Problemática da Delimitação Regional

As regiões deveriam ser construídas de baixo para cima, a partir dos municípios e das populações.Este facto nunca foi inteiramente entendido por alguns.

Partiu-se do princípio de que a própria eficácia e racionalidade técnica de uma delimitação regional não dependem tanto de critérios de racionalidade abstracta mas sim de, no concreto, não terem contra elas a vontade das populações.

A Constituição garantia, como vimos, até à última revisão constitucional, uma resposta que permitia evitar a sua definição centralizada, apostando antes numa definição «de baixo para cima», com base no papel dos municípios também neste domínio.

Recorde-se que a Assembleia da República não aprovaria mais do que áreas de partida. Aprovadas essas áreas, a Constituição previa que as assembleias municipais poderiam pronunciar-se no sentido de clarificar em que região administrativa pretende o município situar-se, se quer a fusão ou cisão de regiões, etc.

De qualquer modo, a região só seria instituída se a maioria das assembleias municipais, que representassem a maioria da população, se pronunciarem favoravelmente.

Por isso, o facto politicamente marcante em matéria de regionalização ao longo dos anos não foi o problema das áreas regionais que deveria ser definido num quadro flexível e aberto. Foi este facto que explicou que em iniciativas como o Congresso sobre o Alentejo, realizado no dia 6 de Maio de 1996, o factor politicamente mais marcante não tenha sido o debate acerca da área ou áreas do Alentejo (ao contrário do que noticiou boa parte da comunicação social), mas sim a existência de uma vontade firme e praticamente unânime de regionalizar.

O mesmo se verificou, aliás, em muitas outras iniciativas e debates sobre as regiões administrativas. Compreende-se: definida a vontade e as razões para regionalizar, o resto deveria ser paulatinamente construído «de baixo para cima» pêlos municípios e a participação popular, com a intervenção da comunidade científica. A esta deve sempre caber um papel essencial. O saber e a investigação acumulados têm que ser tidos em conta.

Mas a definição essencial de áreas de pessoas colectivas territoriais, com órgãos electivos, não pode ser técnica ou cientifica, embora esta contribuição tenha que existir. Tem que ser essencialmente política e assentar na mais larga participação popular.

Não existe uma dimensão ideal técnica ou cientificamente determinável para uma região, tal como não existe para um município ou um país, que possa ser sempre sustentável em democracia perante as populações.

De resto, é evidente que os critérios científicos sempre levaram os cientistas a soluções distintas. Mesmo regiões como o Algarve, consensuais entre os próprios cientistas, nem sempre tiveram os limites actuais e poderiam não ser «cientificamente aconselháveis» à luz de alguns critérios. Recorde-se, por exemplo, que não existia uma região do Algarve mas sim uma região sul quando foram criadas as regiões-plano por Marcelo Caetano em 1969; não custa admitir que, em abstracto, o Algarve fosse tido como não tendo a dimensão mínima ideal.
Mas também é evidente, sobretudo em democracia, que é politicamente insustentável a sua inexistência...

Daí que não se devam ignorar os critérios de «racionalidade territorial», que têm que ser relevantes, mas vistos num enquadramento mais vasto, que pode levar à prevalência de outras perspectivas, igualmente com a sua lógica e racionalidade próprias. Tudo sem esquecer que estamos no domínio da «arte do possível» e não num contexto autoritário, em que se optasse por estabelecer o elenco das regiões e a sua delimitação no gabinete.

Por isso, e independentemente das lutas pelo «poder de divisão» entre cientistas de que nos fala Bourdieu, num processo como o português tem que se determinar a resolução de problemas deste tipo essencialmente com o diálogo e participação de todas as partes interessadas, com destaque para as populações e os seus representantes nos órgãos autárquicos.

Luis Sá - As Regiões Administrativas

Comentários

Anónimo disse…
De acordo com os resultados para a feitura do mapa regional que foi a referendo em 98, deixou-nos a impressão de que, por vezes e nalguns casos, as Assembleias Municipais funcionam em função das pressões partidárias
"não existia uma região do Algarve mas sim uma região sul quando foram criadas as regiões-plano por Marcelo Caetano em 1969; não custa admitir que, em abstracto, o Algarve fosse tido como não tendo a dimensão mínima ideal. Mas também é evidente, sobretudo em democracia, que é politicamente insustentável a sua inexistência..."

O mesmo se passa com Trás-os-Montes e com a Beira Interior, mas parece que nem todos o querem ver...
templario disse…
"...com a intervenção da comunidade científica. A esta deve sempre caber um papel essencial. O saber e a investigação acumulados têm que ser tidos em conta."
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Com isto concordo. Começando por apurar se somos ou não um país a-regional.

Com isto concordo. Com isto concordo.
Anónimo disse…
PORTUGAL E UM PAIS PEQUENO E CONTINUO.
REGIONALIZACOES FAZEM-SE QUANDO HA 'INCONVENIENTES' GRAVES DE GEOGRAFIA E DE COMUNICACAO ENTRE O CENTRO DE PODER E ESSAS REGIOES.

EM PORTUGAL SO SE JUSTIFICA A 100%QUE SEJAM A MADEIRA E OS ACORES A TEREM GOVERNOS REGIONAIS.

TUDO O MAIS SERVIRIA APENAS PARA CRIAR TACHOS PARA UM GRUPO DE FAMINTOS POR BONS ORDENADOS E PELO PODER POLITICO. A ALGUNS QUE NESTE MOMENTO TEM O ACESSO A LISBOA ENTRAVADO!

