Portugal tem de partir urgentemente para o debate sobre a questão da regionalização. Mas há que começar a debatê-la menos como uma questão Porto vs Lisboa: foi esta perspectiva uma das causas do seu insucesso em 1998. Digo isto, porque há uns tempos publiquei alguns comentários sobre Regionalização em blogues da Beira Interior, nomeadamente da cidade da Guarda, e não fiquei satisfeito com as respostas. Aqui vai uma de muitas, recolhida num dos mais importantes blogs da cidade mais alta do país:
"(...)devo dizer, que no referendo sobre a regionalização fiz campanha contra. As razões mantêm-se: quer económica, quer social, quer administrativamente, a criação de regiões nada resolve no nosso país. Só serviriam para criar mais uma estrutura burocrática intermédia que desse emprego ao pessoal político sem ele. Se nas autarquias abundam os caciques, com as regiões teríamos mega-caciques, tipo Jardim, Loureiro e afins. De resto, não é por nada que os grandes defensores da regionalização estão no Porto, onde não descolam do costumeiro discurso bairrista e provinciano. Essa guerra Lisboa-Porto é uma luta de galos que o resto do país olha como desdém."
A Guarda e todo o Interior têm muito a ganhar com a regionalização. Mas a perspectiva deste guardense não está totalmente errada. O Interior só terá a ganhar se lhe forem dados poderes efectivos, se for dada capacidade a quem está no terreno, a quem realmente sente as dificuldades de viver no Interior, de fazer algo para mudar esta situação. Que, repito, é muito grave: um país desequilibrado não tem futuro.
Mais do que uma questão Norte-Sul, a Regionalização tem que ser uma questão que envolva todas as regiões, e mais ainda as do Interior, que são as que mais necessitam desta reforma. Todos sabemos que em Portugal se tem tendência, quando não se centraliza, a bipolarizar tudo em torno de Lisboa e Porto. Esquecemo-nos, porém, que o país fora das áreas metropolitanas tem tanto ou mais peso do que estas. Por isso, o debate que se avizinha sobre regionalização é uma boa oportunidade para Portugal passar a ter uma visão mais abrangente sobre todo o seu território, levando o debate sobre esta questão a todo o país, a todas as regiões, ouvindo protagonistas de todos os quadrantes geográficos, e não se centrando em "paladinos" saídos das zonas metropolitanas, cujas palavras, a maioria das vezes, nada dizem à maioria dos portugueses.
Não podemos cair nos mesmos erros dos anos 90. Temos que apostar numa regionalização rápida (já estamos atrasados 30 anos), efectiva (com verdadeiros poderes dados às regiões e não com soluções baseadas em "visões administrativistas" teóricas), esclarecedora (que não se torne uma luta entre o Porto e Lisboa, mas que envolva todo o país, principalmente as regiões interiores) e, principalmente, limpa (para que, como diz guardense, não tenhamos mega-caciques e mais corrupção). Para que todos nos sintamos envolvidos na criação de um futuro para o nosso país, estejamos nós no Porto, em Lisboa, na Guarda, em Miranda do Douro, em Albufeira ou na ilha do Corvo.
Afonso Miguel
Comentários
Aquilo que propõe, e bem, não difere muito daquilo que consta na Lei-Quadro das Regiões Administrativas, que regula os órgãos das regiões, a respectiva constituição e competências.
Assim, de acordo com esse diploma, haverá os seguintes órgãos:
1- Junta Regional (poder executivo)
2- Parlamento Regional (deputados regionais remunerados apenas com senhas de presença, tal como nas Assembleias Municipais, ou seja, com custos reduzidos)
3- Governador Civil Regional (representa o Estado na Região);
A Regionalização implica, por lei, a extinção dos actuais Governos Civis distritais, e provavelmente, apesar de tal ainda não estar regulamentado, das CCDR's.
A proposta que faz para a existência de uma câmara alta constituída pelos deputados eleitos por cada região é, a meu ver, uma boa ideia, que deveria ser acautelada em futuros diplomas.
Só não concordo com o mapa (5 regiões): felizmente para os Alentejanos, a sua situação como região está salvaguardada neste mapa, mas para a Beira Interior e para Trás-os-Montes serem destacados do "centro" e do "norte", para que se possam desenvolver tendo poder real no terreno, este mapa de 5 regiões apenas pode ser encarado como um pequeno avanço. Precisamos de mais ambição na defesa dos interesses do Interior.
