A caminho da Regionalização

Governo quer autarcas a testar regiões em 2009

Algarve vai ser teste administrativo. Cinco regiões têm consenso, diz Governo

"JN"
DAVID DINIS


A lei sobre o associativismo municipal, que esta segunda-feira entra em vigor (e que abre caminho aos novos órgãos das comunidades intermunicipais em 2009), reforça os seus poderes sempre que as autarquias se juntem numa das cinco regiões-plano.

A ideia é permitir que, em alguns casos, a acumulação de competências reproduza em parte os poderes que as futuras (e eventuais) regiões administrativas venham a ter. Não é por acaso, aliás, que a própria lei tem um capítulo próprio, que refere precisamente a regionalização: "Os órgão das CIM [comunidades intermunicipais] cuja área corresponda a uma NUT II [as cinco regiões administrativas do país], exercem igualmente as competências dos números seguintes, enquanto não forem instituídas em concreto as regiões administrativas".

O ponto era inexistente na reforma anterior, até porque o Governo que o instituiu era contra a regionalização. O que, claro, não acontece agora.

Não será, assim, coincidência, que nas comunidades já acertadas exista um caso em que este acréscimo de poderes vai ser uma realidade, já em 2009: o Algarve. O caso leva até Vital Moreira, um dos homens próximos de Sócrates, regionalista, a deixar a pista: "No caso do Algarve, a respectiva CIM tem poderes reforçados, de natureza regional, o que prefigura claramente uma proto-região administrativa, com poderes próprios e órgãos de governo próprios", diz no seu blogue pessoal.

Eduardo Cabrita, secretário de Estado do Poder Local e autor da legislação, corrobora a tese ao JN: "A lei dá, nesses casos, poderes reforçados. O que é que isto tem em comum com a regionalização? Cria coerência à organização do Estado, seguindo um modelo de cinco regiões, que já é consensual", alega. As mesmas que, aparentemente, o PS já tem por boas para levar a um próximo referendo às regiões, pondo de parte as oito regiões votadas em 1998.

O próprio Estado "já evoluiu nesse sentido", garante Eduardo Cabrita, apontando exemplos das áreas das florestas ou dos portos - "já com ganhos de racionalização". E deixa até um desafio aos autarcas pelo país: que se unam na mesma forma em torno da sua região - "se os outros [para lá do Algarve] quiserem organizar-se assim também, terão vantagens". É que, daqui para as regiões 'de facto', fica a faltar apenas "uma voz política própria", garante.

Mas que competências extra ganha, nesse caso, esta região de teste? A capacidade de participar nos planos regionais de ordenamento, de infra-estruturas de saneamento, transportes, águas, energia e resíduos, ou mesmo ao nível da gestão das bacias hidrográficas. A legislação não lhes entrega poderes de voto, mas já lhes entrega competências de planeamento e de participação em entidades públicas.

Nada que convença, ainda assim, o autor da anterior legislação. Miguel Relvas, do PSD, acusa a lei que agora entra em vigor de "nada" fazer para estimular verdadeiros órgãos de natureza supra-municipal. Porquê? Porque "a partir do momento em que não têm órgãos próprios", sendo seus membros os autarcas e não pessoas acima das autarquias, "não lhes dá uma lógica de coesão, mas de cada um pelo seu município", afirma Relvas ao JN.

Certo é que as novas comunidades têm até ao final do ano para aprovarem os seus novos estatutos. Depois, será tempo de eleger as assembleias intermunicipais e conselhos executivos, que voltarão a mudar em Novembro de 2009, por consequência das eleições autárquicas.
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Comentários

Mais um pequeno passo legislativo, preparando o "grande passo" político!...
hfrsantos disse…
Mais um pequeno passo timido no caminho a uma regionalizaçao plena com direito a eleger um Governo Regional com poderes administrativos e legislativos a escala regional.

Com esta lei o Governo Central da a oportunidade aos municipios dos Distritos de Bragança e Vila Real de se organizarem de forma concisa para formarem uma Regiao separada da Regiao Norte se essa for a vontade dos residentes e politicos locais.
Mesma oportunidade para os municipios dos distritos de Guarda e Castelo Branco de se organizarem para formarem uma regiao separada da Regiao das Beiras.

Se os nossos autarcas forem empenhados e reinvidicativos poderemos dar passos mais largos no sentido da Regionalizaçao para nao perdermos tanta distancia em relaçao ao desenvolvimento europeu.
Anónimo disse…
Esta é uma lufada de ar fresco num país que parecia encaminhado num processo cada vez mais intenso de centralização.

Estas comunidades inter-municipais servem de estágio, de preparação dos autarcas e das populações na realidade da gestão supra-municipal e regional, por forma a preparar órgãos de governo autónomos.

