Divisão Administrativa - uma perspectiva.

É minha convicção que a única divisão regional que tem, ainda hoje, raízes culturais e sociais profundas é a das Províncias.

A identificação do homem português está indissociavelmente ligado à sua Província de origem, ou de vivência, muito mais do que aos Distritos, que sempre foram subdivisões de fachada, superficiais e impostas de cima para baixo.

As Províncias, pelo contrário, emanam de características geográficas, biofísicas, climáticas, históricas e socioculturais muito bem definidas e que, apesar de estas circunscrições administrativas se encontrarem formalmente extintas, não deixam de entranhadamente apelar ao inconsciente colectivo de cada um de nós. E não somos menos portugueses por isso, antes pelo contrário.É minha convicção que a única divisão regional que tem, ainda hoje, raízes culturais e sociais profundas é a das Províncias.

Os Distritos, muito embora ainda "vivos", nunca conseguiram impor-se como referentes identificativos das várias subculturas e realidades regionais portuguesas, talvez por, entre outros motivos, algo em que raramente se reflecte: o seu próprio código genético centralizador!

Assim, veja-se que o nome das Províncias não está associado a nenhuma realidade económica ou social hierarquizante, como o Distrito, cujo nome advém já da respectiva Sede! No Ribatejo, por exemplo, todos os seus rincões o são por igual ribatejanos, ao passo que no Distrito "da Guarda", esta Cidade obviamente detém um estatuto especial!

Como se o Distrito inteiro lhe "pertencesse"!

Com os Concelhos passa-se exactamente o mesmo. Como se tudo fosse pertença da Sede do Concelho. Particularmente desajustado no caso de Municípios heterogéneos, contendo Vilas importantes no seu seio, que algumas até já foram, outrora, Concelhos...

As Regiões não irão correr este risco, dado que, tal como as Províncias, não irão ser designadas de acordo com a sua Sede, mas segundo aquilo que as identifica no seu todo e por igual em todas as suas partes. Como que evidenciando a diferença entre circunscrições "geneticamente" centralistas, como os Distritos e os Concelhos, e as descentralizadores por definição, até no nome!

E mais, defendo que, numa próxima (e desejável) reestruturação do mapa municipal português, se acabe com os Concelhos "pertença" das respectivas Sedes, mas se escolham nomes como, por exemplo, os correspondentes às já existentes NUTS-III: Cova da Beira, Pinhal Interior Sul, Nordeste Alentejano, etc...

Aliás, por que não fazer coincidir precisamente os novos Concelhos com este nível de subdivisão territorial, já consagrado na nossa organização territorial actual?

Quanto às Sedes destes novos Concelhos, talvez fosse preferível acabar com os seus famigerados "Paços" (herança de outros tempos e realidades que nunca mais voltarão...) e distribuir os respectivos órgãos de poder - Câmara Municipal e Assembleia Municipal - por localidades diferentes, dando assim um exemplo de descentralização...

