O afundamento do Norte

Pedro Santos Guerreiro
"Jornal de Negócios"


A parábola do Porto e do aeroporto



"O problema mais importante que o país tem pela frente é o afundamento do Norte". Disse-o João Cravinho, na entrevista obrigatória ao Público/Renascença/RTP2, argumentando que o Porto ganhará com o TGV a litoral muito menos do que o que perderá com o novo aeroporto a sul do Tejo. Sobre o aeroporto Sá Carneiro, Cravinho não falou. Mas cinco "líderes do Norte" vão amanhã defender a "regionalização" aeroportuária.

O ex-ministro socialista sempre defendeu a Ota porque essa localização reequilibraria o desenvolvimento entre Lisboa e Porto. Com o aeroporto em Alcochete, diz, Lisboa ganha uma nova alavanca de crescimento "e deixa o Norte entregue à sua sorte".

Má sorte: o fosso entre as duas cidades agrava-se e muito. Os dados de ontem do INE mostram que, na última década, o Norte foi a única região que perdeu riqueza, face à média, por habitante do País. O Norte tem 80% da riqueza média por habitante do País, a região de Lisboa tem 140%. O fosso transporta-se para as "capitais": o Grande Porto está na média nacional (100% do PIB per capita português), a Grande Lisboa está nos 165%.

O fundamentalismo anti-Porto (incluindo a soberba de Lisboa rotular o Porto com o mesmo complexo de inferioridade que sente face a Madrid) é tão cego como o pró-Porto. Mas só por cretinice se pode não ver neste afundanço do Norte um problema nacional. Porque não é macrocefalia, é elefantíase, um inchaço desmesurado em Lisboa, aquilo de que Portugal padece. É um crescimento pequeno e desequilibrado, um empobrecimento regional contra um centralismo obcecado. E a responsabilidade é de quem Governa em Lisboa e de quem governa no Porto.

Quem lá governa são Rui Rio (Junta Metropolitana), José António Barros (AEP), Rui Moreira (ACP), António Marques (AIMinho) e Valdemar Coutinho (AIDA), que vão amanhã assumir-se como líderes de uma plataforma que defende a concessão a privados do aeroporto Sá Carneiro, fora da privatização da ANA.

Esta emancipação pode ser vista de três formas: a irrelevante, de que se trata de proteccionismo regional; a interesseira, de que se está a reivindicar negócios à medida; ou a interessada, de que a concorrência que o Porto quer nos aeroportos pode ser útil a todo o País.

A ANA vai ser entregue a quem ficar com o novo aeroporto de Lisboa. Se a ANA continuar a incluir os três aeroportos continentais, não haverá concorrência interna. Além disso, o esforço financeiro brutal, que o novo aeroporto exige, pode implicar que a gestão dos outros aeroportos, se feita pela mesma empresa, seja orientada para a recuperação do investimento em Lisboa, em vez do aumento da competitividade no Porto e no Algarve, face à respectiva concorrência espanhola, na Galiza e na Andaluzia.

É também contra isto que aquele grupo se manifesta. Os estudos encomendados pela Junta Metropolitana defendem o modelo de parceria público-privada com maioria de capitais locais, seguido da entrega à gestão exclusivamente privada e autonomizada da restante rede aeroportuária. Mesmo não esquecendo que a Sonae, a Soares da Costa e todos os interessados no Sá Carneiro dizem que o aeroporto só é rentável se o investimento que lá for feito continuar a ser pago pela ANA...

O Norte já "perdeu" o aeroporto de Lisboa e quer agora ganhar o aeroporto do Porto. Esta privatização da ANA ainda vai dar muito que falar. E se o Porto se organiza como força de pressão, neste "grupo dos 5" ou noutro qualquer, está também a testar a sua própria influência e poder. Vale quanto?
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Comentários

Anónimo disse…
Por amor de deus, parem com isso.
Se querem gurra façam uma Porto-Liboa, e não Norte Lisboa.
Philipp disse…
Não me convenço que o Aeroporto na Ota seria vantajoso para o Norte. Quanto muito o contrário. Nós não queremos ir lá a baixo apanhar o avião.
Parece-me que João Cravinho está a "atirar barro à parede" para talvez encobrir um interesse económico que tivesse na Ota e, ao mesmo tempo, cair nas boas graças dos regionalistas do Norte.
A mim não cola.
Anónimo disse…
E se fôssemos mais optimistas, solidários? menos egoístas, menos pretensiosos? Quando perderemos esta mania de nos pormos todos na ponta dos pés cuspindo postas de pescada?

