Ideias para o Interior do País

Luis Leite Ramos


INTERIOR OFFSHORE

Como travar o esvaziamento demográfico e o declínio socioeconómico das regiões do Interior? A pergunta tem sido colocada repetidamente nos últimos trinta anos e tem dado origem aos mais variados discursos, políticas e medidas. Quase tantos quantos a criatividade nacional e os fundos europeus permitem: melhoria das acessibilidades; construção de infra-estruturas e equipamentos; oferta de solo industrial a preços simbólicos; redução de impostos e de taxas municipais; criação de sociedades de desenvolvimento regional ou de capital de risco; majoração dos incentivos à criação de empresas e de emprego; subsídios de natalidade, etc. Sem grande sucesso, como o demonstram de forma eloquente todos as estatísticas disponíveis. Daí a interrogação: porque fracassaram essas políticas e medidas?

As razões serão certamente muitas e diversificadas. Não as conhecemos ao certo porque faltam avaliações sérias e rigorosas dos diferentes programas e incentivos. Mas não falta quem, entre dentes, vá dizendo que a principal razão tem a ver com factores geográficos e históricos e que, por maiores que sejam os investimentos públicos, não será possível inverter o processo de “litoralização” e “metropolização“ que perpassa o país.

Uma tese que parece ter muitos adeptos no actual governo, como é público e notório nas chamadas medidas de reorganização e racionalização dos equipamentos e serviços públicos e, muito mais evidente, na concentração de investimentos no âmbito do QREN nas Áreas Metropolitanas, em particular na de Lisboa que, afinal, continua a beneficiar generosamente dos fundos europeus.

É certo que não se pode dizer que, pelo menos no plano da retórica política, o governo tenha esquecido o Interior. Vêm aí mais e melhores acessibilidades, algumas infra-estruturas e equipamentos e incentivos à localização de empresas. Mas não será mais do mesmo? Contribuirão realmente estes projectos e medidas para promover o desenvolvimento duradouro das regiões mais desfavorecidas?

Julgo que não. Por uma razão muito simples é que não respondem de modo eficaz ao seu principal desafio: a criação de riqueza e de emprego qualificado.

Tomemos como exemplo a prometida redução do IRC (10%, ao que parece) para as empresas que se vierem a instalar nos municípios do Interior. Os seus efeitos serão praticamente nulos como já aconteceu com medidas semelhantes. Por um lado, porque embora importante, num país onde poucas empresas pagam impostos e as que pagam (as grandes) estão quase todas sedeadas na capital, este incentivo não será este prémio simbólico que trará ou ajudará a criar mais empresas no Interior. Por outro lado, porque os factores que influenciam as decisões de localização empresarial são, hoje em dia, de outra natureza: oferta e custos de mão-de-obra, conhecimento e inovação, dimensão do mercado, etc..

Porque não pensar então em medidas mais radicais? Como, por exemplo, criar uma gigantesca zona offshore, de Beja a Bragança, onde os impostos sobre as empresas e as actividades económicas fossem diminutos? Uma coisa é certa, as finanças públicas não seriam muito afectadas, sobretudo no imediato. É que, segundo dados do Ministério das Finanças, as receitas de IRC cobradas em 2005 nos distritos de Bragança, Viana do Castelo, Guarda, Vila Real, Portalegre, Évora, Beja e Castelo Branco ascendem a 130 milhões de euros. Um valor irrisório que representa menos de 5% do total do continente e cerca de 1/10 das receitas cobradas nesse mesmo ano no distrito de Lisboa (1300 milhões de euros). E que equivale ao valor despendido na construção de 26 quilómetros de auto-estrada.

