Até que haja Regionalização, os deputados e os governadores civis vão continuar a ser as vozes políticas mais audíveis de cada região a nível nacional. Por isso, a formação de listas de deputados ao Parlamento reveste-se da máxima importância, não só para um partido, como para toda uma região. O chamado «pára-quedismo político», ou seja, a eleição de deputados por círculos eleitorais com os quais pouco ou nada têm a ver é, portanto, bastante prejudicial para as regiões que, assim, ficam representadas no Parlamento nacional por deputados sem conhecimento de causa e que, muitas vezes, nem sequer se dignam a visitar o distrito por onde foram eleitos. Há vários anos que o «pára-quedismo político» é apregoado como um alvo a abater pelos diversos partidos. Porém, eleição após eleição, a situação repete-se, sendo o fenómeno transversal a todas as forças políticas, da esquerda à direita. Na noite de dia 24 de Julho, foram anunciadas as listas do Partido Socialista para as próximas Legislativas. A maior surpresa é mesmo a proliferação incrível de candidaturas «pára-quedistas», em muitos círculos eleitorais. Chega-se ao cúmulo de a maioria dos cabeças-de-lista não ter ligações fortes ao distrito pelo qual se candidata.
O caso mais sonante é o de Francisco Assis. Natural de Amarante, fez toda a sua vida política no distrito do Porto, sendo uma das figuras de proa da política da sua região. Foi presidente da distrital do PS/Porto, e deputado europeu. Agora, é candidato pelo círculo eleitoral da Guarda, e, ainda por cima, foi uma escolha pessoal de José Sócrates para o distrito, ao qual, registe-se, nunca teve qualquer ligação. O fenómeno de «pára-quedismo político» foi tal que, ontem, a meio da reunião de onde sairiam as listas, Assis garantia que iria ocupar o 7º lugar da lista pelo círculo do Porto. Segundo se consta, o nome de Assis terá surgido para resolver uma disputa política no distrito da Guarda pela ordenação dos lugares dos deputados.
Outro caso a registar é o de Ana Jorge, a actual ministra da Saúde. Pediatra, fez toda a sua carreira profissional e política em Lisboa, de onde se destaca a presidência da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo. É cabeça de lista pelo círculo de Coimbra.
Pelo Porto, Alberto Martins é outro nome a gerar polémica. Escolhido por pressão directa de Manuel Alegre, fez a sua carreira académica em Coimbra, sendo natural de Guimarães e estando há muito radicado em Lisboa.
No círculo eleitoral de Aveiro a cabeça-de-lista é Maria de Belém Roseira, nascida no Porto, licenciada em Coimbra, e com a carreira política a desenrolar-se em Lisboa. Em Braga, António José Seguro, um dos maiores defensores da Beira Interior, natural de Penamacor e com a sua carreira política a desenrolar-se entre a Guarda, Castelo Branco e Lisboa. Pelo círculo de Faro, João Soares é o cabeça-de-lista, sendo que o antigo autarca de Lisboa, sendo um lisboeta de gema, poucas ligações terá ao Algarve. Pedro da Silva Pereira, minstro da Presidência e lisboeta, lidera a lista por Vila Real.
Estes são os exemplos mais sonantes do pára-quedismo político na primeira lista apresentada dos dois maiores partidos portugueses. E estes nomes apenas resultam da análise dos cabeças-de-lista. Resta ver, na prática, depois dos votos contados, como tudo irá ficar. Curioso é que, quando questionados sobre estes fenómenos, os partidos encontrem as mais estranhas razões para os justificar. Por exemplo, Assis, questionado sobre a sua queda de pára-quedas na Guarda, justifica-se dizendo que a escolha de figuras nacionais para alguns círculos eleitorais é uma «tradição da política portuguesa». Nas últimas eleições, em 2005, Zita Seabra, quando questionada sobre qual a sua ligação ao distrito de Coimbra, por onde foi cabeça-de-lista pelo PSD, justificou-se relembrando que o seu padrinho fora treinador da Académica de Coimbra, e seleccionador nacional. A outra cabeça-de-lista por Coimbra em 2005, Matilde Sousa Franco (PS), em resposta à mesma questão disse que «foi aqui (em Coimbra) que me apaixonei pelo meu falecido marido».
Pois bem, já que é assim, cumpra-se a «tradição», e que proliferem os «pára-quedistas». Mas quem perde são os portugueses, quem perde são as regiões, cada vez menos ouvidas, e cada vez mais distantes do poder central. Não está em causa a competência das pessoas, está sim em causa a proximidade destas, e da própria política com os cidadãos. Cada vez mais as regiões precisam de ter voz no Parlamento, e cada vez menos essa voz lhes é concedida.