Que loucura é esta pela regionalização?

Portugal está a atravessar uma fase difícil, é certo, mas ainda bem que temos um Primeiro Ministro apaixonado pelas suas funções, pelo progresso do país. Portugal está a mudar, daqui a 20 anos seremos um país diferente para melhor, quer se queira ou não, algumas iniciativas vão transformar para melhor Portugal.

Se este PM optar mesmo pela regionalização irá comprometer tudo, porque vai abrir caminho a uma parte da elite política, económica e cultural que se vê a perder o combóio e o TGV...

Regionalização... Vejam o que se passa em Espanha, na Bélgica, na Itália.
Anónimo disse…
O Minho e Trás-os-Montes saem prejudicados nesta associação que a Região do Grande Porto está a tentar fazer artificialmente, pois são situações claramente distintas.
Enquanto a R. do G. Porto está a todos os niveis acima da média nacional, o Minho e Trás-os-Montes estão muito abaixo.
Por isso Minhotos e Trasmontanos é preciso não alinhar nessa tentativa de centralizar no Porto.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
caros Municipalistas,

A emissão de certas opiniões, oriundas de intervenções jornalísticas, tem de ser analisada por duas vertentes:
(1) O local da sua origem
(2) A sua autoria
Não vale a pena comprar discussões estéreis sobre o que alguns consideram ser a regionalização, quando o que está em causa são artigos jornalísticos sobre temas políticos ou outros fora dos locais verdadeiramente interessados na regionalização (nem Lisboa, nem muitos dos que lá vivem se interessam pela implementação da regionalização), nem quando a autoria de certos artigos não tem a profundidade que deveria oferecer aos leitores num quadro pedagógico da regionalização que não simples tabuleiro de influências.
No artigo do JdN,o que está em causa, afinal, é saber se a influência do Norte vale alguma coisa (talvez um pouco assustadamente), mesmo depois de "arranjada" a gestão privada para o Aeroporto de Pedras Rubras, como se esta decisão governamental esperada e favorável possa contribuir para uma regionalização efectiva e enobrecedora da região norte.
Coitados.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Pista do aeroporto Sa Carneiro
Pista única do aeroporto Sá Carneiro. Para aumentar o número de operações por hora (descolagens e aterragens) neste excelente aeroporto só falta mesmo ampliar o incompleto taxiway disponível e implementar um já inadiável sistema de auxílio à aterragem de precisão (ILS) -- que a ANA não implementou até agora por motivos de perigosa estratégia política.
Anónimo disse…
Caro Anónimo disse das 04:11:00 PM, do dia da Graça de 7 de Agosto de 2008,

Para a resolução dos magnos problemas que têm vindo a ser aoplados ao Aeroporto de Pedras Rubras, só encontro uma única solução: os seus críticos ("quem desdenha que comprar") que decidam construir um novo aeroporto ainda mais eficaz e eficiente que o actual na região do Porto ou do norte, como lhe queiram chamar, até com a vantagem de poder concorrer com o novo de Lisboa, vendo assim quem cabedais financeiros e de gestão suficientes para levar em diante tal projecto.
Mas que o façam sem pedinchar qualquer apoio porque um projecto de investimento, ainda por cima privado, para além de excelente tem de valer por si próprio e não estar dependente de pedinchices próprias da recolha da oblata de uma qualquer paróquia para financiamento de uma obra social ou religiosa.
Quanto ao resto, toda a gente já está farta de saber que qualquer inovação importante, grande investimento económico ou cultural/social a NORTE, a LESTE, a OESTE, mais a SUL (mangas, sistema ILS, estação de metro de ligação ao earoporto, etc.) provoca cócegas a quem está politicamente instalado na cidade-capital, mesmo que seja oriundo de outras regiões do País.
Claro que são entendimentos, entendimentos diferentes, mas não vale a pena perder o mínimo de tempo com tais protagonistas da inveja, da maldicência e da indiferença política, exactamente por não ser um sinal de inteligência, nem de educação, nem ainda de elegância nas relações sociais e políticas, sendo a melhor solução IGNORÁ-LOS ETERNAMENTE.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)