A Regionalização será apenas mais um problema?

DANIEL PALHARES  |Grande Porto|

No meio de todos os problemas que cercam e vão continuar a cercar os portugueses (problemas políticos, financeiros, económicos e outros) dou comigo a perguntar-me se terá cabimento e se será oportuno arranjar-lhes agora mais um – este da regionalização.

O meu primeiro impulso foi responder que não. Já nos sobram a confusão política e o buraco financeiro em que nos meteram – e o difícil que é sair de ambos.

Mas depois de pensar um pouco não me foi difícil acabar por responder que sim, que até é muito oportuna!

E porquê ? Porque bastantes coisas essenciais vão ter de mudar, se quisermos realmente sair da confusão e do buraco. Desde logo, as mentalidades. Com as mentalidades, as pessoas. E com as pessoas, as equipas. E com as equipas, os partidos políticos. E, com tudo isto, também a própria Constituição da República Portuguesa.

Sem estas – e outras – mudanças essenciais, vamos, de uma forma ou de outra, continuar a ter mais do mesmo, durante mais algum tempo - pouco tempo, antes de piores males!

Ora bem, algumas dessas mudanças essenciais podem justamente derivar da regionalização - desde que ela seja bem feita.

Como eu a vejo, a regionalização é um processo de longo prazo, contínuo e dinâmico.

Começará com um determinado perfil mas, passadas poucas dezenas de anos, terá certamente um outro, bem diferente do inicial.

Quando começar a estabilizar, quem viver nessa altura olhará para o passado e poderá distinguir várias fases nesse processo. Fases em que, ou uma foi o desenvolvimento consequente da anterior ou, então, teve de ser a correcção dela.

Ora, como estamos, agora, no princípio do processo, importa muito evitar, desde já, correcções e fomentar desenvolvimentos. Com isso, ganha-se tempo e poupa-se dinheiro.

É certo que, nesta sua primeira fase, a regionalização de Portugal vai ser eminentemente administrativa e pouco ou nada política. E nascerá de uma decisão do poder central, ou seja, virá do centro para a periferia. Não poderia ser de outro modo. Mas nas fases posteriores o equilíbrio de forças será já outro e outro será também o conteúdo da regionalização. Se não vier a ser assim, aliás, o objectivo essencial não terá sido atingido.

Para se poder vir a desenvolver com algum equilíbrio, o país necessita de um único Sul, que pense e queira por si próprio. Que identifique e possa defender os seus interesses regionais. Que deixe de ser o campo e a praia de Lisboa e do estrangeiro.

Ora o país nunca terá este Sul se vier a ter a actual região chamada Alentejo, com sede em Évora e a actual região chamada Algarve, com sede em Faro. Porque Évora não é mais do que a própria Lisboa no Alto Alentejo e Faro (ou o Algarve litoral) é apenas Lisboa a banhos, no verão e nos fins-de-semana, com o estrangeiro, como pano de fundo, durante todo o ano. Assim, não haverá uma mentalidade nova a pensar o Sul de que o país precisa.

Também necessita de um único Norte, mas com mais equilíbrio entre litoral e interior. Um Norte que volte a ser um pólo de desenvolvimento industrial, de serviços e de exportação. Um Norte que deixe de ser um manancial de gente, muita com habilitações superiores, que tem de migrar, a enriquecer Lisboa, por falta ou insuficiência de possibilidades locais de realização pessoal. Ora, o país nunca terá este Norte se vier a ter a actual região chamada Norte, acantonada acima do rio Douro, exígua em território, e que é encarada, de fora, um pouco como marginal e “galega”,tendo como sede um Porto que hoje está decadente e descrente de si mesmo..

E também se continuar a ter, separada do Norte, a actual região chamada Centro (que, em grande parte, é apenas o sul da verdadeira região Norte) cujo território é grande demais para o fraco dinamismo económico de Coimbra, sua actual capital.

É disto, de três e não de cinco novas regiões, que Portugal necessita para ganhar equilíbrio interno.

