Educação - um País dividido entre o litoral e o interior

Alentejo é a região com pior média

As notas dos exames nacionais no secundário dividem o País em litoral e interior e traçam um retrato socioeconómico do território, com os grandes centros urbanos a apresentar as médias mais elevadas. Os três distritos do Alentejo, as regiões autónomas e os distritos de Guarda e Bragança são aqueles em que a média é mais baixa e não chega aos 10 valores. Bem como Setúbal, um distrito do litoral mas marcado pelo forte desemprego.

Os resultados espelham a falta de coesão territorial, dizem autarcas, e também as baixas expectativas de quem está a estudar e não vê perspectivas de emprego no concelho onde reside. Tendência só se inverte com investimento nos concelhos desertificados, mais autonomia para as escolas e com o envolvimento de toda a comunidade no ensino, defende o presidente da associação dos directores de escolas.

A média dos exames nacionais não chega aos 10 valores em nenhum dos três distritos do Alentejo. Em Portalegre, os resultados do secundário ficam-se mesmo pela negativa, com a média nos 9,21. Com notas inferiores a 10 valores estão também as regiões autónomas e dois distritos do interior do País: Guarda e Bragança. Setúbal é o único distrito do litoral que não supera o 9,6.

O ranking das escolas retrata, assim, um território dividido entre litoral e interior, grandes centros urbanos e regiões desertificadas, consideram os especialistas ouvidos pelo DN.

"Essencialmente, faz um retrato socioeconómico do País", acrescenta Adalmiro Botelho da Fonseca, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas.

Por isso, no topo da lista está o distrito de Coimbra, seguido dos de Lisboa, Leiria, Aveiro e Porto. Também por este motivo, Setúbal, um distrito fortemente marcado pelo desemprego, é o único do litoral que se situa abaixo dos 10 valores.

"As condições socioeconómicas determinam as expectativas dos alunos, o envolvimento dos pais, a motivação e a perspectiva de futuro dos jovens", considera o professor da zona de Vila Nova de Gaia, salientando que, no interior, os pais tendem a "desligar-se do acompanhamento escolar dos filhos".


Para António José Ganhão, responsável pela pasta da Educação na Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a explicação é bem mais complexa e passa não só pelas famílias mas também pelo corpo docente e pelas oportunidades locais. "É no litoral que estão as pessoas mais bem preparadas para, mediante as dificuldades, encontrar os melhores métodos para levar os alunos ao êxito. Mas a procura do litoral por parte dos profissionais mais qualificados não é, infelizmente, um factor exclusivo da classe docente", lamenta o ex-professor, autarca de Benavente.

A motivação dos jovens está directamente relacionada com o seu meio familiar, lembra António José Ganhão. Mas não só. "Se não há perspectivas de emprego no concelho onde reside, nem qualquer investimento para que a situação seja invertida, qual pode ser a expectativa de um estudante?", questiona o autarca, que resume a questão a um problema de "coesão territorial".

E este é um fenómeno cíclico, acrescenta. Se não há qualificação dos recursos humanos nestas áreas, as empresas não se fixam, se isso não acontece, não há perspectivas de emprego para os locais e as expectativas dos estudantes são mais reduzidas, explica. "Infelizmente, a escola não está a conseguir vencer esse obstáculo", reconhece, e os distritos onde a qualificação é mais necessária são os que têm resultados escolares mais fracos.

Os investimentos necessários são ao nível profissional e empresarial, sublinha, porque, no que diz respeito a infra-estruturas de ensino, o País já está bem servido.

A opinião é partilhada por Ana Manteiga, vereadora da Educação da Câmara Municipal de Portalegre. O concelho situa-se no meio do ranking das escolas, mas integra o distrito com piores resultados. "Esta tabela espelha um conjunto de factores sociais que afectam o interior do País. As grandes empresas que estão a fechar só podem criar baixas expectativas nos alunos", reconhece a autarca, que também já foi professora, e tem vindo a assistir a um crescente "desinvestimento dos alunos e a uma falta de perspectivas em relação ao futuro".

Para inverter a tendência, acrescenta Ana Manteiga, é preciso abandonar o "facilitismo", que diz começar nos serviços centrais do Estado e estender-se a pais e alunos. E colocar o desafio nas mãos da comunidade, acrescenta o presidente dos directores escolares.

"A escola deve ter uma autonomia responsável, envolver os pais, associações locais e juvenis, autarquias e demais actores", diz Botelho da Fonseca.

|DN|
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