O jornalista Manuel Carvalho escreveu no Público, segunda-feira passada, que o “Primeiro-ministro nada faz de diferente de muitos que o antecederam no cargo, incluindo Cavaco: na oposição foi um fiel devoto da devolução de poderes às regiões; depois de eleito, enche-se de dúvidas e não se compromete.” Está tudo dito!
Sempre que saio ao terreiro em defesa da regionalização política e administrativa do país sou apedrejado – apedrejado com cartas – por oradores sagrados adeptos do centralismo enraizado num municipalismo obsoleto e extenuado. Opinantes que, empunhando a sacra fisga, disparam de rajada: o povo já excomungou, rejeitando de cruz, em referendo, a instituição das Regiões Administrativas. Uma vez não, não ad perpetuam!
Eu respondo (e lá vou respondendo a todas as cartas) apenas por mim pois não sei, de todo, o que o povo, neste momento, quer. É verdade que o povo recusou, no século passado, em referendo, a regionalização. Pudera. Perguntaram-lhe, manhosamente, se a nova estrada a rasgar deveria estraçalhar a leira das hortas ou a courela de pasto dos animais. O povo, avesso a raios que o partam, recusou a tal nova estrada, manhosamente alcunhada de regionalização, e continuou a andar a pé. Pior a cura que o mal!
Como escreveu Abílio Ferreira no jornal Expresso a 18 deste mês, a Região Norte – a nossa Região Norte que tampouco Região é – “acolhe a maior fortuna do país (Américo Amorim), o maior conglomerado privado (Sonae), o maior exportador (Qimonda) e lideres sectoriais e mundiais como a RAR, Cin, Sonae Indústria ou Corticeira Amorim” e, não obstante, “a região regista uma perda acelerada de poder de compra, ao ponto de apresentar o rendimento “per capita” mais baixo da União Europeia a 15.“ Que fadário o nosso!
Sei que a regionalização do país não é vacina para todas as maleitas e, menos ainda, árvore das patacas. Todavia, creio de fé e razão, que uma Região Norte com cabeça, tronco e membros haveria de encontrar um caminho para a Linha do Douro – via-férrea estruturante para a Região Norte. Sim, estruturante para a Região Norte. Apesar de o país centralista não enxergar o quanto. Se o Terreiro do Paço enxergasse além da sua sombra – arregalemos o olho – o troço do Pocinho a Barca de Alva em tempo algum teria sido abandonado. Mas lá que foi abandonado, foi!
A Linha do Douro tem que ser uma artéria e não um vaso capilar. É uma via estratégica para fazer circular o sangue por toda uma vasta região, incluindo o Vale do Côa ou o Douro Vinhateiro – Patrimónios da Humanidade. A qualificação de toda a Linha do Douro, assumida como eixo ferroviário fundamental para ligação da grande área metropolitana do Porto, via Barca de Alva, até Salamanca e Valladolid permitindo, a partir daí, o acesso à Europa, é uma questão que, cá para a minha pessoa, só uma Região Norte emancipada é capaz de entender e tomar em mãos.
António Barreto escreveu que “o caso do caminho-de-ferro, do Porto até Barca de Alva e depois prolongado até Espanha, é um projecto de futuro, é um projecto ecologicamente recomendável, culturalmente interessante.” É tudo isto e é, ou deve ser, um traço de união entre o povo nortenho – um desígnio para a Região Norte que está a amanhecer. Creiamos!
Creiamos, como António Gedeão, “que o sonho comanda a vida, / que sempre que um homem sonha / o mundo pula e avança / como bola colorida / entre as mãos de uma criança.” |
Comentários
Precisamos, apenas, que os nossos políticos nortenhos que ainda por aqui se mantêm se unam e os que se encontram em Lisboa não nos tenham já abandonado... È preciso acreditar! Senão, qualquer dia é precisa alargar Lisboa, para que nos possamos mudar tds para lá, afinal:queremos emprego é la.. queremos riqueza, é la...queremos um bom sistema de saúde e educação, é lá....
O Norte é formado por litoral e interior,pouco e tarde ligados, enquanto acabaram com muitas linhas férreas, como a referida, que é imprescindível ao desenvolvimento do Norte e nas ligações de pessoas e mercadorias a Espanha e à Europa. Com maus transportes públicos e más estradas, além de outras carências, como pode o Norte desenvolver-se, criar emprego e qualidade de vida se os políticos eleitos pelo Norte não são de cá ou se venderam aos patrões de Lisboa, salvo raras e honrosas excepções. Por isso é preciso escolher de vez: igualdade em Portugal para os habitantes do Norte (queiram os privilegiados da zona de Lisboa e seus partidários,sejam eles de onde forem)ou então teremos de procurar uma solução alternativa,sem Lisboa.
Portugal primeiro, Lisboa não!
Cumprimentos pelo trabalho e pela paciência em responder a surdos colonizados pelo centralismo lisboeta.
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,
O texto deste "post" é tanto elucidativo como importante.
Sobre a regionalização, só poderá ser autonómica (7 Regiões Autónomas); se não for implementada a bem será a mal, não por efeito de acções desproporcionadas de cada uma das Rgeiões ou concertadamente de todas, mas por via de uma incontinência e descontrolo na gestão política das grandes centralidades actuais, chamem-lhe Áreas Metropolitanas ou lá o que for.
Sem mais nem menos.
Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Quanto à Regionalização, nada de mais errado pensar-se que o referendo de 1998 foi para aceitar a Regionalização ou deixar de a aceitar; a Regionalização ESTÁ na Lei, o que não está lá é a definição das regiões geográficas. Num país que se quer justo, não sei o que são os açorianos e os madeirenses a mais que eu, que sou trasmontano, para terem Governo Regional e Trás-os-Montes não.