Ora, assim sendo, atrevo-me a formular a seguinte proposta: nos próximos 10 anos o Interior abdica de 260 quilómetros de auto-estradas em troca da redução do IRC para, vamos lá, 5%. Certamente que o Ministério das Finanças não se importaria com a troca e, assim o espero, os municípios e as suas populações também não.
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Comentários

Anónimo disse…
Folgo em ver que ainda há pessoas que se preocupam com o que verdadeiramente importa no contexto da Regionalização: a problemática da desertificação das regiões interiores do território português.
A problemática da Regionalização não pode mais ficar-se por uma "guerra" entre o Porto e Lisboa que, embora sejam os dois maiore centros urbanos do país, não deixam de representar uma pequena parte do território português. Ao longo destes últimos 30 anos, a Regionalização foi debatida, metida e tirada da gaveta, mapeada, referendada, apoiada e repudiada. Mudaram os políticos, sucederam-se governos, alguns "notáveis" mudaram inclusive diversas vezes de opinião sobre este tema, fazendo com que Portugal ficasse parado a ver, primeiro Lisboa, depois a Estremadura e Ribatejo, depois o restante litoral evoluir (embora numa escala menor).
Entretanto, entre 1960 e 2001, o Interior perdeu praticamente metade da população. Primeiro, foi a emigração, para a França, a Suíça e a Alemanha, principalmente, depois foram as migrações para o litoral: Lisboa e Porto. Os distritos de Bragança, Vila Real, Guarda, Castelo Branco, Portalegre, Évora e Beja ficaram praticamente vazios. Apenas algumas cidades se afiguram como "oásis" neste "deserto". Só para dar um exemplo:

Entre 1960 e 2001, na Beira Interior:
-O distrito da Guarda perdeu 59 781 habitantes;
-O distrito de Castelo Branco perdeu 108 467 habitantes.
-No total, a Beira Interior perdeu, nestes últimos anos, mais de 150 000 habitantes, o que equivale, por exemplo, à população de cidades como Braga ou Coimbra.

