Problemática da Regionalização


















Começo por citar um excerto do Livro Branco sobre a Regionalização editado pelo MAI (Ministério Administração Interna) em 1980, que é uma síntese notável sobre esta problemática. Distingue brilhantemente os conceitos de centralização, desconcentração e descentralização:

"É assim que, na centralização, os problemas do Minho ou do Algarve são decididos em Lisboa pêlos órgãos nacionais do País; na desconcentração, esses problemas são decididos mas por pessoas nomeadas por Lisboa; na descentralização, enfim, os mesmos problemas são decididos mas por pessoas eleitas para o efeito pêlos minhotos ou pêlos algarvios, sem dependência de ordens ou autorizações de Lisboa".

A história administrativa portuguesa mostra-nos que as oscilações de regime e de governo, traduziram-se em, que desde sempre tivemos entidades administrativas com carácter de autarquia nos períodos de descentralização administrativa e com carácter de mera circunscrição administrativa nos períodos de cariz centralizador.

A Constituição da República Portuguesa, no seu art. 6.° fixa a forma do Estado, ou seja o modo de organização interna de poderes. O Estado Português, sendo, como é, Unitário, no sentido de que existe uma unidade estrutural de poder e um único ordenamento constitucional, admite contudo formas de descentralização, a mais desenvolvida das quais localiza-se nas Regiões Autónomas (art. 227.°).

As regiões autónomas, como formas acabadas de descentralização, não esgotam no quadro da Lei Fundamental, as estruturas descentralizadas. Assim, tanto a «autonomia das autarquias locais», como a «descentralização democrática da administração pública», completam o sentido da descentralização na perspectiva constitucional (art 236.º e 237.º).
Note-se:

1 - Estes preceitos legais nunca foram postos em prática, mantendo-se os sucessivos Governos, em clara situação de violação à Constituição da República.

2 - Os entes autónomos, apelidados pela Contituição por regiões administrativas, pese embora o seu relevo, são consideradas por esta como que um 2.º nivel de autarquias locais.

Ao contrário do que os seus detractores temem, o aparecimento de novas estruturas regionais convenientemente organizadas, deve transformar-se num factor de regeneração, e se possível de erradicação, daqueles graves problemas que a Administração Pública vem revelando e que com o decorrer do tempo se têm vindo a agravar. É que as regiões não vão criar novos serviços: antes vão receber serviços da Administração Central fazendo um aproveitamento e gestão dos meios materiais e humanos muito mais eficiente que a Administração Central o pode fazer. Não havendo duplicação de serviços, antes transferência dos mesmos da Administração Central para a Regional, não haverá sobrecarga de despesa, uma vez que se pretende que a maior eficácia obtida se traduza em poupança nos orçamentos.

Serão esses os grandes desafios que se apresentam hoje quer aos responsáveis políticos quer à sociedade civil.

Comentários

Anónimo disse…
O Poder Local (freguesias, municipios e regiões administrativas) multiplicam as possibilidades de participação das populações na vida pública local e nos processos democráticos.

Em primeiro lugar, porque o número de actos e campanhas eleitorais autárquicas oferecem outras tantas oportunidades para a intervenção das populações.

Em segundo lugar, porque outros mecanismos de participação (por exemplo, referendos locais, intervenção através de organizações não governamentais e grupos de interesse) vêm enriquecer a vida democrática.

Em terceiro lugar, porque nos países da União Europeia o direito de voto para as eleições locais e regionais é hoje reconhecido a todos os residentes com nacionalidade de um dos outros países da União Europeia e, em certos países (por exemplo, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Irlanda, Reino Unido, Suécia), esse direito é estendido a residentes com origem em países não comunitários, embora sujeito a um certo número de condições.