Quem necessita, para não perder muito poder, que as novas regiões não sejam menos que cinco é a capital. O país, esse, precisa de uma região, grande e forte, a norte da capital e outra região, grande e forte, a sul da mesma. Nunca terá esse equilíbrio se o poder político central, aliado aos grandes interesses que residem em Lisboa, puder avançar, logo no início do processo regionalizador, para a solução que mais lhes convém. E é justamente isso que hoje se está a desenhar!

Daí decorre a importância fundamental, a meu ver, de não se deixar a regionalização do país apenas nas mãos e na iniciativa dos políticos do nível central.

Daí, também, a necessidade, que já referi num artigo anterior, de uma Associação Cívica para a Regionalização de Portugal. O adjectivo cívica (de sociedade civil) seria para clarificar a sua origem e natureza, separando-as da esfera política. Mas este desenvolvimento já não cabe no presente artigo. Poderá, talvez, caber num próximo.

Comentários

Rui Silva disse…
Não concordo nada com esta ideia das 3 regiões.
Paulo Rocha disse…
Já li por aqui, algures, outros artigos do Sr. Daniel Palhares e a sensação com que fico é que este senhor tem uma visão muito particular do processo da regionalização. A sua ideia de Regionalização é, excessivamente, administrativista e por isso, algo redutora.
Quanto mais artigos leio de Daniel Palhares mais estupefacto fico com as ideias que aqui são defendidas. E assusta-me um bocado que este tipo de textos apareça com tanto destaque na imprensa. Quem os lê fica com uma ideia desviante da regionalização, como se o país passasse a ser um saco de gatos onde só que mais berrasse sobreviveria, como frases do tipo "a actual região chamada Centro (que, em grande parte, é apenas o sul da verdadeira região Norte) cujo território é grande demais para o fraco dinamismo económico de Coimbra, sua actual capital" sugerem. Basta olhar para os outros países para perceber que essa visão é obtusa. Gostava de saber como explica este senhor a existência de regiões com menos de 300 mil habitantes por essa Europa fora, mesmo em países regionalizados administrativamente e mais pequenos que Portugal.

E depois considero que frases como "Porque Évora não é mais do que a própria Lisboa no Alto Alentejo e Faro (ou o Algarve litoral) é apenas Lisboa a banhos" uma grande desconsideração perante, neste caso, os Alentejanos e os Algarvios. Quando, por vontade, pelo menos dos primeiros, a regionalização já estava implementada há muito.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

A consequência mais nefasta para a regionalização é que textosdeste tipo contribuem para abrir novas bolsas de discordância desnecessárias, as únicas capazes de retirar credibilidade ao projecto político da regionalização, desacreditando-a de forma estúpida.
Na verdade, não há necessidade.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
templario disse…
É interessante este artigo. Como já aqui escrevi, caso fosse defensor da regionalização, seriam exatamente três regiões. As considerações que faz são pertinentes, sim senhor. Gostei da visão integradora de "SUL" e de redimensionar o chamado "Norte".

Sim senhor! Obviamente que o Sr. Daniel Palhares tem no seu subjetivo um medo terrível da regionalização, tal como a estão a tratar, com juntas regionais eleitas pelas populações, cujo peso político iria escaqueirar o país.

Mas ao contrário da teimosia do Caro Afonso Miguel em contornar a nossa realidade histórica e cultural, e não resiste a olhar lá para fora, com realidades tão diferentes da nossa, O Sr. Daniel Palhares (com o qual não estou de acordo no essencial), centra a sua análise na nossa realidade histórica e sociológica.

É, quer queiram ou não, é incontornável atermo-nos à nossa realidade objectiva.

Do livro "O Republicanismo em Portugal", de Fernando Catroga, editado pela Editorial Notícias, cito (o que está a itálico no meio das citações, é de minha autoria):

"Tendo como evidente referência o pensamento de Henrique Nogueira, o primeiro programa de um grupo federalista organizado foi publicado pelo Centro Federal de Lisboa em 1873.

