Haja coragem

Convenhamos: a questão de fundo na (não) Regionalização é o desemprego no sector público que a mesma provocaria na capital, afectando toda a área metropolitana de Lisboa. Haverá estudos que o confirmem, mas mesmo sem termos acesso aos mesmos, é fácil perceber que a deslocalização de competências tornaria excessivos milhares de postos de trabalho na administração central. Este é – em sentido figurativo – o tumor que a operação de regionalizar obrigaria a tratar com pinças muito delicadas.

É verdade que nos últimos 20 anos (já o era antes, mas menos acentuado) milhares de quadros deixaram as suas cidades em busca das oportunidades que só Lisboa parecia garantir. Mas se a Regionalização avançasse era preciso deslocalizar quase outros tantos de Lisboa para os vários pontos do País onde o sector administrativo regional precisasse de vir a empregar gente com qualificações para exercer as tais competências. Os serviços adstritos a essas competências passariam a estar sedeadas na região para onde foram transferidas.

É certo que em Viana, Bragança, Braga, Évora, Porto, Faro... em todas as restantes regiões e pólos urbanos não falta quem o saiba fazer. Não é a toa que reclamam para si essa administração. Não só por razões logísticas e politicamente sérias (não faz sentido resolver questões locais da Beira Alta no Rossio), mas porque ainda há muita gente que fica nas suas terras também com o sentido de ajudar a evitar a desertificação material e de ideias.

Há cidades em Portugal que já têm a sua história, o seu passado de riqueza social em convívio directo com os fantasmas da pobreza e falência que vagueiam por casas, lojas e empresas em ruínas e sem gente a viver ou a trabalhar. Um círculo de decadência que aperta os corações citadinas, vindo das antigas cinturas rurais e industriais que circundavam Fafe, Trofa, Santo Tirso, Famalicão, Beja, Évora, Castelo Branco, Montalegre, Tavira, Portimão...

Se os centros dessas cidades evoluíram no plano da construção (a urbanidade disfarça-se com prédios novos nos centros e no primeiro círculo em torno dos mesmos), já a sua riqueza vai-se perdendo com a ruína empresarial e produtiva dos círculos externos à urbe. Aqueles que desde a Revolução Industrial estavam para a organização territorial como os machos que levavam comida aos ninhos no mundo animal.

Devagar (ou nem tanto), as cidades médias definham e mais tarde será impossível recuperar. Era crucial que se começasse a passar a mensagem de que os empregos de Lisboa terão que ser repartidos pelo resto do Portugal. Por todas as razões e mais uma: o resto de Portugal tem o direito à sua própria identidade regional sem que, até essa, seja definida e desenhada por três ou quatro gabinetes técnicos contratados por cinco ou seis direcções públicas em função da necessidade de cinco ou seis estudos e pareceres que permitam a seis ou sete ministros travar o direito de cada cidadão, na sua terra, gerir a materia local (a local, friso) como ele e os seus conterrâneos bem entendem.

É que em tanto gabinete, público e privado, sedeado em Lisboa gastam-se milhões a pensar uma rua que só custaria milhares se fosse pensada e construída por quem lá passa todos os dias.

Mário Dorminsky no grandeportoonline.com
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Comentários

Anónimo disse…
Gostava que esse senhor demonstrasse com factos a tese que tenta provar. Quanto empregos é que estão em Lisboa e que deviam estar no resto do país.
João disse…
E quantos boys se iriam candidatar a tantos novos jobs criados à medida....
É uma evidência que uma boa Regionalização implica a criação de uma nova administração intermédia em detrimento de muita da actual administração central. Os verdadeiros regionalistas não querem criar mais Estado, pelo contrário, com esta reforma pretende-se ter menos Estado, mas muito mais eficaz e, sobretudo, muito mais perto do cidadãos.