Reflexão sobre as Freguesias e uma eventual proposta do Governo para alterar o respectivo mapa – atenção adversários da Regionalização, que supostamente vai “dividir” o nosso pequeno e homogéneo País: ainda não repararam que ele se encontra já hoje terrivelmente dividido em mais de quatro mil pedacinhos?...
Embora o tema seja discutível, tanto na sua importância como na sua prioridade, ainda assim acho louvável que o nosso assoberbado Governo perca algum do seu precioso tempo a preocupar-se com a nossa organização territorial, ainda que neste caso “apenas” com as Freguesias. Porque, pelo menos, tem o mérito de suscitar a discussão de algo que está à espera de reforma profunda há mais de vinte e cinco anos! E uma coisa acaba sempre por levar a outras…
Freguesias: são mais de 4 000! Para que servem? O que fazem? Qual a sua importância? Para além do seu valor simbólico e tradicional, claro...
Parece-me evidente que a resposta a estas questões só pode ser uma: depende! E depende de quê? Para mim, de um aspecto crucial: se ela se encontra inserida em meio rural, ou em meio urbano.
Esta a grande reflexão que me proponho hoje suscitar: a primeira questão que deve ser encarada nesta problemática é a de saber se continua a fazer sentido tratar todo o território do mesmo modo igualitário (de acordo com o chamado “princípio da universalidade”), ou seja, se as Freguesias serão mesmo “todas iguais”, ou se não deveria haver algumas “mais iguais do que as outras”.
Parece uma heresia, dito assim, mas vou tentar explicar este meu ponto de vista. No actual estado de desenvolvimento (e também de povoamento) do País, estou em crer que há que encarar de frente esta realidade: há uma vincada diferença geográfica e demográfica entre as Cidades e os Campos. Entre a paisagem rural e a ocupação urbana. E sendo isto uma verdade insofismável, penso ser necessário e justo que ela se traduza em termos da nossa organização administrativa. É este, aliás, o raciocínio que fundamenta a existência de Áreas Metropolitanas e que esteve na base das reformas cosméticas introduzidas no tempo de Durão Barroso/Miguel Relvas, com a instituição das chamadas “Comunidades Urbanas” e “Associações Inter-Municipais” (ou coisa que o valha: hoje já pertence tudo ao Passado…).
Com base nesta discrepância (nem sempre límpida, concedo), parece-me contudo vantajoso introduzir na Lei uma diferenciação clara e realista entre Freguesias rurais e Freguesias urbanas – e estas talvez nem se devessem chamar Freguesias...
Mas não fico por aqui. Na mesma linha de pensamento, ainda que pudessem manter nomenclatura semelhante, também se deveria distinguir legalmente entre Municípios urbanos e rurais. Os últimos possuiriam Freguesias e alguns dos primeiros não – nomeadamente todos aqueles que estivessem integrados em Áreas Metropolitanas!
Deste modo, as Freguesias rurais, por todas as razões e mais algumas, poderiam manter a sua configuração actual, a menos de alterações pontuais espontânea e livremente acordadas (fusões ou divisões), entre populações e órgãos representativos interessados (Assembleias Municipais e de Freguesia), quase sem interferência por parte do Governo. Até porque as Freguesias dependem muitíssimo mais das respectivas Câmaras Municipais do que propriamente do Estado…
As Freguesias urbanas, essas sim, que na esmagadora maioria dos casos não têm para as populações a importância que as rurais ainda detêm, deveriam ser profundamente re-estruturadas no sentido de uma maior homogeneização, ao contrário do que hoje sucede – vejam-se os conhecidos exemplos extremos de Freguesias como a dos Mártires, em Lisboa (minúscula!), e a do Algueirão, ou a de Queluz, no Concelho de Sintra (gigantescas!).
Só assim, aliás, faria sentido uma maior autonomia deste nível administrativo face ao poder municipal, ao contrário do que hoje se verifica. E seria possível alterar o quadro legal de competências e de meios deste novo tipo de Freguesias. Obviamente diferente do que ficaria instituído para as Freguesias rurais, que naturalmente continuariam a manter um padrão de muito maior heterogeneidade e que, para além disso, lidam muito mais directa e afectivamente com as populações que servem.
Mas a questão das Freguesias urbanas pode ainda ser aprofundada: estas entidades administrativas deveriam não apenas sofrer uma profunda re-estruturação, mas mesmo tendencialmente extinguir-se nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto! Onde haveria que, em simultâneo, re-estruturar os respectivos Concelhos!
