ALGARVE: DEMOCRACIA DE SOFÁ OU INTERVENÇÃO PARTIDÁRIA?

José Borba Martins, Lagos-Algarve
Em Outubro de 2009 o presidente do PSD/Algarve produziu uma denúncia desassombrada de uma clara entorse da democracia. Segundo José Mendes Bota ela consiste na «ocupação por Lisboa de um número significativo de lugares de representatividade parlamentar de todo o resto do país. No caso do Algarve e nas eleições legislativas de 2009 o facto  indesmentível é que do oito deputados eleitos pelos algarvios, três nada têm a ver com a região em termos substantivos, ou seja, 37,5% é o peso desta “legião estrangeira” de políticos pára-quedistas que aterram na nossa região, de onde têm partido  para os seus vínculos centralistas sem deixar saudades há 34 anos consecutivos. O resto é paleio de feira…» (texto adaptado de artigo de JMB em MENDES BOTA.COM)
Por outro lado, tal como o Movimento “Regiões Sim” vem denunciando, «o instituto do Referendo está desvirtuado, pois estando o carácter vinculativo desta consulta obrigatória dependente de uma número de votos favoráveis superior à maioria dos eleitores constantes nos cadernos eleitorais, isso significa que, à partida, há logo um milhão de votos contra, qualquer que seja a pergunta em questão. Ou seja, em Portugal os abstencionistas também votam, mesmo sem votar.»
Independentemente dos elevadíssimos níveis de Demagogia, de Oportunismoe de Impunidade que, desgraçadamente para todos os Portugueses, vem caracterizando a acção política do PS  nacional e do PS regional algarvio, a actual situação da liderança do PSD nacional foi, também ela, não menos indutora de uma acrescida inércia que em nada contribui para  a superação da insuportável e gravíssima situação que  está a devastar tão rapidamente Portugal.
As causas e as consequências de cada realidade concreta continuam a ser baralhadas e dadas de novo nos agendamentos calmos e nos alinhamentos e escolhas informativas manipuladas e manipuladoras com que os Portugueses são brindados diariamente pela comunicação social da opinião publicada. Porque há outra, claro, a do outro TGV (Toda a Gente Vê…)!
Estamos hoje confrontados com mais uma tentativa desesperada de fazer sobreviver um centralismo falido, corrupto e recorrentemente assumido num bloco central de interesses ocultos que foi a causa essencial que nos conduziu à realidade actual, a par da gritante carência cultural democrática. Esta é a maior prova de um infantilismo político consubstanciado na falta de estatura intelectual e moral dos principais actores públicos em diversas áreas da vida portuguesa. E é a prova provada de que nada está garantido nesta espécie de “vale-tudo” em que a apenas formal democracia portuguesa se tornou ! Nenhum discurso consegue iludir a realidade que todos sentem no bolso e na CONSCIÊNCIA
É à luz desta realidade nacional e das irrefutavelmente trágicas situações do Desemprego e do Turismo no Algarve, que é imperativo que os Algarvios entendam e assumam que uma grande quota de responsabilidade por esta realidade está em si próprios e na falta de participação na vida política em geral e partidária em particular. Tanto ou mais que no restante Portugal…
Que dizer de alguns de entre os mais jovens que, até com uma sólida formação académica, preferiram já enveredar pelos caminhos fáceis do chamado “sistema”, alienando-se à utilização do mesmo tipo de métodos, mesmo quando têm valores contrários aos dos totalmente subvertidos na realidade ainda vigente? Porque sempre foi assim – dizem – e não há nada a fazer… Mais valia que percebessem o logro em que voluntariamente já caíram e abrissem caminho a todos quantos querem, sabem e podem fazer a diferença, despertando consciências e disponibilizando espaço a todos quantos têm contributos a dar em nome do nosso futuro colectivo.
Pelo contrário, há muito por fazer. Por nós próprios, por quem fomos e somos, mas também pelo respeito à memória viva e ao trabalho dos que por cá andaram antes de nós para que o Algarve e Portugal não fossem a tristíssima, dramática e potencialmente explosiva realidade que hoje indiscutivelmente são.
A Democracia não existe quando os poderes legislativo, executivo e judicial estão reféns de dois ou três pares de mãos-cheias de “activistas” com a restante população passivamente vivendo politicamente inerte a ver TV no sofá, sejam os programas alinhamentos programados em telejornais ou ídolos cantantes telefonicamente “eleitos” (aproveito para dar os parabéns à lacobrigense Diana que tem feito umas performances notáveis de pujança e genuinidade no programa da SIC, tem o meu “voto”).
É natural que se pense que implementar a Regionalização seja um luxo a que o país não se pode dar neste momento. É discutível, mas é natural que se diga isso. Mas existindo, como existe, um consenso quanto à configuração geográfica, a questão HOJE é a de saber quais serão as configurações operacionais concretas, a 3 níveis: a interna a cada região, a inter-regional e a dos interfaces vs. administração central em Lisboa.
Estranhamente, quase todos os que se opõem à Regionalização, argumentam a seu desfavor com a questão do acréscimo de custos para o Estado, o que não é evidente. O que é evidente é que só o será se se pretender manter o Centralismo sob a capa de uma Regionalização Administrativa em que o polvaço reinvente os seus tentáculos a partir, por exemplo, das CCDR’s. Mas não exclusivamente…


