Portagens na IP5/A25: má medida para o Interior, medida errada para a economia nacional

Saiu na edição desta quarta-feira do Jornal de Negócios uma notícia que dava conta de que mais uma das auto-estradas na qual o Governo estaria a equacionar introduzir portagens seria a IP5/A25.

Será que os políticos têm noção dos impactos para a economia portuguesa de colocar portagens na A25?

Será que têm noção do que é a N16, principalmente em zonas como o Vale do Vouga (Albergaria-Vouzela), o Vale do Mondego (Celorico-Guarda), ou o Vale do Côa (Castelo Mendo-Castelo Bom). É o cúmulo considerar uma via obsoleta como esta, uma alternativa válida. Quase não se aproveita uma recta em várias zonas. Dezenas de quilómetros de curvas e contracurvas, numa estrada sinuosa e perigosa.

Se o critério de "alternativa válida" corresponde a uma estrada que possibilite que se faça o mesmo percurso demorando no máximo 1,3x mais o tempo que por auto-estrada, ainda estou para ver que piloto de fórmula 1 vão eles escolher para percorrer a N16 entre Albergaria e Vilar Formoso em menos de 2 horas...
Ou será que vai acontecer como na A42, entre Ermida (Alfena) e Lousada, em que a N207 foi considerada uma alternativa válida por... 6 segundos ???!!!

E também estou para ver que tipo de magia vão fazer para, ao abrigo dos critérios de IPCC, conseguirem dizer que a Beira Alta e a Beira Serra são "regiões ricas".

Ironia à parte, só por mero desconhecimento de causa se pode pensar numa medida destas. Em termos de rodovias, é como voltar aos anos 70, com todos os custos, não só económicos e sociais, como mesmo em termos de sinistralidade, decorrentes do facto de haver trânsito intenso, nomeadamente de pesados, numa das estradas mais perigosas do país como é a N16.

Será que a existência de uma ligação gratuita condigna a uma das regiões mais pobres do país como a Beira Serra, e à principal fronteira terrestre do país, Vilar Formoso, não é do interesse nacional? Talvez por isso seja prioritário avançar com o aeroporto de Lisboa, o TGV para Lisboa, a terceira ponte em Lisboa, a expansão do metro de Lisboa, a 2ª AE Porto-Coimbra... Enquanto para manter sem portagens a maior via de entrada e saída de produtos de Portugal por via terrestre não há dinheiro!

Os impactos desta medida são enormes, e muitos não estão à vista. Colocando portagens na A25, os produtos importados tornam-se mais caros para quem os vende, e esse custo chega rapidamente ao consumidor, ou seja, a todos nós. Por outro lado, exportar torna-se mais caro: Portugal perde ainda mais competitividade e reforça o seu carácter periférico.

Acresce ainda o facto de, para as empresas sediadas no interior, e que têm como principais mercados as áreas metropolitanas, verem os seus custos muito acrescidos em relação aos transportes. Resultado: mais falências e deslocalizações para o litoral, mais desemprego no Interior, engrossando os enormes números do desemprego nacional.

É dando "incentivos" destes que queremos pôr o Interior a produzir riqueza? Aumentando os custos reais da interioridade?

Mais ainda, é de realçar a importância cabal das auto-estradas gratuitas no interior de Portugal, já que são muitas vezes a única maneira de milhares de pessoas que residem nas vilas e aldeias destas regiões acederem a serviços públicos essenciais, como sejam escolas, centros de saúde, hospitais, câmaras municipais e outras repartições públicas. Sem alternativa ao transporte rodoviário, e sem alternativas dignas desse nome às auto-estradas, não resta mais a estas pessoas do que pagar, sentindo ainda mais na pele os custos da interioridade. Numa altura em que muito se fala em desertificação do Interior, e como fixar e atrair população para esta faixa do nosso território, seria bom que quem nos dirige tomasse consciência que são medidas como estas que contribuem para afastar ainda mais gente do Interior.