Antonio das Neves Castanho

Comentários

Anónimo disse…
Esta abordagem, embora arrojada (a roçar a utopia), parece-me interessante.
Tenho, porém, dúvidas quanto às vantagens das 11 regiões-províncias relativamente às 5 regiões-plano. Nem sempre a homogeneidade geográfica, sociocultural, histórica, económica, …, constitui um factor favorável ao desenvolvimento sustentável e à competitividade. A heterogeneidade também induz a emulação e promove o nivelamento das diferenças ou, como dizia Sto. Agostinho, “a unidade na diversidade”.
O último parágrafo do post, em minha opinião, já decorre mais de uma visão romântica do que racional. A descentralização não se pode confundir com a dispersão dos edifícios administrativos. As populações necessitam de sentir, e de usufruir, a proximidade dos serviços e não o odor do poder. A democracia representativa enquanto exercício formal de públicas virtudes não tem sentido se, na essência, não houver eficácia e eficiência. E, como os bens são escassos, o critério da afectação dos recursos é absolutamente decisivo.
Penso que, talvez pela primeira vez no debate recente sobre Regionalização, vejo alguém propugnar pela racionalização do tecido autárquico no seu conjunto e não pelo mero acréscimo de mais umas quantas, e dispendiosas, Regiões político-administrativas.
Se o processo decorrer concomitantemente, estou convencido que haverá mais defensores da Regionalização, incluindo eu próprio.
Agora, a cereja em cima do bolo seria, o António das Neves Castanho ou outro dos prezados editores ou colaboradores deste blog, relacionar a reforma política das regiões com o seu impacte nas finanças públicas, designadamente ao nível dos custos de estrutura e de funcionamento.
Muitos dos cépticos mais pirrónicos erigem a sua desconfiança sobre o buraco negro que o envelope financeiro da Regionalização pode representar (esquecendo, naturalmente, os argumentos mais ou menos bacocos, por vezes mesmo demagógicos, em torno do problema da unidade nacional). Falta, pois, a demonstração de que é possível fazer mais com menos despesa de estrutura, ou seja, com menos serviços e com menos funcionários.
Anónimo disse…
Ao António das Neves Castanho
Obrigado pelos cumprimentos pessoais há muitos “posts” atrás.
Peço desculpa pelo diferimento da resposta, mas não quero deixar passar mais esta oportunidade para me redimir.

Ao António Almeida Felizes
Obrigado pela cortesia com que trata as opiniões diferentes.
É bom conversar, serenamente, com gente informada e civilizada.
Anónimo disse…
Caro António,

Felicito a sua sensatez por preferir a fusão de concelhos em regiões do tamanho de Nuts3, mas noto divergências com o seu editor AAFelizes...

Continuo a achar que o caminho mais rápido para se alcançar poder regional é transformar concelhos em mini-regiões, dando-lhes legitimidade democrática e autonomia financeira, captando ainda competências ao poder central. Este não vÊ com bons olhos um processo desta natureza, porque percebe que perderia poder. Prefere a fragumentação por 300 concelhos.

Paulo Vaz
Anónimo disse…
Creio que hoje, ou melhor, desde o "maldito" referendo, que os opositores da regionalização agitam duas bandeiras, distintas, mas complementares.
1 - A coesão territorial, utilizando os maus exemplos de Espanha, para se escudarem. Têm razão? Provavelmente, não. Mas o argumento tem pegado.
2 - Os custos da regionalização. Os regionalistas ainda não conseguiram chegar a acordo sobre um projecto de regionalização. Muito menos tentam demonstrar que a "dita" não ia ser mais um sorvedouro de dinheiro, sem qualquer benefício para o cidadão.
E o "povinho" desconfia. E tem razão. Os políticos arredondam sempre por cima. Os Deputados na AR são 180 ou 230? Claro que o número mais alto. Se o país está em crise porque não se mandam 50 deputados para os supranumerários, em 2009? E com 180 continuavamos a cumprir a constituição.
Al Cardoso disse…
Concordo plenamente com a reducao de deputados, ja agora porque nao irmos para um numero no meio dos dois, que tal 200.
Quanto a agregacao de varios concelhos de acordo com as NUTS 3 nao creio que seria o melhor caminho, porque embora os cidadaos nunca se tenham identificado muito com os distritos, o mesmo ja se nao pode dizer com os concelhos, pois as pessoas nunca veriam com bons olhos a extincao de concelhos, alguns deles mais antigos que a propria nacionalidade. Se a ideia principal esta na reducao da despesa, porque nao redimencionar a despesa de acordo com o tamanho do respectivo concelho, por exemplo aonde se justifica que um concelho com por exemplo 12000 habitantes tenha a mesma quantidade de vareadores que outro com 3000?
Anónimo disse…
mas que já existem as Nuts 2, que funcionam como regiões para alguns efeitos, e são reconhecidas como regiões pela UE, para quê complicar??? Enfim...
Al Cardoso disse…
Eu estou de acordo que embora com pequenos ajustamentos geograficos, as regioes deviam mais ou menos coincidir com as NUT 2, realmente cinco regioes fariam muito mais sentido, que outras hipoteses passadas.
Caro amigo Félix, registo com muito agrado que esta discussão "intersticial" (no tempo das nossas ocupações, sobretudo com as tarefas mais recentes...) esteja a aproximar as nossas opiniões sobre a Regionalização!