(...) sabe-se, contudo, que era contrário à existência de um Presidente da República - cargo que significaria o reconhecimento do princípio da unificação e da personificação do poder. (...)divulgadas pelo grupo em 1874, fica-se a conhecer que a federação deveria evoluir para a formação de quatro estados: o Norte, com capital no Porto; o Centro, com capital em Coimbra: o Sul, em Lisboa: e o Algarve, em Faro. A sede da Assembleia Federal e do seu governo estaria, por dois anos, alternadamente em Lisboa e Porto".


É bom ter em conta que estamos, por essa altura, a dar os primeiros passos para a criação de partidos (isto é muito importante), fase do "clubismo" (criação de clubes e centros).

Continua..........
templario disse…
Escreve Fernando Catroga:
"Os centros eram clubes político-ideológicos, independentes entre si (não existem aqui fortes analogias com o sistema partidário português actual? Atente-se nesta: "misto de......, e de comité eleitoral", escreve o autor. Não são hoje as organizações partidárias locais e concelhias meros Comités Eleitorais, para escolherem caciques locais?).

Continuando a citar F. Catroga:
"(...) Por outro lado, pode dizer-se que o federalismo se afastava, neste campo, da tradição do Estado nacional unitário de tradição jacobina, valorizando, ao contrário,, o exemplo republicano dos Estados Unidos e, sobretudo, da Suiça". Daí que, como Carrilho Vieira, acreditassem que poderíamos «facilmente constituir no continente quatro estados...; cada estado dividir-se-ia em cantões ou distritos e estes em municípios ou comunas»"

Curioso a referência que faziam aos E.U.A. e Suiça, como hoje fazem muitos regionalistas. Que relação pode existir, nesta questão, entre Portugal e aqueles países?!

Voltar a realçar que estamos nesse tempo sob forte influência da Grande Revolução Francesa, da experiência revolucionária da Comuna de Paris (1848), da experiência republicana em Espanha, com as nossas chamadas elites de banqueiros, intelectuais, políticas, militares, religiosas, divididas e apoiadas por grupos de interesses locais, que viam no poder central o seu grande inimigo, que punha em perigo os seus estatutos, privilégios e outros interesses.

Vale a pena pensar nestas semelhanças e analogias com o presente político português, para descortinarmos o verdadeiro "motor" que põe em movimento, em épocas diferentes, a ambição dos que querem dividir e retalhar Portugal.

Vale a pena investigar, desde a fundação da nossa nacionalidade. Enquanto os outros países ganharam unidade e estatuto jurídico de Estado por acordos entre reis, príncipes, duques, condes e bispados, no nosso país foi o povo, as suas comunidades, os seus concelhos, que desde início, em torno de um poder central, forjaram a nossa Nação.

Esta Pátria é do povo, edificada pelo povo de norte a sul, que para a manter unida e independente teve de arrastar muitos "regionalistas" e traidores pelas ruas e lugares do país. Porque este Portugal é deles e não do sistema partidário putrefacto actual, onde impera o clubismo, os comités eleitorais controlados por caciques de tipo novo.

Devíamos estar todos a denunciar a ineficácia e estado calamitoso do nosso sistema partidário, a exigir uma grande Descentralização.
templario disse…
Vamos ver se consigo corrigir a falta das tags para o itálico.

Deve ler-se assim:

Escreve Fernando Catroga:
"Os centros eram clubes político-ideológicos, independentes entre si
(não existem aqui fortes analogias com o sistema partidário português actual? Atente-se nesta: "misto de......, e de comité eleitoral", escreve o autor. Não são hoje as organizações partidárias locais e concelhias meros Comités Eleitorais, para escolherem caciques locais?).
antonioj disse…
Este mapa de 3 regiões é tão ridiculo que me faltam palavras...daí até ser defensável pelos adversários da regionalização, como o sr templário...