Esperemos que os poderes concentrados em Lisboa não deixem de dar o passo futuro no sentido da assunção de maiores poderes regionais: nomeadamente a questão dos fundos e da gestão dos impostos, pontos importantíssimos na autonomia municipal.
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Os comentários já escritos apontam para a realização de um pequeno passo em direcção ao que designam por regionalização. Com efeito, trata-se de um "passo pequeno", mas na direcção errada da regionalização que se pretende ao serviço do desenvolvimento e da convergência real em relação aos países mais evoluidos da União Europeia ou fora dela.
Trata-se de uma estratégia política insuficiente, demonstradora de muito receio dos poderes políticos centrais, ao intervirem no condicionamneto da criação das CIM (comunidades Inter-Municipais) à sua integração nas designadas Regiões-Plano como suporte organizativo (não político) das futuras regiões administrativas.
Se alguma dessas CIM a criar, intersectar duas ou mais regiões não será autorizada e não beneficiarão os municipios envolvidos das capacidades admnistrativas regionais que lhes seriam atribuidas caso respeitassem o estipulado na lei que agora entrou em vigor.
Para impelmentar futuramente a regionalização, o Governo ainda precisa de intermediários - as CIM - para poder controlar não o poder político autonómico e regional nascente mas, imagine-se, apenas uma descentralização administrativa subordinada, concisa e de ordem subalterna.
Para isso, dá continuidade aos habituais protagonistas políticos, alguns dos quais têm dado os piores exemplos de governação municipal e até lhes solicita, pelos vistos, empenhamento e reivindicação para garantir que as metas correspondentes (sempre de natureza admnistrativa ou burocrática) sejam atingidas.
Esta estratégia política é errada e parece até envergonhada nas condições da sua implementação e nem conseguirá contribuir para a reduzir a distância em relação ao desenvolvimento europeu como tem vindo a ser afirmado.
Por isso, em termos da regionalização, a criação das CIM não são mais que um atalho estreito e de pésima qualidade para se fazer o percurso exigente e sem sobressaltos da regionalização e, como a regionalização que muitos pretendem que seja simplesmente administrativa está atrasada mais de 32 anos (escandalosamente) não se vislumbra que as recentes decisões possam ser, assim, uma lufada de ar fresco para a regionalização.
Tais decisões serão mais uma versão actual das manutenção das condições de funcionamento e de reforço dos órgãos de poder numa perspectiva centralizada e centralizadora, com recurso a outras roupagens (as CIM) mesmo que sejam transitórias.
Esta transitoriedade tem a ver com o que é considerado uma promessa traduzida por declarações dos respectivos responsáveis políticos ao assumirem o compromisso de colocar a dimensão política deste "movimento" na outra legislatura.
Por outro lado, agora até se afirma categoricamente a formação de proto-regiões administrativas (nada disto está na Constituição), as quais constituem a face envergonhada e receosa de uma política de regionalização mesmo administrativa como atitude política ainda não definitivamente assumida para ser implementada com convicção e eficácia.
Com órgãos supramunicipais liderados por autarcas não se conseguirá fazer uma espécie de "corte de operações políticas" mas consolidar as actuais "nuances" administrativas do exercício de um poder político que nunca deixará de ser, assim, centralizado e centralizador.
Portanto, mesmo que fosse seu defensor, não ficaria muito entusiasmado com este tipo de medidas políticas sobre a regionalização administrativa, antes ficaria muito mais preocupado com a evolução que as "coisas estão a levar".
No quadro de todas estas incongruências, limitações, continuidades e adiamentos, "exemplarmente" vertidas em letra de Lei, o índice de preocupação só é comparável com a forte convicção da eficácia política da regionaliação autonómica, sem quaisquer intermediários administrativos mas com a participação de protagonistas políticos de nova geração que nos ensinem a distinguir crescimento de desenvolvimento, casuísmo de estratégia, mediocridade de mérito, salário mínimo de salário de mérito, cultura de "show off" ou exibicionismo, cultura cívica de má-educação, inveja de cooperação, etc., etc.

Assim seja, amen.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)

PS - Se a regionalização administrativa for para a frente, não pensem que isto representa para mim uma derrota, nem sequer adianta nada referi-lo nos escritos futuros. O empenhamento colocado na defesa da regionalização autonómica é apenas justificado pelo reconhecimento do seu importante e ÍMPAR papel nas acções de desenvolvimento que, como repetidamente se tem escrito, é muito, muito mais que crescimento económico e das quais precisamos como do "pão para a boca" para garantir convergência real, independência e cidadania; este conjunto de objectivos constitui a tal "luz ao fundo do túnel, sem ser a habitual do comboio" (tem sido a do comboio, há dezenas, dezenas e dezenas de anos).