interior Norte (58,8) com valores abaixo do 60% da média portuguesa. Entre 60 e 70% ficam as regiões de Serra da Estrela (60,4), Minho-Lima (61,8), Cova da Beira (66,1), Alto Trás-os-Montes (67,3), Douro (68,1) e Dão-Lafões (69,8). Finalmente, apresentam entre 70 e 80% valores as regiões de Beira Interior Norte (70,2), Pinhal Interior Sul (72,7) Ave (73,0), Península de Setúbal (73,1) e Cávado (76,7). O caso da Península de Setúbal é significativo, mas isso tem uma explicação muito simples: os movimentos pendulares de milhares de pessoas que vão trabalhar na Grande Lisboa, aumentando mais ainda o PIB desta região, o que produz uma desvalorização económica da região de residência.

Em resumo: as regiões mais ricas são poucas e estão lideradas por Lisboa, ficando as restantes a grande distância. Os valores mais elevados dão-se no Litoral e não no interior, já que todo o litoral supera o 80% da média portuguesa a não ser as regiões de Minho-Lima e Cávado, significativamente na região Norte, e a Península de Setúbal que apresenta as especificidades que já comentamos. O Grande Porto não resiste numa comparativa com Lisboa, já que é superado por regiões como o Algarve, o Baixo Mondego (Coimbra) e o Pinhal Litoral (Leiria), para além do caso especial do Alentejo Litoral.

O centralismo político traduz-se também num centralismo económico com a hipertrofia de Lisboa. O PIB da Grande Lisboa é três vezes superior ao da região mais pobre, o Tâmega. A falta de instrumentos e de poder de decisão condena as regiões mais pobres a continuar afundando-se nessas fortes assimetrias regionais. Mais ainda: uma regionalização com as cinco regiões-plano não seria uma solução porque temos de acrescentar a isso as disparidades intra regionais, que são mais fortes no caso da região Norte (Grande Porto-101,0 contra Tâmega-55,5) e Centro (Baixo Mondego-103,3 contra Pinhal Interior Norte-58,8).

Convenhamos em que é impossível implementar regiões absolutamente homogéneas, mas as assimetrias regionais deveriam ser, no mínimo, bastante reduzidas, de modo a não gerar tensões desnecessárias. As diferenças entre o litoral e o interior Norte e Centro justificam mais que sobradamente a existência de quatro regiões neste território, duas litorais e duas do Interior. E é claro, todas as regiões deveriam contar com poder de decisão para decidir os seus investimentos e as suas prioridades e para definir as suas estratégias económicas, sem que isso signifique uma renúncia a uma visão global portuguesa, nacional, nem europeia.

Comentários

Excelente. Os meus parabéns, Gaiato Alentejano, pela análise a estes dados, que já há muito era precisa. Tudo isto vem consolidar ainda mais a premência e a necessidade de uma Regionalização em 7 Regiões.

Apenas uma nota: Se a Península de Setúbal tem como justificação para os baixos níveis de PIB per-capita os movimentos pendulares, também para a região do Tâmega há justificações. Por um lado, a mesma justificação dos movimentos pendulares se aplica (em concelhos como Paços de Ferreira, Paredes, Penafiel, Lousada, e até Amarante e Marco de Canaveses, uma boa parte da população trabalha na Área Metropolitana do Porto). Por outro lado, a referida zona é das mais jovens do país, sendo que uma grande parte da população não trabalha ainda, pelo que os valores de PIB per capita descem automaticamente. Por último, há ainda o facto de a economia paralela ter um papel muitíssimo importante no Tâmega e Sousa.
Fronteiras disse…
Exactamente. Mas isso requer uma análise mais pormenorizada que envolve estudar a estrutura da população e outros factores. A população tem grande peso na estrutura do PIB, mas apesar dos movimentos pendulares e do facto de ser uma população muito jovem, isso não tira o facto da gravidade da situação. E o facto é que apenas cinco NUTS superam a média do país. Mesmo assim, tenho intenções de analisar aos poucos a estrutura económica das regiões a partir dos dados estatísticos. Brevemente haverá mais artigos que espero sejam esclarecedores de uma situação que deve mudar já!