As eleições para as autarquias locais (incluindo as regiões)permitem igualmente fazer participar activamente na gestão dos assuntos públicos um número muito maior de pessoas. Se o número de eleitos para os parlamentos nacionais se conta em termos de poucas centenas, os representantes eleitos para as autarquias locais totalizam dezenas de milhares ou mesmo centenas de milhares de pessoas, nos casos da Alemanha (mais de 300 000), da Itália (cerca de 145 000) e da França (mais de 500 000).
Anónimo disse…
O Código Administrativo aprovado em 1936, que vigorou sem grandes alterações durante várias décadas, instituiu um sistema de administração territorial assente em rígidos postulados de subordinação hierárquica e funcional das «autarquias» à Administração Central estabelecendo, por exemplo, a regra da nomeação do Presidente da Câmara e da Câmara Municipal.

De modo mais prosaico, a divisão de poderes associada à existência de autarquias locais aligeira a carga suportada pela Administração Central, permitindo que a mesma se concentre em tarefas de natureza estratégica ou de âmbito nacional (defesa, comércio externo, relações exteriores).
Anónimo disse…
Com a globalização da economia e as facilidades oferecidas pela novas tecnologias da informação e das comunicações, facilita a descentralização da Administração.

A descentralização, entretanto, não deve ser desenvolvida indiscriminadamente para que não haja duplicação de esforços e seja possivel efectivar os principios da subsidariedade e da supletividade.
Anónimo disse…
Não será de evitar a competição entre os níveis regionais e nacional por recursos - via endividamento e/ou via aumento de impostos.
O governo central deve exercer controle rígido sobre os recursos destinados ao investimento público regional e local.
Concordo na generalidade, mas há que precisar alguns conceitos menos claros.

Em primeiro lugar, o chamado "controle de legalidade", de que fala jpa, pode ser (e é, actualmente) exercido pelo poder central, mas num cenário de três níveis administrativos - Estado, Regiões, Municípios - pode bem ser reformulado com base no princípio da subsidariedade, isto é: o Estado fiscaliza a legalidade dos actos do poder regional, mas cada Região pode ter competência para se substituir ao Estado na fiscalização da legalidade da Administração Local (parece-me óbvio, com a natural reserva de não ser um especialista em Direito Administrativo).

Em segundo lugar, ao Estado não poderá ficar reservado um mero papel de orientações estratégicas, o que aconteceria apenas no caso de se optar por Regiões Autónomas (situação já a caminho do Estado Federal). Na nossa Constituição prevê-se que à Administração Central continue sempre a caber a responsabilidade por TUDO o que é de interesse NACIONAL - Educação, Saúde, Economia e Finanças, Defesa, Relações Internacionais, Cultura, Infra-estruturas portuárias, ferroviárias e rodoviárias (rede nacional), etc. -, tudo aquilo que diga respeito a qualquer cidadão independentemente do seu local de origem ou residência.

Em terceiro lugar (e em óbvia relação com o anterior parágrafo), a Administração Regional não irá apenas buscar competências (e meios!) ao Poder Central, mas igualmente às AUTARQUIAS LOCAIS, que hoje exorbitam enormemente as suas competências - vejam-se certos Presidentes de Câmara a querer falar pelas "regiões" onde se localizam os respectivos Concelhos.

Assim, às autoridades regionais deverão ser cometidas as responsabilidades por tudo o que seja do interesse comum à Região, mesmo que provenha do actual poder local. Exemplos? O ordenamento do território, a rede viária regional, o licenciamento de certas actividades económicas e equipamentos colectivos e muitas outras situações, que aliás podem variar de Região para Região, mas que devem ser ponderadas onde será que ficam mais bem arrumadas.

Por último, mas muito importante, nunca deverá perder-se de vista que os princípios que fundamentam a descentralização administrativa não decorrem apenas de questões práticas - eficácia da administração pública, economia de recursos -, mas sobretudo de valores morais e políticos de equidade e justiça: o que só diz respeito a uma entidade administrativa deve ser, caso possível, decidido politicamente a esse nível e não imposto por um nível político hierarquicamente superior (princípio da subsidiariedade)!