Afinal, argumentar com a questão do acréscimo de custos para o Estado é, quanto ao tema da Regionalização, a maior prova de má-fé política por parte de quem, de facto, não quer expôr a sua própria evidência: a de querer continuar a viver impossivelmente à sombra de uma organização complexadamente centralista do Estado, diletantemente ineficiente, financeiramente falida e politicamente manietada, já não pelo mesmo tipo de interesses ocultos de que Carmona avisou Salazar para não melindrar…, mas por uma ideia de fatalismo internacionalista que se argumenta nos corredores não nos deixar alternativa.


Um modelo de gestão política claramente importado em toda a sua gravidade financeira (desculpabilizante, aproveita-se…) que muito provavelmente conduzirá – se é que já não está a conduzir e se nada de decisivo fôr ainda feito em contrário – ao desaparecimento de Portugal (e do Algarve) tal como o conhecemos e ainda queremos sonhar, por via do estabelecimento de uma espécie de  ESTADO-FILIAL, securitário a cobrar direitos aos Cidadãos e desviar liquidez à Economia, mas persistindo em ocultar factos à maioria, com fortíssima manipulação dos media e do aparelho judicial (pela via legislativa…),  assim como a perdoar e limpar toda a espécie de impunidades igualmente decisivas praticadas ao longo de anos. Lindo serviço (público)…
O que é pertinente neste momento estranhíssimo da vida portuguesa e algarvia é exigir aos Partidos que  tenham a coragem de alterar os seus procedimentos operacionais ultrapassados e restritivos de uma participação permanente e livremente assumida pelos Cidadãos desalinhados  e, a estes e aos “adormecidos”, que despertem e intervenham activamente, seja em que partido fôr, mas que intervenham e lutem pelos seus valores e pelo que acreditam que deve ser a realidade. Excepto se gostam da realidade que muitos mais do que se pensa já conhecem de cor e salteado. Acordarão ainda a tempo? Esperemos que não seja como a história da rã com a água quente…
É que agora já não é de futebol que se trata. Não se pode continuar a assumir o clubismo na Política! Por todas as razões e mais uma: a de que quem “ganha” repetidamente eleições é a Abstenção. Do que se trata HOJE de um modo lancinante é da Vida das Pessoas. Dos Valores Básicos.Por muito que isso ainda não passe em muita da comunicação social ainda dormente. Grandes números de circo temos visto…
Como alguém dizia um dia destes, «então se me levarem a carteira numa mesa qualquer, eu vou atrás do ladrão para a recuperar o que é meu ou vou pondo carteiras em cima da mesa? Quantas vezes mais? Qual é o limite?»
É por tudo isto que os Algarvios e o Algarve no seu todo podem e devem exigir/fazer um debate sério sobre as alternativas de Regionalização – a meramente administrativa vs. autónoma que na minha opinião é a que interessa ao Algarve – qualquer que seja a filiação partidária de cada um. Ainda por cima, e ao contrário do que é comum dizer-se a este respeito, é Portugal que tem a ganhar. E é uma oportunidade de acelerar uma recuperação económica – a nossa – que, doutro modo, será lenta, duríssima e de consequências totalmente imprevisíveis. Demasiado lenta, estupidamente  lenta para os potenciais específicos do Algarve.
A Regionalização não se destina a “agilizar processos” como é comum ouvir aos seus defensores encartados. É para colocar o poder de decisão mais perto das populações que são a essência de qualquer Estado. A diferença entre uma e outra é o complexo de superioridade centralista – comungado pelos seus servidores regionais e locais – que está contido na formulação administrativa da Regionalização. Na formulação autónoma, é uma parte significativa do poder político – o legislativo e o executivo, com nuances várias e sempre com o devido respeito pelos limites constitucionais em vigor – que passa para a tutela regional.
Ou seja, este é o tempo de saber se o Algarve e os Algarvios são entidades menores -  a tal espécie de “pobrezinhos ignorantes” que têm que ser comandados politicamente pelo centralismo interesseiro – ou se, pelo contrário, seremos capazes de defender e gerir nós próprios os interesses da nossa querida terra algarvia para que,  entre outras coisas e de uma vez por todas, deixemos de estar limitados a poder trabalhar a sério 12 semanas para termos que sobreviver os 12 meses do ano. Ou para que deixemos de ter no Estado-Paizinho o maior empregador regional. Ou ainda para que  possamos captar investimento directo estrangeiro sem ter que passar pelas “agências” nacionais-centralistas. Estas são apenas três das necessidades concretas que toda a comunidade algarvia sente. Ninguém tenha ilusões: não teremos desenvolvimento sustentado e sustentável sem resolver estas partes de um extenso rol de problemas concretos.
Devagar, devagarinho e conforme Lisboa quiser ou através de um processo de Regionalização Autónoma: é esta a escolha a fazer.Para fazer a Regionalização pela via administrativa, replicando o centralismo de Lisboa para o centralismo de Faro, é melhor não fazer nada e, desde já, reforçar a transferência de competências e de meios para as Autarquias, descentralizando e dotando de legitimidade democrática directa o poder de decisão político das CCDR’s…
Que ninguém tenha ilusões sobre tudo o que implique perda de poder político ou financeiro para Lisboa: nada nos será oferecido pela via do beija-mão provinciano, ditador para dentro mas, ao mesmo tempo e para fora, submisso, servidor reverente e politicamente irresponsável, que insiste em negar há largas décadas o desenvolvimento próprio da Vida Algarvia no seu todo, sempre ao serviço de um centralismo dos interesses alheios à nossa realidade económica e cultural de que até se chega ao cúmulo de ridicularizar. O que é ridículo é o insuportável estado a que chegámos!
Há, pois, 3 lutas a travar na Democracia Algarvia: 1) a luta pela Regionalização Autónoma; 2) a luta contra a Abstenção e  3) a luta pela abertura dos Partidos à realidade não apenas nos tempos eleitorais mas permanentemente. Sob pena de os próprios Partidos deixarem de ter razão de ser, com todas as consequências e os graves riscos correspondentes que todos parecem ter esquecido.
Chegará o dia em que no Algarve se dirá “Para cá do Caldeirão e do Espinhaço de Cão mandam os que cá estão” ? Sobre o Algarve, a palavra aos Algarvios do Algarve. Sem pleonasmos nem tibiezas. Com Frontalidade e sem Medo. Porque aqui não há vínculos centralistas ! O vínculo é com o Algarve e os Algarvios, os que aqui têm os pés independentemente de terem ou não aqui nascido.
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Comentários