Dou exemplos: num quadro de funcionamento normal das desejáveis (por mim) Regiões Metropolitanas de Lisboa e do Porto, com órgãos próprios democraticamente eleitos e atribuições que, em grande parte (mas não toda) iriam receber dos actuais Municípios, que sentido continuariam a fazer os Concelhos actuais do Porto e de Lisboa? E os Concelhos anormalmente “engordados” com populações muito mais identificadas com estas duas grandes Urbes do que com os seus próprios Municípios, como as de Gaia e da Amadora? Ou mesmo de Almada, de Gondomar, ou de Sintra?
Com a extinção de todas as Freguesias no interior das duas Regiões Metropolitanas, haveria lugar para um redimensionamento dos seus Concelhos (não necessariamente todos), que assim absorveriam as reduzidas competências das Juntas de Freguesia e que colmatariam algum distanciamento que o poder metropolitano poderia, de início, suscitar. Seria então a vez de repensar a criação de Concelhos mais pequenos e “operacionais”, eventualmente recuperando Municípios outrora existentes (como Belém, ou mesmo os Olivais, em Lisboa), ou então re-desenhando-os de raiz, com base nas realidades sócio-geográficas concretas do Presente e do Futuro previsível!
Todo um longo trabalho que urge antecipar e perspectivar, mas que carece de uma arquitectura global para poder ser encarado como visando mais além do que a mera resolução de dificuldades conjunturais…
No entanto, toda esta grandiosa reforma estrutural deve ser levada a cabo com os indispensáveis diálogo, bom-senso e moderação. O nosso “mal” organizativo pode ser grande, mas a verdade é que o País vem funcionando assim desde há muitas décadas e não pode ser subitamente sujeito a "terapias de choque".
Há pois que ter paciência e, ao mesmo tempo, perseverança. Como perante um paciente que sabemos ter uma doença (ou uma dependência) grave e carecer de prolongado tratamento, não podemos prescrever-lhe uma cura “milagrosa” e tão drástica, que ainda lhe cause mais dano, ou trauma, do que a sua própria enfermidade…
Embora o tema seja discutível, tanto na sua importância como na sua prioridade, ainda assim acho louvável que o nosso assoberbado Governo perca algum do seu precioso tempo a preocupar-se com a nossa organização territorial, ainda que neste caso “apenas” com as Freguesias. Porque, pelo menos, tem o mérito de suscitar a discussão de algo que está à espera de reforma profunda há mais de vinte e cinco anos! E uma coisa acaba sempre por levar a outras…
Freguesias: são mais de 4 000! Para que servem? O que fazem? Qual a sua importância? Para além do seu valor simbólico e tradicional, claro...
Parece-me evidente que a resposta a estas questões só pode ser uma: depende! E depende de quê? Para mim, de um aspecto crucial: se ela se encontra inserida em meio rural, ou em meio urbano.
Esta a grande reflexão que me proponho hoje suscitar: a primeira questão que deve ser encarada nesta problemática é a de saber se continua a fazer sentido tratar todo o território do mesmo modo igualitário (de acordo com o chamado “princípio da universalidade”), ou seja, se as Freguesias serão mesmo “todas iguais”, ou se não deveria haver algumas “mais iguais do que as outras”.
Parece uma heresia, dito assim, mas vou tentar explicar este meu ponto de vista. No actual estado de desenvolvimento (e também de povoamento) do País, estou em crer que há que encarar de frente esta realidade: há uma vincada diferença geográfica e demográfica entre as Cidades e os Campos. Entre a paisagem rural e a ocupação urbana. E sendo isto uma verdade insofismável, penso ser necessário e justo que ela se traduza em termos da nossa organização administrativa. É este, aliás, o raciocínio que fundamenta a existência de Áreas Metropolitanas e que esteve na base das reformas cosméticas introduzidas no tempo de Durão Barroso/Miguel Relvas, com a instituição das chamadas “Comunidades Urbanas” e “Associações Inter-Municipais” (ou coisa que o valha: hoje já pertence tudo ao Passado…).
Com base nesta discrepância (nem sempre límpida, concedo), parece-me contudo vantajoso introduzir na Lei uma diferenciação clara e realista entre Freguesias rurais e Freguesias urbanas – e estas talvez nem se devessem chamar Freguesias...
Mas não fico por aqui. Na mesma linha de pensamento, ainda que pudessem manter nomenclatura semelhante, também se deveria distinguir legalmente entre Municípios urbanos e rurais. Os últimos possuiriam Freguesias e alguns dos primeiros não – nomeadamente todos aqueles que estivessem integrados em Áreas Metropolitanas!
