Um projecto descentralizador: O Núcleo Republicano Regionalista do Norte (1920-1924)

António José Queiroz
historiador

Em 1920, tempo em que o Partido Republicano Português (PRP) era já dominado por “deuses menores”, organizou-se no Porto o NRRN (Núcleo Republicano Regionalista do Norte).

A contestação ao centralismo do Terreiro do Paço fazia-se então sentir um pouco por todo o país.

A coberto de uma capa descentralizadora, este heterogéneo grupo de pressão ensaiou um braço de ferro com uma facção política em ascensão dentro do PRP, cujo líder era indiscutivelmente José Domingues dos Santos.

Mais que um movimento regionalista, o NRRN pretendeu constituir-se como uma força política alternativa ao PRP, no Porto e, a prazo, no Norte. Mas as suas contradições eram muitas e evidentes, desde logo por não ter assumido a ruptura com o partido (donde provinham muitos dos seus dirigentes), bem como a condição de força eleitoral, facto que acabaria por desmentir, ao concorrer às eleições de 1921.

Sem o apoio popular, que lhe faltou nas urnas e na rua, o NRRN estava naturalmente condenado ao fracasso. Daí que, sem surpresa, grande parte dos seus dirigentes tenha capitulado e regressado ao PRP, optando por se acolher à sombra generosa do grande partido da República.

Tal como acontecera, em 1912, no Alentejo (com a tentativa de formar um Partido Republicano Regional), também o Porto e o Norte falhariam o projecto de constituição de uma força política regional. Interesses pessoais e partidários derrotaram esse projecto. Os poucos elementos que se mostraram coerentes com as suas posições iniciais, mantendo acesa a chama do regionalismo (e do federalismo) optaram pelo abandono da política ou (como foi o caso de Camilo de Oliveira) transferiram a sua militância para o aguerrido Partido Republicano Radical.

Nas hostes portuenses deste partido continuaram a combater, sem tréguas, a “força repulsiva” que, em Julho de 1925, estaria na origem da última cisão do PRP, de que resultaria, em Abril de 1926, a formação do Partido Republicano da Esquerda Democrática.

O regionalismo (devidamente enquadrado pelo Estado Novo) não morreu após a Primeira República. Mas, obviamente, não mexeu significativamente na organização administrativa existente.

Após o 25 de Abril, julgou-se que, finalmente, estaria para breve o fim da asfixia centralizadora da capital. Essa convicção acentuar-se-ia com a promulgação da Constituição de 1976. Embora o art. 6.º reafirmasse a opção por um Estado unitário, no título VIII (Poder local), art. 238.º, ficaria expresso que, no continente, as autarquias locais eram as freguesias, os municípios e as regiões administrativas.

Sabe-se, porém, o que tem sido a “via-sacra” da Regionalização. Para a sua implementação, tem faltado aos deputados a determinação que o senador transmontano Augusto Lobo Alves demonstrou, em 1921, na sua primeira intervenção parlamentar, mas que, infelizmente, não teve o eco que merecia.

Para memória futura, e como incentivo a quantos lutam pela causa nobre e justa da Regionalização, aqui se deixa novamente o registo desse discurso de Lobo Alves, no Senado, que se iniciou da seguinte forma:

Sr. Presidente: eu vim como Senador regionalista. Bem sei que sou o primeiro, mas eu estou que há-de ser o regionalismo que há-de fazer a reviravolta indispensável para este país ser o que deve ser e o que nós queremos que ele seja.


[…] Se realmente o país despertar, se se convencer que Lisboa não manda como tem mandado e que o Terreiro do Paço não é aquilo que devia ser – pouco mais do que uma expressão geográfica e geométrica – convenço-me de que o sol há-de raiar para todos os portugueses.


|ler aqui o documento histórico completo|
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Comentários

Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Devemos ser o País que tem mais recordes no "Guiness" pelas piores razões políticas, mas a de maior importância está relacionada com a incpacidade endémica de resolver os problemas da sociedade, permanentes por mais de 100 anos.
É obra.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
ravara disse…
Caros amigos sou da opinião, de que passados trinta anos continuamos com o modelo do Estado Novo embora mascarado de Democracia, porque continuamos com todos os grandes impecilhos do antigamente; ao longo deste período não apareceu um líder capaz de vencer as grandes corporações, de adequar ao país um modelo económico exequível, sustentável e socialmente justo; só falta dizer que os portugueses não estão preparados para tal realidade; nesta conformidade mais parece que estamos num impasse. Mas quem está atento e percorre o país, constacta que as melhorias vão um pouco por todo o lado e sempre por conta das autarquias, onde na minha opinião há autarcas melhores do que políticos, logo o futuro deve ser jogado aqui. Concluindo, eu também acredito nas cinco regiões quanto mais não seja para acabar com o estado velho, e contudo vivo há mais de cinquenta anos em Lisboa,uma cidade que amo e não troco por coisa nenhuma.
Não conhecia este blog, desejo a todos vós que triunfe a vossa e minha causa.
caro ravara,

Lisboa e os lisboetas são, na minha opinião, uma das maiores vítimas deste centralismo que tudo arrasta para a capital prejudicando, de sobremaneira, a sua qualidade de vida.

Cumprimentos,
Quase 100 anos passaram e o modelo centralista de administração do território mantém-se.

Será este, também, um problema cultural?
Anónimo disse…
Caro António Felizes,

Já antes escrevi que os habitantes da cidade-capital hão-de algum dia agradecer os esforços substanciais que estamos a fazer para implementar a regionalização, de forma a liviar a tensão social que se vai intensificando dia-adia e silenciosamente naquela cidade.
No entanto, há muitos que não conseguem enxergar esta realidade sensível, razão pela qual também não é aconselhável criar o mesmo tipo de centralidades nas cidades futuras capitais das 5 regiões administrativas que pretendem impigir-nos de forma irresponsável.
Por isso, regionalização depressa e bem só com as 7 Regiões Autónomas. E se não for a bem e a tempo outros~que não regionalistas vão obrigar os políticos então em funções a fazê-lo. É tão certinho como estarmos agora sentados a escrever neste bolgue, sendo a maior dificuldade apenas uma questão de tempo, não querendo ninguém aprender com a HISTÓRIA. E assim sendo, é revelador de incultura ou de estupidez política.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)