Fronteiras disse…
Spain above the ALLgarve? The ALLgarve region the last redoubt of the lusophony? Oh my God!

Estes bifes...
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Sem mais nem menos.

(Gostaria que alguém me explicasse a razão pela qual o artigo semanal do jornalista Mário Crespo, publicado habitualmente no "JN", não viu a luz do dia da edição de ontem, segunda feira, 1 de Fevereiro?! Será que dizia mal do Governo?

Sem mais nem menos).

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Paulo Rocha disse…
Não é habitual mas, desta vez, o 'Anónimo pró-7RA' desiludiu-nos com um comentário completamente despropositado e, completamente, ao lado da importante reflexão que nos trouxe o José Borba
Anónimo disse…
Caro Paulo Rocha,

Concordo inteiramente com o texto de José Borba, razão pela qual o meu comentário só poderia ser "sem mais nem menos".
Mas não pense que tudo isto está separado; infelizmente não está e tão cedo não estará, por se tratar de comportamento político e quando são alegadamente censuráveis, tudo o resto fica posto em causa da pior maneira. Com efeito,será impossível implementar a regionalização autonómica num quadro de identidade total de opiniões ou, se quiser, num quadro em que não se pode criticar as acções do Governo ou de qualquer um dos seus membros. E não pense que este problema é algo menor ou desfocado do essencial para quem escreve neste blogue sobre a regionalização. Como deve saber, creio eu, "o gesto é tudo", ou seja, o comportamento pessoal é muito importante, sobretudo quando envolve políticos com as máximas responsabilidades e provoca (más) consequências políticas (naturalmente, não está esquecido da infeliz questão das escutas em Belém alegadamente originadas por S. Bento e cujas consequências acabaram por fazer "virar a caça contra o caçador" e por condicionar os resultados eleitorais das últimas legislativas).
Entretanto, já fui esclarecido sobre o "modus faciendi" do problema de direito de expressão agora levantado, subsistindo entretanto o receio de estarmos a ser permanentemente vigiados, seja em que local for e com os meios que nunca suspeitaremos.
Daqui a algum tempo, provavelmente quando resolver sair de casa terei à porta, nas condições mais acacoradas possível, alguém a ajudar-me a encontrar o caminho para destinos sobejamente por mim conhecidos.
Espero com isto, não o ter desiludido mais uma vez mas, se tal aconteceu novamente, lamento-o profundamente. O que não se pode é desligar do essencial mesmo que à partida se considere o tema desviante ou despropositado, mesmo que a visão permanente da realidade nos apresente apenas políticos de turno e não políticos estadistas, apostando em dar publicidade grátis a quem não merece e a lançar suspeitas desnecessárias.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Paulo Rocha disse…
Caro Anónimo pró-7RA.

