OS PARTIDOS E A REGIONALIZAÇÃO

Daniel Gameiro Francisco
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra


O facto da regionalização ter sido reivindicada por todos os partidos políticos, cada qual elaborando o seu projecto específico, não deve iludir acerca da convicção efectivamente posta nesse processo. O grande "leitmotiv" da luta partidária foi desde o início a tomada do poder central e não tanto os ganhos "periféricos" nas autarquias.

Na estratégia dos dirigentes partidários, só o aparelho do Estado se destaca, ficando as autarquias relegadas para o cumprimento de funções menores na gestão social e política dos partidos. Era em função do centro e dos temas que a cada momento ele impunha que os partidos socializavam os seus membros mais destacados.
Não disponibilizando "oferta" de poder, as regiões não atrairam “procura” de poder, vendo até aqueles que mais as defendiam dentro das esferas partidárias inflectirem o seu discurso sempre que eram chamados às mais altas funções do Estado num processo de socialização pelo centro interessante de analisar em detalhe.

Adaptados à matriz hegemónica do Estado, os partidos infundiam da sua lógica bonapartista as carreiras políticas mais brilhantes, retirando às regiões aqueles que melhor poderiam constituir as respectivas elites (e que a um tempo mais propensão para isso teriam demonstrado) para os embeber na autoridade, nas representações, em suma, na cultura política que estruturava o aparelho do Estado.

Grande distribuidor de poder, o Estado foi também o grande construtor das representações políticas, funcionando como instância de socialização num conjunto de princípios, regras e atitudes que levaram os actores que nele se encontravam a partilhar, para além das suas divergências político-ideológicas, crenças e imagens comuns acerca das formas de governo mais desejáveis e cujo efeito sobre a regionalização seria fatal. Logo que um "regionalista" enveredava por uma carreira ao nível central da administração, ascendendo a funções de maior abrangência e responsabilidade, as suas crenças descentralizadoras passavam a segundo plano, ofuscadas por uma representação centralista do poder de onde a sua própria imagem pessoal saía fortalecida.

O resultado foi que do interior dos partidos políticos jamais emergiu uma classe ou um colectivo que sentisse as suas expectativas de poder caminhar paralelamente à regionalização.
Não que não tenha havido recorrentemente quem pressionasse a seu favor. Desde o início se constatou uma ampla tónica discursiva em prol da regionalização, como salientámos, que congregava vários actores partidários. Mas ou lhe faltava força corporativa, porque protagonizada por uma grande heterogeneidade de indivíduos, desempenhando funções isoladas, ou então provinha dos autarcas, que na retórica a proclamavam, mas na prática se encontravam embrenhados no ardor mais premente das cruzadas pelo poder local e na complexidade da gestão municipal. Só muito recentemente os autarcas começaram a equacionar as regiões como condição de possibilidade do seu próprio poder, perante um Estado que sempre o precarizou.

As regiões ressentiram-se pois da falta de empenhamento das forças partidárias na sua institucionalização, que se traduzia numa correlativa falta de empenhamento no processo sempre que atingiam a administração central. Voltados para o uso exclusivo do poder do Estado, os partidos não fariam sequer da regionalização matéria de qualquer tensão político-ideológica. Muito embora apresentassem propostas de delimitação regional distintas, faziam-no por considerações de natureza estratégica, visando áreas de influência eleitoral, e não por razões de coerência doutrinal.

Ainda assim, um certo "factor ideológico" terá pesado no percurso atribulado da regionalização. Podemos vislumbrá-lo na corrente “centralista” que todos os partidos continham nas suas fileiras, adepta dum edifício administrativo unitário e vertical, considerado como a forma de Estado mais adequada para a prossecução dos respectivos programas de governo.

Comentários

Conclusão: é necessário criar classes políticas regionais (como na Madeira), com Programas regionais relativos às problemáticas regionais!

Igualmente será necessário criar Partidos regionais, para concorrer com os "nacionais" nas Regiões Administrativas, como recentemente aconteceu nas autárquicas com os chamados grupos de Cidadãos (e que não foram apenas os dos precipitadamente designados "candidatos-bandidos"...), que venceram muitas Câmaras Municipais.

Se os Partidos "nacionais" não se interessarem pelas Regiões, haverá muito quem se interesse...