Para além disto, faliram empresas, o desemprego aumentou, não houve investimento, e a população acabou por envelhecer. O índice de marginalidade funcional só é considerado crítico nas regiões do interior. O índice de envelhecimento nas regiões de Trás-os-Montes e Alto Douro, Beira Interior e Alentejo foi superior a 170 %, sem que qualquer concelho fique de fora desta realidade.
Para os sucessivos governos, as soluções pareciam fáceis. Até 1990, nem sequer havia problema, diziam os políticos. A partir de 1990, as soluções pareciam fáceis: a "política do betão" resolveria tudo. Abriram-se vias-rápidas (IP2, IP3, IP4 e IP5), que se revelaram um verdadeiro desastre, ceifando milhares de vidas. Foram o problema em vez da solução. Entretanto, continuaram-se a fechar escolas, serviços de saúde, empresas, linhas de caminho de ferro. Resultado: a população decresceu cada vez mais.
Estamos em 2008. O Interior bateu aparentemente no fundo. Em vez de trazer mais infra-estruturas para o Interior, os governos só se preocupam com auto-estradas. E, claro, em construir megalomanias como o aeroporto de Alcochete, as pontes de Lisboa e o TGV no litoral.
O Interior precisa de verdadeiros incentivos. Os responsáveis políticos, os empresários e a população têm-se acomodado com esta situação de "litoralização", esquecendo as grandes desvantagens que este processo traz, tanto para o Litoral como para o Interior. Já percebemos que, a nível nacional, os responsáveis maiores da nação não estão interessados em mudar de políticas: o centralismo continua a imperar. Por isso, só há uma saída, que é uma inevitabilidade: a REGIONALIZAÇÃO.
Cada vez mais o povo percebe isso, e se começa a mobilizar para estas questões, demonstrando saudável independência dos partidos políticos. Muita gente hoje mostra que não está de acordo com o centralismo, mas tembém não quer uma Regionalização administrativa sobre as 5 "regiões-plano". Tudo isto porque há grandes fracturas no território nacional.
Apesar de ser mais falada, a fractura Norte-Sul ou Porto-Lisboa é mais cultural do que económica, visto que a área metropolitana do Porto, assim como toda a zona de Entre-Douro e Minho, se tem desenvolvido mais ou menos bem, como é exemplo o crescimento da população, a melhoria dos níveis de vida, o crescimento de cidades como Braga, Viana do Castelo, Guimarães ou Barcelos, a modernização das infra-estruturas e das empresas. Tudo bem que há problemas, não o nego. E problemas graves. A emigração nesta zona é muito forte, há cerca de 100 000 pessoas a trabalhar na Espanha, por exemplo, o que é sinal de que as coisas não vao bem.
Mas a prioridade deve ser outra. A maior fractura no nosso país é entre regiões litorais desenvolvidas, a ganhar população, com menor desemprego, com excelente cobertura em termos de infra-estruturas, e com níveis de vida medianos; e as regiões do Interior, a perderem população galopantemente, e a desertificarem-se, num processo que se pode tornar irreversível.
Por isso, é um erro tornar a Regionalização numa luta centrada no Porto. A Regionalização não pode ter centros, deve ser uma causa mobilizadora do país, de norte a sul, do litoral ao interior. Agora, os habitantes destas regiões esquecidas sentem que a Regionalização é para o Porto, que nada ganham com isso. Actualmente, fala-se na centralização de fundos e recursos em Lisboa: com 5 regiões, vai-se falar daqui a uns anos na centralização de fundos e recursos em Coimbra e no Porto. E o Interior? Vai chegar a um ponto sem retorno!
Precisamos de medidas urgentes para atrair investimento e população para o interior. Concordo com a proposta de Luís Leite Ramos: 5% de IRC. Mais: reduções idênticas em impostos como o IVA e o IRS, e verdadeiros incentivos à natalidade. Para compensar estas descidas, bastaria não construir mais uma auto-estrada, por exemplo o IC2 entre Coimbra e Oliveira de Azeméis, cuja necessidade é duvidosa (bastaria construir variantes á EN1 na Mealhada e em Albergaria). Não precisamos de mais auto-estradas, em termos viários temos bons acessos: precisamos é que esse dinheiro seja gasto em recuperação de estradas nacionais, regionais e municipais, que desempenham um papel importantíssimo nestas regiões. E, principalmente, precisamos de um transporte ferroviário de qualidade que ligue as cidades médias do Interior (Bragança, Chaves, Vila Real, Bragança, Mirandela, Guarda, Covilhã e Castelo Branco) às maiores cidades do país, com tempos e custos compensatórios. Deveria ser essa a aposta no Interior.
É um pequeníssimo esforço para o Estado, mas uma grande mais-valia para o interior. A vontade política que falta para estas medidas sobra para cortes cegos como o fecho de serviços de educação e saúde, e de linhas de caminho-de-ferro, que condenam ainda mais o interior.
Se estivermos à espera do poder central, podemos esperar sentados. Sentados não, porque nos estamos a afundar cada vez mais. É preciso fazer força para trazer as decisões para as regiões do interior. Para onde elas realmente são precisas. Não para uma cidade em específico, mas para cada região, com serviços distribuídos, com maior autonomia para as regiões do Interior.

Por isso, defendo a única solução para romper o isolamento, a Regionalização a 7 Regiões:

*Entre-Douro e Minho
*Trás-os-Montes e Alto Douro
*Beira Litoral
*Beira Interior
*Estremadura e Ribatejo
*Alentejo
*Algarve

Haja vontade. Pelo Interior, pelo futuro de Portugal.
Afonso Miguel, ex-Anónimo (Beira Interior)
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Como sabem o interior do nosso País, em geral, assim como certas zonas do litoral-interior, têm sido consideradas "off" em tudo o que se relacione com o desenvolvimento, mesmo que que o cubram de autoestradas de uma ponta à outra.
Por iso, podem ser designadas por "regiões off-shore do subdesenvolvimento e do abandono".
Por todas as razões que tenho desenvolvido neste "blogue", a par das do Anónimo da Beira Interior, a única solução de regionalização que tem capacidade d eeliminar tais desequilíbrios é a que reside na implementação das 7 Regiões Autónomas.
O resto é perder tempo e recursos e é, também, insistir em NÃO SOLUÇÕES POLÍTICAS OU ESTRATÉGICAS, MAS TÃO SOMENTE A "ENTRETER O PESSOAL".

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)