Rui Moreira tem razão

|Rogério Gomes|

A posição de Rui Moreira em ponderar a sua não continuidade à frente da Associação Comercial do Porto é compreensível e perfeitamente demonstrativa da apatia que tomou conta da “sociedade civil”, neste caso nortenha. O presidente da ACP tem sido nos últimos anos talvez a voz mais interveniente no debate público regional, em especial quando as questões dizem respeito ao Porto e ao Norte – diríamos que sempre que os interesses da região ou da cidade estão em causa.

Curiosamente, dada a propriedade com que se pronuncia sobre os assuntos, reúne quase sempre um conjunto vasto de concordâncias ou, pelo menos, de aquiescências tácitas. O problema é que raramente há movimentação sócio/política consequente com os aplausos que as suas palavras merecem.

No muito discutido caso da reorganização da ANA que leva a gestão do aeroporto de Sá Carneiro e os seus lucros para uma holding que, naturalmente vai diluir os interesses próprios e a autonomia financeira do equipamento, Rui Moreira ainda teve a satisfação de ver um grupo económico (Sonae) a interessar-se pelo assunto. Mas agora, quando denuncia uma manobra semelhante em relação à APDL que, a concretizar-se a intenção do Governo, será integrada numa estrutura que vão “comer” o altamente lucrativo porto de Leixões, a resposta é a indiferença.

Se o caso do aeroporto levantou vozes e alertou consciências, a hipótese de também a gestão dos portos do Douro e de Leixões serem centralizados devia levar-nos a uma revolta imediata e enérgica contra esta intenção.

Mas, não: reina o silêncio.

(uma excepção no caso do teatro de S. João, cuja passagem para uma administração centralizada em Lisboa motivou uma concentração de centenas de pessoas)

A crise parece ter amolecido o ânimo social e as “forças vivas” do Porto e do Norte estão desmotivadas. Os partidos andam entretidos com a discussão do orçamento, os empresários procuram entre as migalhas do Estado e os milhões da Europa alguns tostões para manter actividade e os cidadãos fazem contas à vida e à crise, tentando não perder o emprego e assegurar a saúde e a educação dos seus. Os líderes políticos, ou estão reféns de estratégias pessoais que não passam por acicatar neste momento os ânimos ou à esperam uma redefinição política nacional para jogarem os seus trunfos.

Ao Porto e ao Norte falta-lhes sentimento de revolta; falta-lhes, hoje, a capacidade de indignação e quem tenha a capacidade de a corporizar. Não existe uma opinião pública forte capaz de mobilizar consciências e de iniciar um movimento suficiente forte para contrariar o centralismo galopante que o Governo vem impondo.

Todos os dias temos muita gente a queixar-se de Lisboa, do modo como o Estado suga recursos e abafa o desenvolvimento regional. Não faltam exemplos, grandes e mais pequenos, de como diariamente isto é feito. Também não é difícil ter o acordo de muitas figuras públicas e até de dirigentes partidários locais em como isto é assim mesmo… Mas, depois, falta a consequência. E demasiadas vezes vemos como aqueles que, em privado, concordam connosco, em público, se remetem a uma comprometido silêncio ou são capazes mesmo de se contradizerem.

Por inveja política, por calculismo partidário ou por simples comodismo, é o silêncio que impera. E quando pessoas como Rui Moreira se vêem a pregar no deserto é muito natural que sintam desânimo e que não vale a pena continuar.

É muito difícil remar contra esta maré de apatia e de posturas calculistas de quem tinha a obrigação de defender a região e a cidade. Seria, no entanto, uma enorme perda para ambas se Rui Moreira deixasse de ser aquilo que é: um portuense, uma referência e uma das principais vozes do Norte.
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