Em Portugal, é tempo de se perceber de uma vez por todas que o Interior só vai deixar de ser uma despesa se se conseguir aproveitar o seu potencial e aumentar a sua produtividade. E isso só se consegue com medidas de discriminação positiva, caso contrário o fosso agravar-se-à e os problemas aumentarão para os dois lados: interior e litoral. Um país como o nosso, que tem os problemas económicos que tem, não se pode dar ao luxo de abandonar pura e simplesmente uma tão grande parte do seu território. Isso só implica mais despesismo e menos potencial. Enquanto não se perceber isto, o nosso país vai continuar assim, na cauda da Europa...

Afonso Miguel

Comentários

Anónimo disse…
Nunca me entusiasmei com as parcerias público-privadas, independentemente do respectivo sector de actividade. Mais tarde ou mais cedo, haverá alguém que terá de pagar os desequilíbrios financeiros futuros, seja através de portagens, impostos ou seja lá do que for. Como ao nível das crises geradas sempre a partir do sistema financeiro, onde a Presidente da Repúbila Federal Suíça não esteve com meias medidas e acusou os bancos de terem sido (atenção, isto da crise ainda não acabou) os principais causadores da crise actual, denegando o levantamento do sigilo bancário naquele País, mesmo a pedido expresso dos Estados Unidos.
Relativamente à crise financeira, há uma solução simples que não passa pela estúpida penalização dos prémios ou seja lá do que for que acrescenta (diga-se, e muito) ao salário normal de um gestor bancário de topo. Tal solução assenta na seguinte especialização da actividade bancária, cada uma delas com risco de negócio totalmente diferente; será apresentada segundo o critério de risco crescente:
(a) Bancos Comerciais
(b) Bancos de Investimento
(c) Bancos de Corretagem
sem qualquer possibilidade de nenhum deles deter participações cruzadas ou recíprocas e também de os dois últimos não poderem produtos financeiros de outras empresas mas apenas dos próprios produtos que estrutura para apresentar com clareza de financiamento e remuneração nos mercados financeiros. Cada uma das tipologias de bancos deverá ter um regulador eficaz, atento e atuante a tempo de evitar males menores e nunca maiores e, caso o regulador não funcione ou funcione ineficazmente, deverá o Estado intervir sem hesitações para repôr condições de objectivas de concorrência, findo o que deverá privatizar tais instituições bancárias (as criadas pela decisão de intervenção).
Quanto à política orçamental, deveria ter em conta as diferenças entre a produtividade e o correspondente salário, havendo muita gente a ser remunerada muito para além das produtividades passada (com reflexo positivo no valor das reformas e negativo no Orçamento de Estado, de forma muito desequilibrada ao atribuirem-se remunerações a quem nunca produziu para isso) e actual (com consequências negativas no presente e no futuro, em termos orçamentais e pelas mesmas razões): aqui é muito elevado o número de situações deste tipo. Por outro lado, a grande maioria, tem uma produtividade superior ou muito superior ao salário que se diz só poder ser pago até um determinado limite, estando muitíssimos a pagar a não produtividade de muitos, num processo de agravamento das assimetrias de rendimento e de pauperização no funcionamento dos mercados de bens e serviços, tanto fora como dentro dos períodos de crise financeira e económica, constituindo os principais obstáculos ao desenvolvimento (tais obstáculos não se confinam à iliteracia ou défice de formação, porque os emigrantes são titulares de alta produtividade nas economias estrangeiras e geralmente bem elogiados pelo seu desempenho). O que temos é uma perspectiva miserabilista da economia com os resultados ancestrais de subdesenvolvimento bem à vista, cujo "turn-around" só poderá ser assegurado com um índice mais diversificado de concorrência em todos os sectores da economia, uma supervisão competente e actuante eficaz no tempo, um redimensionamento de todas as empresas que se ufanam de deter posição dominante ou perto disso, estando aqui a regionalização autonómica numa posição que podee dar uma boa ajuda a estes objectivos de não dependência da política em relação aos excessos de poder económico que nunca deverá ser público mas que o têm condicionado dramática e inexoravelmente.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Paulo Rocha disse…
Falta visão estratégica ao nosso poder político.

O que sobra em centralismo falta em políticas de descriminação positiva para o interior do país.