Cumprimentos,
Abraço
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Mas para o que entrei hoje aqui foi mesmo para desejar
um Bom Natal aos Caros A.Felizes, pró-7RA, Afonso Miguel, restantes colaboradores e participantes habituais deste blogue e seus respectivos familiares.
Um Abraço.
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Nota à margem:
A primeira, urgente e imperiosa, derrota da "classe" política portuguesa (está mesmo a pedi-las), será em torno do tema da regionalização. Aguardo com entusiasmo pelo Referendo.
Decorrente dessa derrota, assistiremos a uma transformação importante no sistema partidária (quem não soube governar bem até aqui e julga... que o faria com novos "S.Bentos" perderá a legitimidade) e pode surgir uma renovação na vida política portuguesa.
Caro Portasdolivenza,
Caros Regionalsitas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,
O que é necessário é partir para a implementação no terreno da regionalização autonómica, de preferência sem referendo e sem mais nada, fazendo dela um verdadeiro projecto político por excelência e vigente para várias legislaturas, impedindo de vez o Governo de um partido anular quase tudo o que o Governo seu antecessor de outro partido fez (bem e mal).
Quanto ao mais, formulo votos de Boas Festas e de um 2010 melhor que 2009, a todos os portugueses.
Sem mais nem menos.
Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Porque teme o referendo? Explique-se!
A profetização de um futuro negro para Beira Interior e Trás-os-Montes autónomos, é, como já o disse e justifiquei por múltiplas vezes, um argumento que falso.
Só em Portugal é que se continua a pensar que regiões pobres e pequenas se desenvolvem mais depressa dentro de regiões grandes e heterogéneas do que dando-lhes autonomia administrativa. Na Europa, há dezenas de regiões bem mais pequenas e menos povoadas que Beira Interior e Trás-os-Montes, e muitas delas eram tão ou mais pobres que estas duas antes da regionalização. Hoje, sabe-se que o processo de constituição de regiões pequenas, separando as regiões mais pobres das mais ricas, e ajudando as primeiras com incentivos ao nível nacional e europeu, é fundamental para a coesão social, económica e estrutural de um país.
Nós, portugueses, precisamos de olhar mais para os exemplos que nos chegam dos nossos parceiros europeus, principalmente em termos de regionalização.
E basta-nos olhar para casos de sucesso, em países como a Espanha, os Países Baixos, a Suíça, a Holanda ou a Itália, entre tantos outros, para repararmos que regiões pequenas coexistem com regiões muito grandes, e tiram muito mais partido da regionalização, do que áreas regionais específicas integradas em regiões grandes, como se quer propor com as soluções "norte" e "centro".
Além disso, as razões que levam a uma separação do Algarve e do Alentejo são as mesmas que levam à separação de Trás-os-Montes e Beira Interior das regiões do litoral. Qualquer mapa coerente deveria preconizar ambos os casos.
Quanto às Juntas e Assembleias Regionais, obviamente que devem ser eleitas, para bem da transparência e do poder efectivo das regiões. Caso contrário, as futuras regiões não seriam mais do que hoje são as CCDR's.
Votos de um Feliz Natal ao coordenador do blogue, António Almeida Felizes, e a todos os comentadores, em particular ao Anónimo pró-7RA, Templario e Gaiato Alentejano, sem esquecer o destinatário deste comentário, Portasdolivenza.
Um bem-haja a todos.
Não tenho receio de nada nem tenho nada a explicar a não ser corroborar os argumentos que ao longo de 2 anos aqui tenho defendido, presumivelmente com consistência, coerência e exigibilidade face às condições de desenvolvimento que a nossa sociedade necessita.
Geralmente, qualquer solicitação não tem o tom ordenatório do seu "Explique-se" mas a versão concordatária ou contraditória que exige a confirmação da primeira ou a contra-argumentação na segunda.
Por isso, sugiro-lhe a leitura de textos fundamentais para se compreender profundamente a regionalização, desde a Constituição da República Portuguesa até outros textos já aqui referidos na Ordem dos Economistas.
Quanto ao referendo, Deus acude aos seus defensores manequeistas e mais ainda aos militantes da regionalização, mesmo na versão administrativa quanto mais na autonómica.
Sem mais nem menos.
Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)