Afonso Miguel
O caso mais sonante é o de Francisco Assis. Natural de Amarante, fez toda a sua vida política no distrito do Porto, sendo uma das figuras de proa da política da sua região. Foi presidente da distrital do PS/Porto, e deputado europeu. Agora, é candidato pelo círculo eleitoral da Guarda, e, ainda por cima, foi uma escolha pessoal de José Sócrates para o distrito, ao qual, registe-se, nunca teve qualquer ligação. O fenómeno de «pára-quedismo político» foi tal que, ontem, a meio da reunião de onde sairiam as listas, Assis garantia que iria ocupar o 7º lugar da lista pelo círculo do Porto. Segundo se consta, o nome de Assis terá surgido para resolver uma disputa política no distrito da Guarda pela ordenação dos lugares dos deputados.
Outro caso a registar é o de Ana Jorge, a actual ministra da Saúde. Pediatra, fez toda a sua carreira profissional e política em Lisboa, de onde se destaca a presidência da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo. É cabeça de lista pelo círculo de Coimbra.
Pelo Porto, Alberto Martins é outro nome a gerar polémica. Escolhido por pressão directa de Manuel Alegre, fez a sua carreira académica em Coimbra, sendo natural de Guimarães e estando há muito radicado em Lisboa.
No círculo eleitoral de Aveiro a cabeça-de-lista é Maria de Belém Roseira, nascida no Porto, licenciada em Coimbra, e com a carreira política a desenrolar-se em Lisboa. Em Braga, António José Seguro, um dos maiores defensores da Beira Interior, natural de Penamacor e com a sua carreira política a desenrolar-se entre a Guarda, Castelo Branco e Lisboa. Pelo círculo de Faro, João Soares é o cabeça-de-lista, sendo que o antigo autarca de Lisboa, sendo um lisboeta de gema, poucas ligações terá ao Algarve. Pedro da Silva Pereira, minstro da Presidência e lisboeta, lidera a lista por Vila Real.
Estes são os exemplos mais sonantes do pára-quedismo político na primeira lista apresentada dos dois maiores partidos portugueses. E estes nomes apenas resultam da análise dos cabeças-de-lista. Resta ver, na prática, depois dos votos contados, como tudo irá ficar. Curioso é que, quando questionados sobre estes fenómenos, os partidos encontrem as mais estranhas razões para os justificar. Por exemplo, Assis, questionado sobre a sua queda de pára-quedas na Guarda, justifica-se dizendo que a escolha de figuras nacionais para alguns círculos eleitorais é uma «tradição da política portuguesa». Nas últimas eleições, em 2005, Zita Seabra, quando questionada sobre qual a sua ligação ao distrito de Coimbra, por onde foi cabeça-de-lista pelo PSD, justificou-se relembrando que o seu padrinho fora treinador da Académica de Coimbra, e seleccionador nacional. A outra cabeça-de-lista por Coimbra em 2005, Matilde Sousa Franco (PS), em resposta à mesma questão disse que «foi aqui (em Coimbra) que me apaixonei pelo meu falecido marido».
Pois bem, já que é assim, cumpra-se a «tradição», e que proliferem os «pára-quedistas». Mas quem perde são os portugueses, quem perde são as regiões, cada vez menos ouvidas, e cada vez mais distantes do poder central. Não está em causa a competência das pessoas, está sim em causa a proximidade destas, e da própria política com os cidadãos. Cada vez mais as regiões precisam de ter voz no Parlamento, e cada vez menos essa voz lhes é concedida.
Afonso Miguel
Comentários
Artigo 152.º
(Representação política)
(...)
2. Os Deputados representam todo o país e não os círculos por que são eleitos.
Cumprimentos,
Para que servem então os círculos eleitorais? Não existe uma relação directa entre o número de deputados eleitos em cada círculo e a sua população? O melhor era fazer um círculo único e acabava-se a hipocrisia. Perdoe-me o atrevimento, mas justificar toda esta palhaçada com a constituição não me parece avisado. Apesar de absurdo e intestinamente centralista, o preceito constitucional tem sido continuamente desvirtuado. Diz lá que os deputados representam todo o país, mas não diz que não devam defender e resolver os problemas do seu círculo. Coisa impossível com deputados que nunca lá puseram nem porão os butes a não ser numa qualquer viagem turística. Afinal o país é cada um dos seus círculos eleitorais e também o seu conjunto.
Esta situação não acabará enquanto o sistema eleitoral não for alterado. Pelo contrário, julgo até que esta obscenidade tenderá a agravar-se de acto eleitoral em acto eleitoral. A gangrena partidária já é irreversível. Tudo terminará, aliás como sempre, historicamente num acto violento. É assim que as coias mudam em Portugal. Nunca um regime se reformou. Todos eles foram violentamente removidos quando o fedor da putrefação social já era intolerável. É tudo uma questão de tempo. A Europa, aliás infelizmente também já em desagregação, não servirá de colchão para sempre. Podem não acreditar e soltar os tradicionais epítetos de catastrofista, irresponsável, radical, e outras coisas do género. Mas a história dá-me razão. E quando esse dia chegar, as regiões portuguesas não podem perder a oportunidade de se libertaram para sempre do cancro que as oligarquias cleptocratas há séculos sedeadas em Lisboa e as suas ramificações regionais representam. Será provavelmente feio de ver. Mas será definitivamente saudável.