A importância da Galiza e o (des)governo de Portugal

Passos é um zero à esquerda

Sou um feroz adepto da reciprocidade. Trato por tu quem me trata por tu. Esforço-me por tratar bem quem é simpático comigo. E que se desengane quem me trata mal, pois se espera que eu retribua maus-tratos com delicadeza o melhor que tem a fazer é esperar sentado, para não ganhar varizes. Não sou daqueles que oferece a outra face. Não consigo respeitar quem não se sabe dar ao respeito.

Vem isto a propósito de já se ter tornado claro para quase toda a gente - com a exceção das avestruzes que vivem com a cabeça enterrada nas areias de Lisboa - que o rio Minho deixou de ser uma cicatriz e reassumiu o papel de dobradiça que une o Norte e a Galiza.

É aos turistas galegos (e à Ryanair) que o aeroporto Sá Carneiro deve os seus seis milhões de passageiros/ano, um movimento 33% superior ao do conjunto dos aeroportos de Vigo, Corunha e Santiago.

A proximidade da Citroën de Vigo (a segunda maior fábrica do grupo PSA) ajuda a explicar por que é que os parques industriais de Cerveira e Arcos de Valdevez estão cheios de fábricas de componentes para a indústria automóvel.

A vizinhança da Zara (a maior cadeia mundial de pronto-a-vestir) ajuda a perceber a sobrevivência da fileira têxtil, que já tinha recebido a extrema-unção dado pelos panditas de Lisboa, monoteístas que elegeram os serviços como o seu Deus.

Ignorante das potencialidades da euro-região no atenuar do abismo de riqueza entre as duas margens do Minho (do outro lado , o rendimento per capita é 93% da média comunitária, deste lado é 62%), Lisboa torpedeia este esforço.

Para além de semear portagens na A28, com um sistema de pagamento absurdo, quis fechar a ligação ferroviária Porto-Vigo, alegando que ela não tinha passageiros suficientes. O mesmo argumento seria válido para as linhas de Sintra e de Cascais, se a CP diminuísse drasticamente a frequência dos comboios, pusesse ao serviço composições que foram novas no período entre as duas guerras e o primeiro comboio chegasse a Lisboa às 9.05!

Pressionado pelos galegos e o Eixo Atlântico, Passos Coelho recuou e anunciou obras de eletrificação e sinalização que permitiriam que os 75 km da ligação ferroviária entre o Porto e Viana demorassem apenas 50 minutos (em vez das atuais duas horas), e que a duração da viagem para Vigo diminuísse de três horas para 1,50 horas.

A promessa de Passos de inscrever no QREN uma verba de 50 milhões de euros (metade do que custou a nacionalização dos esgotos de Lisboa) para a modernização da Linha do Minho não foi escrita na pedra. Na verdade, só inscreveu cinco milhões - apesar de 85% do investimento ser comunitário.

No caminho entre a promessa e a sua realização perdeu-se um zero à direita, o que faz do primeiro-ministro um zero à esquerda.

Viana do Castelo continua sem cinemas, cercada por portagens, com os estaleiros moribundos por incúria de quem governa, sem Alfa ou Intercidades e servida por um comboio do tempo do faroeste. Como é que havemos de respeitar Passos, se ele não se sabe dar ao respeito?

@JN

Comentários

Anónimo disse…
Excente texto.

Apenas não concordo com a parte da A28. Que o sistema de portagem é estupido, isso estou de acordo. Mas acho que se deve pagar portagens na A28. Esta estrada tem de ter o mesmo estatuto que a A3. São estradas paralelas.