Já que dá tanta importância ao epifenómeno Mário Crespo dou-lhe a minha opinião sobre os acontecimentos.

1 - Não concordo com a posição do director do JN ao invocar questões deontológicas para não publicar uma mero artigo de opinião de um colaborador do Jornal.

2 - Acho lamentável andar-se a escutar (na mesa ao lado) as conversas privadas do José Sócrates para depois vir cá para fora retransmiti-las, eventualmente, descontextualizadas.

3 - Repudio o oportunismo comercial do Mário Crespo ao ir editar um chamado 'livro rápido' - ainda esta semana com o apoio da editora da Zita Seabra - sobre este assunto.

Cps.
templario disse…
O post é muito longo e comporta muitas questões. Peço desculpa de o meu comentário não se referir a ele. Vou tentar.
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Caro pró-7RA.,

Estou de acordo com os princípios de livre expressão que defende. São um bem tão precioso que deviam ser os próprios jornalistas a estar na primeira linha a defendê-los e praticá-los. Com verticalidade. Para servir a opinião pública. Para fortalecer a Democracia e o país.

Sabe bem, Caro pró-7RA., sabe muito bem que, infelizmente, são aves raras nos últimos anos nos nossos mídia. Também sabemos porquê... Ou servem o(s) dono(s) ou estão lixados. Mas também é verdade que quem escolhe essa profissão e a exerce, sabe as consequências, tem de estar preparado para elas.

Não me pronuncio sobre o facto em si - caso M.Crespo -, tanto mais que sou um votante e apoiante do actual Primeiro Ministro, que pouco tem a ver com o seu partido.

Uma coisa é certa: o jornalista em questão nunca me mereceu apreço, especialmente nos últimos anos, naqueles debates na SIC Notícias, onde o moderador (ele), exorbita, nessa qualidade, do seu ódio de estimação ao PM, chega mesmo a ultrapassar todos os limites do razoável. Tenta arrancar a saca-rolhas respostas desfavavoráveis ao homem e não se coíbe de usar técnicas de expressão facial, inflexão de voz, enfim, técnicas de representação teatral para manipular emoções. O tipo de conversa mole e despropositada simpatia e cordialidade com os convidados, os encómios e especiais atributos que lhes dirige, provocam compaixão. O MC revela ser um jornalista ressabiado e não de corpo inteiro.

De facto, de tipo diferente, é assim uma MMGuedes.

Se eu fosse diretor do JN, agradecia-lhe a informação e publicava-a como notícia, depois de reunir alguns dados que lhe dessem um mínimo de credibilidade.

Nunca como história verosímel, mais própria para a Página de ficção artística.

Mesmo um PM em que não votasse -era sempre o PM do meu país -, não apoiava este tipo de ataque, baseado em escutas na mesa ao lado, ou lá como foi, de colegas que, na "classe" dos jornalistas, se odeiam até mais não. Tenho para mim que aquele recado estava cheio de veneno. Esperemos para ver.
Anónimo disse…
Caro Paulo Rocha,
Claro Templário,

Mas acima de tudo repare que termino o meu segundo comentário com a expressão: "... apostando em dar publicidade grátis a quem não merece ...".
A importância que, COMO DIZ E NÃO É PESSOALMENTE QUE O SINTA (até o referi sucintamente e entre parêntesis), dei a este assunto, politica e infelizmente mais que recorrente, reside no facto de o "chico-espertino" político aproveitar-se de tudo para criar obstáculos ao genuíno funcionamento democrático, mas democrático mesmo, não é a fazer de conta que o é, sabendo ainda que nestes meios há sempre gente a querer aproveitar-se das ocasiões. E esta também é uma delas, em que o RECATO, um bom sinal até de educação, nas conversas privadas em público TAMBÉM não foi acatado pelos conversadores e tinham a obrigação de o fazer, quanto mais não seja pelas funções que exercem.
O deslumbramento do ou pelo exercício do poder, sem excepções para ninguém, arma-nos muitas vezes aramadilhas bem perigosas e muito difíceis de digerir.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)