Deste modo, as Freguesias rurais, por todas as razões e mais algumas, poderiam manter a sua configuração actual, a menos de alterações pontuais espontânea e livremente acordadas (fusões ou divisões), entre populações e órgãos representativos interessados (Assembleias Municipais e de Freguesia), quase sem interferência por parte do Governo. Até porque as Freguesias dependem muitíssimo mais das respectivas Câmaras Municipais do que propriamente do Estado…
As Freguesias urbanas, essas sim, que na esmagadora maioria dos casos não têm para as populações a importância que as rurais ainda detêm, deveriam ser profundamente re-estruturadas no sentido de uma maior homogeneização, ao contrário do que hoje sucede – vejam-se os conhecidos exemplos extremos de Freguesias como a dos Mártires, em Lisboa (minúscula!), e a do Algueirão, ou a de Queluz, no Concelho de Sintra (gigantescas!).
Só assim, aliás, faria sentido uma maior autonomia deste nível administrativo face ao poder municipal, ao contrário do que hoje se verifica. E seria possível alterar o quadro legal de competências e de meios deste novo tipo de Freguesias. Obviamente diferente do que ficaria instituído para as Freguesias rurais, que naturalmente continuariam a manter um padrão de muito maior heterogeneidade e que, para além disso, lidam muito mais directa e afectivamente com as populações que servem.
Mas a questão das Freguesias urbanas pode ainda ser aprofundada: estas entidades administrativas deveriam não apenas sofrer uma profunda re-estruturação, mas mesmo tendencialmente extinguir-se nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto! Onde haveria que, em simultâneo, re-estruturar os respectivos Concelhos!
Dou exemplos: num quadro de funcionamento normal das desejáveis (por mim) Regiões Metropolitanas de Lisboa e do Porto, com órgãos próprios democraticamente eleitos e atribuições que, em grande parte (mas não toda) iriam receber dos actuais Municípios, que sentido continuariam a fazer os Concelhos actuais do Porto e de Lisboa? E os Concelhos anormalmente “engordados” com populações muito mais identificadas com estas duas grandes Urbes do que com os seus próprios Municípios, como as de Gaia e da Amadora? Ou mesmo de Almada, de Gondomar, ou de Sintra?
Com a extinção de todas as Freguesias no interior das duas Regiões Metropolitanas, haveria lugar para um redimensionamento dos seus Concelhos (não necessariamente todos), que assim absorveriam as reduzidas competências das Juntas de Freguesia e que colmatariam algum distanciamento que o poder metropolitano poderia, de início, suscitar. Seria então a vez de repensar a criação de Concelhos mais pequenos e “operacionais”, eventualmente recuperando Municípios outrora existentes (como Belém, ou mesmo os Olivais, em Lisboa), ou então re-desenhando-os de raiz, com base nas realidades sócio-geográficas concretas do Presente e do Futuro previsível!
Todo um longo trabalho que urge antecipar e perspectivar, mas que carece de uma arquitectura global para poder ser encarado como visando mais além do que a mera resolução de dificuldades conjunturais…
No entanto, toda esta grandiosa reforma estrutural deve ser levada a cabo com os indispensáveis diálogo, bom-senso e moderação. O nosso “mal” organizativo pode ser grande, mas a verdade é que o País vem funcionando assim desde há muitas décadas e não pode ser subitamente sujeito a "terapias de choque".
Há pois que ter paciência e, ao mesmo tempo, perseverança. Como perante um paciente que sabemos ter uma doença (ou uma dependência) grave e carecer de prolongado tratamento, não podemos prescrever-lhe uma cura “milagrosa” e tão drástica, que ainda lhe cause mais dano, ou trauma, do que a sua própria enfermidade…
Comentários
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,
É de elementar serenidade política não criar problemas onde eles não existem ou onde a sua simples denúncia vai criar muitos mais problemas secundários do que aqueles, fundamentais, que já existem.
Os concelhos e as freguesias actualmente constituidos e legitimados politicamente que continuem serenamente as suas actividades, com respeito pleno pelas aspirações de todas as populações locais (municipais e de freguesias) que aspiram a ver a sua terra em nível administrativo e político mais graduado.
No entanto, é de alertar que a regionalziação ainda não está decidida, embora conste do texto constitucional há mais de 32 anos,na sua versão administrativa (é verdade, não é engano; até ninguém fez absolutamente nada) e é neste enquadramento que esse tipo de problemas tem de ser resolvido e nunca por decisões de poder centralizado e centralizador.
Há alguma necessidade de criar problema onde eles não existem e muito menos se justificam?
Sem mais nem menos.
Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)