A REGIONALIZACAOS SERIA UMA DUPLICACAO DESNECESSARIA E CARA DO QUE JA EXISTE EM LISBOA.
UM GOVERNO DE PORTUGAL CENTRALIZADO.
BEM OU MAL TEMO-LO.
O QUE SE PODE FAZER E TENTAR CRIAR MELHOR COMUNICACAO ENTRE ESSE GOVERNO E OS GOVERNADOS QUE VIVEM NOS PONTOS MAIS REMOTOS DA PATRIA.
E PARA ISSO QUE DEPUTADOS SAO ELEITOS.

PARA QUE PRECISAMOS DE TER UMA REGIONALIZACAO QUE VAI SER COPIA FIEL DO GOVERNO QUE JA EXISTE E QUE NADA ACRESCENTA OU VAI GARANTIR UMA MELHORIA DA SITUACAO PARA O POVO.

SIM, MELHORIA PARA AQUELES QUE DESSES GOVERNOS REGIONAIS FIZEREM PARTE INTEGRANTE!
DE MAIS UM ANDAR BURUCRATICO ACRESCENTADO AO JA ENORME EDIFICIO GOVERNATIVO QUE PORTUGAL POSSUI NAO PRECISAMOS.

RENATO NUNES
CAROLIONA DO SUL, E.U.A.
Anónimo disse…
Caro Renato Nunes,

Quase diria que está nos EUA para concluir uma tese de doutoramento.
Se assim é, lamento escrever -lhe que não deve conhecer bem o nosso País, para afirmar que "Portugal é um País pequeno e contínuo". Lembre-se que Portugal não uma função para poder derivar à sua inteira maneira sem qualquer consequência prática do ponto de vista político.
A seguir refere que "regionalizações fazem-se quando há 'inconvenientes' graves de geografia e de comunicação entre o centro de poder e essas regiões". Então não quer melhor justitificativo desses inconvenientes que o ancestral empobrecimento e depauperação das condições de vida dessas regiões que assinala onde a desertificação tem assentado arraiais? E a geografia do nosso País não é suficiente para garantir diversidade e indentidade regional, pelo menos em 7 Regiões Autónomas? Até me admira não ter vindo com o argumento estúpido da "dimensão crítica" de cada região. O nosso País tem dimensão e nem por isso é um País desenvolvido, não por carência de condições populacionais, históricas, culturais, geográficas, escassez de recursos, mas simplesmente pela persistência de pensamento limitado de alguns dos cidadãos que têm tido responsabilidades de governação, muito bem acolitados por compatriotas que usam os mesmos argumentos que aqui acabou de esgrimir, infelizmente.
O resto do seu argumentário é "déja vu" e apenas pode lastimar os habituais argumentos de quem não consegue ver a regionalização como um projecto político de desenvolvimento, vamos lá saber porquê. Tais argumentistas sabem isso muito bem, mas não é por razões cívicas nem de desenvolvimento.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Anónimo disse…
Caro pro-7RA.:

Mas afinal que diferenca faria uma Regionalizacao de uma DESCENTRALIZACAO do Governo Central que desse as ja existentes Autarquias mais capacidade de actuacao e maior responsabilidades a nivel local?
Se as autarquias tiverem mais poder sobre os seus destinos e sobre as taxas que sao colectadas localmente pudendo reter uma parcela significativa das mesmas para uso local --retirando ao Governo Central a possibilidade de usa-las ,como sempre tem feito , em beneficio da Capital , Lisboa --ultrapassar-se-ia uma das causas do empobrecimento de certas regioes.

Admito que possa nao estar a ver o problema pelos olhos de alguem que vive a tempo inteiro em Portugal. Mas creio que -- sabendo quanto os Portugueses adoram empregos publicos -- a Regionalizacao viria apenas criar mais camadas de burcracia em cima do enorme peso burocratico que ja hoje temos em Portugal.
No meu ponto de vista precisamos sim de menos Governo .

Renato Nunes

P.S.
Portugal e um pais bem conhecido pela qualidade dos seus Doutores e Engenheiros -- os magnificos resultados de uma Governacao sapiente por parte dessas elites intelectuais e academicas esta bem a vista! -- dai que essa da "tese de doutoramento" nos E.U.A. nao cola.
Anónimo disse…
Caro Renato Nunes,

A descentralização se não for bem especificada do ponto de vista político redundará sempre numa regionalziação administrativa, a tal do gosto de muitos dos nossos políticos e especialistas, onde se contam os tais sabedores economistas, engenheiros (mais de gabinete do que de máquinismos) e quejandos.
O gosto pelos empregos públicos é justificado por uma simples mas ponderosa razão, já que dos nossos "empreendedores", 90% são donos das empresas, 7% são patrões e 3% são bons empresários. Os primeiros tratam as empresas com um instinto de propriedade inusitado, os segundos ainda cedem a esse estatuto mas já cedem um pouco à profissionalização, os últimos são "aves raras" no nosso universo empresarial.
Por aqui já vê que o sector privado não é o Reino dos Céus como o sector público não é o terror dos Infernos. Contudo, cada um deles tem os seus "mafarricos" e de que maneira, com os resultados que se conhecem e estão à vista.
FDelicidades para a sua tese de doutoramento mas distancie-se daquilo que já observou e de que discorda.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)