A Regionalização dos Estatistas

A Administração Pública que temos é resultado das acções ou inacções dos cidadãos. Podem estes achar que o resultado é mau, mas ela não lhes foi trazida por nenhuma ditadura militar nem por artes de bruxaria. Considerar a Administração Pública como uma entidade autónoma com vontade própria que se impõe na sociedade, só serve para desresponsabilizar os cidadãos, ou mesmo para tentar justificar atitudes não democráticas por parte de quem acha que se conseguiu libertar do "feitiço do Estado".

(...)

Desde há larguíssimos anos, a gestão pública tem, em geral, sido:

- incompetente – senão não se teria chegado a este ponto;
- pouco democrática – os efeitos da escassa participação da sociedade civil têm sido praticamente nulos; o debate público foi claramente abandonado;
- impotente – os meios públicos para actuar são escassos; os privados são desprezados pelas autarquias e pelo poder central.

Apesar de tudo o explicado acima, há ainda quem assuma uma visão estatista das reformas necessárias no Sector Público Administrativo, acreditando na capacidade do Estado (ao seu mais alto nível, ainda que com contributos externos) gerir a sua própria mudança. As melhoras apostas, contudo, são outras: são as que privilegiam sempre o papel da sociedade civil em detrimento do dos gestores públicos.

Muitas pessoas defendem a Regionalização com base em argumentos respeitáveis e motivações compreensíveis, baseados precisamente na incapacidade de evolução demonstrada pelo país. Infelizmente, essa defesa parte frequentemente de uma premissa errada: a de que as regiões precisam de uma estratégia.

Não se compreende. Das três uma:

- ou se aceita que o novo poder regional passe a assumir uma posição dominante na economia (em sentido lato) da região para poder implantar essa estratégia;
- ou se considera viável alcançar um amplo consenso social de modo que a iniciativa privada actue maioritariamente em coordenação para atingir um objectivo comum;
- ou se considera que as hipóteses anteriores são inaceitáveis/irrealistas e portanto a existência de uma estratégia regional, entendida como uma posição dominante no seu desenvolvimento, não é de todo possível.

Só a última hipótese faz sentido. Afinal seria uma estratégia definida por quem, dirigida a quem, implementada por quem?

O que o Estado (central, regional ou local) deve fazer é assegurar que são disponibilizadas as infra-estruturas básicas: transportes, energia, água e saneamento, educação, saúde, etc. Deve também garantir que as regras de convívio em sociedade são cumpridas a nível de urbanismo, segurança, participação cívica, funcionamento saudável da economia de mercado. Deve actuar apenas onde a iniciativa privada não pode, não quer ou não sabe. E, em geral, apenas enquanto não pode, não quer ou não sabe.

Que não haja, por isso, uma estratégia. Basta um Estado que deixe a sociedade civil evoluir por si própria. Nada impede, apesar de tudo, que se tente coordenar esforços, sugerindo áreas de actuação; criando produtos ou serviços complementares aos já existentes; investigando em conjunto; promovendo recursos comuns, sejam eles privados ou públicos; e tudo isto sem forçar consensos nem impor soluções.

Em teoria, até se dispensava a Regionalização. Bastaria a administração local organizada em municípios com dimensão correspondente à dos aglomerados urbanos que na prática existem, apoiados numa malha de freguesias geridas por juntas com as competências adequadas. Ultrapassavam-se desse modo as eternas rivalidades e invejas entre autarcas vizinhos em espaços artificialmente divididos para efeitos administrativos. Mas actualmente há outros factos a considerar, fora do âmbito deste texto.

Que se faça também da Justiça a primeira das prioridades a nível nacional. Se não se podem exigir em tempo útil responsabilidades a quem foge a cumprir as suas obrigações, nenhum sistema funciona. Que adianta estabelecer um plano se depois não há um efectivo controlo sobre aqueles que o deveriam implantar? De que servem as regras se não é possível fazê-las respeitar em tempo útil? Para quê a Regionalização se se continuar com esta falha fatal? Melhorias neste campo teriam efeitos imediatos no funcionamento do país. Sem estarem a ser saudavelmente seguidas as regras de interacção entre os cidadãos e destes com o Estado, é impossível aplicar com eficácia uma reforma, encravada por ausência de ferramentas eficazes para a levar a cabo.

(...)

por, Tiago A Fernandes

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Comentários

Anónimo disse…
Em primeiro lugar, haverá que estabelecer desígnios nacionais, tais como:
1) Soberania (central):
a) Defesa
b) Relações Externas
c) Justiça
d) Fiscalidade
e) Coordenação política
2) Desenvolvimento económico e social (execução regional e local)
3) Conhecimento e tecnologia (execução regional e local)
4) Equilíbrio social (execução regional e local)

Com este enquadramento político, em termos de desígnios nacionais, as funções de soberania serão exercidas pelo governo central que não deixará de estabelecer e exercer funções de coordenação para assegurar o desenvolvimento económico e social, o aprofundamento do conhecimento e o desenvolvimento da tecnologia e, por fim, criar condições para o garantir equilíbrio social.
Os governos regionais garantiriam as restantes funções "executivas" para realizar tudo o que se relacione com os desígnios 2), 3) e 4).
Sómente desta forma é que se conseguirá uma interacção eficaz e directa entre as populações e o que chamam Estado, através das Regiões Autónomas e, mais abaixo, dos Municípios.
Lamento, mas gostaria de poder ter compreendido o texto objecto deste comentário, se não existisse o emaranhado em que a regionalização é tratada. O processo de regionalização, em todos os países, sempre foi complexo e difícil e quando os governos centrais se viram a braços com problemas continuadamente insolúveis é que resolveram baixar a guarda e abrir as portas à regionalização, muitas vezes depois de sérios conflitos.
O regime a propor e a implementar só poderá ser o das Regiões Autónomas.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)