Regionalização: aparência e realidade (parte III- Passado recente e perspectivas de futuro)

(continuação)


Em 1998, porém, aquando do referendo acerca da instituição em concreto das regiões administrativas, e após um longo período de discussão sobre o mapa, da convergência entre os partidos de esquerda (os partidos da direita opuseram-se desde logo ao processo de regionalização) resultou um mapa que identificava claramente onde intervir, e que distinguia claramente as diferentes regiões, cada uma com as suas realidades e necessidades diferentes. O mapa assentava em oito regiões: Entre-Douro e Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro, Beira Litoral, Beira Interior, Estremadura e Ribatejo, Lisboa e Setúbal, Alentejo e Algarve. Apesar de o mapa estar relativamente bem formulado quanto ao número de regiões, desde logo se levantaram as tais vozes a norte do Tejo, reclamando que o mapa deveria ter apenas 5 regiões, e prevendo (com argumentos, na sua maioria, falaciosos e a roçar a indecência) um futuro negro para Trás-os-Montes e para a Beira Interior.


Conseguiram o que queriam: numa campanha marcada pela confusão, os transmontanos e os beirões-arraianos ficaram de pé atrás em relação à regionalização. A estas vozes juntaram-se os tradicionais defensores do centralismo instalado, que conseguiram também eles, no meio da confusão em que se tornou a campanha, assustar os portugueses, mentindo ao dizer que a regionalização põe em causa a unidade nacional (em nenhum país da Europa com regionalização administrativa aconteceu tal coisa…). Mas o maior erro, que confundiu até os regionalistas, foi, não o número de regiões, mas os seus limites: o problema foi que, em vez das províncias, foram usados como base os distritos. Distritos esses que desde que foram criados no século XIX, são criticados pela sua artificialidade. Isto conduziu a erros crassos, como a inclusão de concelhos como Leiria, que sempre foi Beira Litoral, na Estremadura e Ribatejo.


Esta foi a face mais visível de um problema que afectou dezenas de concelhos localizados nas fronteiras entre regiões. Foi esta problemática que fez com que, inclusive, o mapa apresentado ficasse conhecido como o “mapa TSF”, já que era nos programas de debate realizados por esta estação radiofónica que as pessoas dos diversos concelhos alertavam para a artificialidade dos limites. Foram estes três factores que, conjugados, reverteram o resultado do referendo: de um “sim” categórico previsto nas primeiras sondagens, acabou por se registar uma vitória do “não”, num referendo em que, cansados do triste espectáculo político que tinham visto nas últimas semanas, os portugueses expressaram o seu desagrado face à classe política com uma elevadíssima taxa de abstenção.


Mais do que a vitória do “não”, na noite de 8 de Novembro de 1998, foi festejada a derrota do “sim”. As vozes que se haviam levantado durante toda a campanha contra o mapa, apressaram-se a atribuir-lhe todas as culpas, fazendo dele bode expiatório. Hoje, pouco mais de 10 anos depois, vemos essas pessoas denominar-se “regionalistas convictos”, mas apenas se o mapa preconizar a divisão regional que mais lhe convém. Já houve quem lhes chamasse “cristãos-novos” do regionalismo. Infelizmente, todos estes interesses estão, desta vez, a determinar a evolução da questão da regionalização. Assim surgem as afirmações dentro do governo e do parlamento, a dar como “consensual” o mapa das regiões-plano. Nada mais falso. Se o mapa anterior foi rejeitado por causa dos limites, que estavam distantes dos das províncias, que dizer deste, que extingue províncias com mais de sete séculos, e tem limites regionais ainda menos claros que o anterior?


Mais do que aquilo que a classe política acha ser consensual, é fundamental saber a opinião dos cidadãos sobre esta questão, e ela foi deixada clara no referendo de 1998: Portugal é um país regional, as pessoas estão receptivas à Regionalização, mas o mapa, para ser aceite, tem que ter como base as províncias tradicionais, sendo para isso feito a partir da junção de províncias homogéneas.


Afonso Miguel

Comentários

Anónimo disse…
Num mapa desses eu sou contra a regionalização. O Minho vai continuar a ser roubado.
Paulo Rocha disse…
"O Minho vai continuar a ser roubado"

Esta opinião do anónimo acima referenciado é bem demonstrativa de uma certa visão paroquial e enviesada sobre o real objectivo e sobre as atribuições e competências das futuras regiões administrativas.
zangado disse…
O que é que o primeiro senhor quer? Uma região do Alto Minho com sede em Braga, pois o Baixo Minho é actualmente designado por Douro Litoral? Então continue a deixar-se "roubar" pelo centralismo lisboeta e ter de depender, em tudo ou quase, de Lisboa. Se eu fosse de apostas, acharia que era um minhoto colonizado e benfiquista, que ainda não percebeu que todos os habitantes do resto do país estão a ser, sistematicamente roubados.
Porque não pede ao vosso deputado João de Deus Pinheiro que defenda essa posição? Pois é, só foi deputado meio dia e desistiu logo,enganou-vos e ficou lá um jota que não foi eleito. Ou ao Manuel Monteiro que teve, parece, 3.500 votos no seu distrito.
Deixem-se de brincadeiras que o caso é sério. A ditadura lisboeta é que é boa!
Anónimo disse…
O TODO o Minho é Minho.
E a minha cidade tem muitos mais Braguistas do qualquer um dos outros.
O Manuel Monteiro é um oportunista de extrema direira que não merece representar o meu distrito.

"Esta opinião do anónimo acima referenciado é bem demonstrativa de uma certa visão paroquial e enviesada sobre o real objectivo e sobre as atribuições e competências das futuras regiões administrativas."

Temos a terceira maior Paroquia do País porque o minho ia ter mais população que qualquer uma das outras regiões a exepção de Lisboa e Porto.
Anónimo disse…
A divisão proposta a referendo no mapa não era mais do que deixar tudo na mesma. É uma amálgama de distritos. José Socrates já reconheceu esse erro, justiça seja feita.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

É confrangedor assistir ao alinhamento dos argumentos antes citados, especialmente pelo primeiro anónimo, cujas posições são o contrário das adoptadas por verdadeiros regionalistas.
Seria muito mais correcto da sua parte afirmar-se contrário à regionalização como o faz corajosa e assumidamente o Templário.
Haverá sempre quem goste muito de levar pancada, continue a achar piada e até reclame por mais. Só desejo que lhe assente como deve ser e bem, lamentando apenas as que caem nos paralelipípedos das calçadas minhotas.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Pedro disse…
Tal como em 98, serei obrigado a votar contra NÃO. Sou a favor da regionalização, mas contra este mapa.

Conheço as necessidades da minha região (Minho), que são bem diferentes das do Douro Litoral. Não faz sentido integrarmos a mesma região. É um absurdo. Ainda por cima, tal como hoje fazemos parte do quintal de Lisboa, passaremos a fazer parte do quintal do Porto. Nada mudará.

E podem ter a certeza que, com este mapa, a regionalização não passará de novo. Relembro que, em população, o Minho é a terceira região do país. Muita gente a votar contra.