Vou tentar responder às tuas pertinentes observações (e às de outros prezados comentadores) no próximo artigo.

Para uma próxima oportunidade prometo desenvolver o tema suscitado pelo al cardoso, muito bem observado, aliás, da igualdade de estatuto dos nossos 308 Municípios, atentas as suas óbvias e por todos reconhecidas diferenças...
Suevo disse…
Como já disse, e falando do norte isto do “Douro Litoral” é recente, durante a historia a província sempre foi Entre Douro e Minho, podemos é discutir se para além de Entre douro e Minho pode haver um trás os montes, ou se temos só uma região norte. A meu ver a melhor solução é uma região norte, terá muito mais poder, e Trás-os montes não tem hoje massa critica para ter uma região influente separada do resto do norte, mas com ou sem uma única região a norte o importante é acabar com a cidade estado que tem sido este pais nos últimos séculos. Se mais tarde se justificar a criação duma região de trás-os-montes pois que se faça isso, não é por causa dessas duvidas que alguém se pode opor ao projecto, que pode ser alterado ao longo do tempo.
E a identificação dos nortenhos com o norte não é tão pequena como A. Castanho pensa, talvez essa realidade ocorra noutros lugares, no distrito do Porto as pessoas identificam-se muito mais com o norte que com o “douro litoral”.
Sou portanto favorável às 5 regiões.
Depois o problema a meu ver é politico, o referendo das regiões não se vence ou se perde por causa dos argumentos, vence-se quando o PSD e o CDS-PP deixarem de se opor ao projecto, ou então quando os boys desses partidos tenham coragem para se demarcar dos mesmos. Com o mesmo projecto, com as mesmas regiões, se o PSD no ultimo referendo tivesse apelado ao sim, o sim teria vencido, não duvidem disto.
Em relação a Espanha, e a ser um mau exemplo de coesão territorial, é melhor estar como Espanha com uma Galiza muito acima do norte de Portugal, ou é melhor estar como Portugal, com um centralismo doentio e todo o pais no limiar da miséria?

Em relação a verbas, a União Europeia concede fundos às regiões mais pobres… a maneira como tais verbas são geridas em Portugal é no mínimo dos mínimos obscura, alguém sabe quem é o presidente da CCRN para o responsabilizar? Sabem meia dúzia, não sabe o cidadão comum. Mas o Alberto João Jardim todos sabem quem é, e tem que mostrar trabalho para ser reeleito.

Mas como já disse, o povo do norte devido ao voto que teve no último referendo (excluindo o Porto) merece de facto ser a região mais miserável da UE.
Anónimo disse…
Notas soltas: Coesão é coesão, seja ela em Timor ou no Luxemburgo. Não tem que ver com fome ou fartura.
Desenvolvimento, nivel de vida, riqueza, já tem a ver com a forma como se governa. E aí os anti-Jardim têm que engolir "elefantes".
Quanto ao norte, não sei bem o que lhe faltou, mas creio que a geração de homens de negócios da primeira metade do século XX, foi mal substituida. A nova geração, é de políticos, fracos, (média 61%)... O resultado está à vista. A culpa do voto pelo não à regionalização não é só do PSD e PP, mas sim de muita gente, incluindo Mário Soares, Guterres e Louçã.
Anónimo disse…
"Média 61%"??!...
europeu disse…
penso que..aliás,tenho a certeza que não faz sentido inventar-se regiões com fronteiras artificiais, e nomes vindos as vezes não se sabe bem de onde.. para se acabar com regiões artificiais nada endo a ver com as verdadeiras regiões existentes na realidade, a realidade no terreno. há muito tempo que isto sucede..e vai suceder de novo.cada vez mais a realidade no terreno DIFERE do que veremos nos mapas.