Coesão nacional e regionalização

Quem defende a regionalização, tem de pensar a coesão nacional. Portugal é um país extremamente coeso, com uma forte unidade linguística, cultural, social, histórica e geográfica, e o grande argumento dos adversários da regionalização é justamente a defesa da coesão nacional.

Há que reconhecer que é um argumento de peso. Nada pior para um país que divisões internas. Seria irresponsável pôr os do norte contra os do sul, os do interior contra os do litoral. Exemplos de outros países, como Bélgica, Espanha, ex-Jugoslávia, mostram quão graves são os problemas de cariz regionalista. Portanto, nisto estamos todos de acordo, a unidade nacional é um bem a preservar.


Unidade não significa todavia monolitismo. E a verdade é que sendo todos portugueses, os portugueses são minhotos, transmontanos, beirões, ribatejanos, alentejanos, algarvios. Também esta diversidade é parte integrante da identidade nacional. Desde os primórdios da nacionalidade que as gentes do reino de Portugal se dividiam geográfica e culturalmente pelas diferentes regiões do país.

Ora é este Portugal, com a sua rica diversidade de gentes e culturas, que queremos manter unido e coeso.

O que acontece hoje em dia, porém, é algo de completamente diferente. Com a terrível desertificação do interior do país, com o crescente peso demográfico das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, é um Portugal diferente que está a surgir, um Portugal com metade da população em zonas suburbanas, como Loures, Barreiro, Almada, Vila Franca, Espinho, Gondomar, e outros subúrbios. O Portugal da História, o de Trás-os-Montes, Beiras, Alentejo e Algarve, passa à história.

Quem, contra a regionalização, fala de coesão nacional já porventura pensou na tragédia que é o fecho sistemático, porque repetido todos os anos, de escolas primárias nos distritos do interior de Portugal? Porventura já se deu conta da desolação que é uma aldeia habitada por velhos? Preocupa-se porventura com a desertificação humana da maior parte do território nacional? Ora estas é que são as grandes questões da nossa identidade enquanto nação, enquanto todo coeso e unido. Unidade e coesão nacionais não significam certamente que os portugueses se concentrem todos no litoral e façam do interior do país reservas cinegéticas e parques arqueológicos.

Os adversários da regionalização receiam que a criação de regiões no interior de Portugal coloque uma parte do país sob influência espanhola. Creio que até compreendo esse receio. Mas a solução não está certamente em deslocar os portugueses para o litoral, retirando-os à influência de Espanha. Exactamente o contrário. A melhor forma de afirmar Portugal ao longo da fronteira com Espanha é colocar lá portugueses.

Regionalizar, isto é, criar centros de poder pelas regiões que historicamente sempre constituíram a identidade nacional, irá certamente contribuir para uma distribuição mais harmoniosa da população portuguesa pelo todo do território nacional. Só há verdadeira coesão nacional se houver respeito pela identidade nacional e essa identidade, volto a repeti-lo, é a identidade de um Portugal de transmontanos, minhotos, beirões, alentejanos e algarvios, e não de suburbanos histórica e culturalmente desenraizados.

António Fidalgo

Comentários

Anónimo disse…
A regionalização bem feita deveria ser tendo como base as prinvíncias históricas portuguesas. Os portugueses ainda se identificam mais com as províncias. Uma regionalização tendo como base os distritos é a continução do erro histórico feito na época salazarista quando foi retirado o poder às juntas pronvinciais.
Caro Anónimo,

Encaixa bem aqui o meu comentário a um 'post' anterior.

Sobre a Regionalização há duas grandes correntes de opinião que, pelo seu conteúdo têm uma importância acrescida. O modelo cultural (representado no 'post')suportado, maioritariamente, pelos geógrafos e outros académicos e o modelo tecnocrático defendido pelas elites políticas dos principais partidos consubstanciado nas denominadas 5 regiões-plano.

Cumprimentos,
Anónimo disse…
Caros Regionalistas,
Caros Centralistas,
Caros Municipalistas,

Não descortino como é possível falar na necessidade de coesão nacional com as assimetrias de desenvolvimento ancestrais (recuso-me a referir o índice de crescimento por ser um conceito unilateral e insuficiente), a todos os níveis, entre as regiões do litoral e as do interior, por um lado, e entre a intensa centralidade da cidade-capital e as restantes cidades do nosso País, por outro.
A diversidade a várias dimensões geográfico-regionais, referidas neste "post", nunca será um impedimento da coesão nacional que ficará definitivamente em causa com o encaminhamento da nossa sociedade para a miséria, com o acantonamento político internacional, com a especulação em vez da criação de riqueza com base na produção económica, com a instalação da corrupção, com a incultura e a má educação e, finalmente, com o turnismo político.
Será sempre perda de tempo o arranjo de paliativos para adiar ou condicionar a regionalização, tanto administrativa como, e sobretudo, autonómica.

Sem mais nem menos.

Anónimo pró-7RA. (sempre com ponto final)
Este texto de António Fidalgo é excelente, e define muito bem aquilo que é a regionalização sob a perspectiva do Interior do País. O Interior precisa da Regionalização o mais depressa possível, mas é uma regionalização que lhe dê poder efectivo, o que obviamente só se conseguirá com 7 regiões.

Mais um argumento a favor da instituição das Regiões Administrativas de Trás-os-Montes e Alto Douro e da Beira Interior que, ademais, têm como base as divisões regionais naturais de Portugal, e não critérios puramente políticos.
De facto, como diz António Fidalgo, "a verdade é que sendo todos portugueses, os portugueses são minhotos, transmontanos, beirões, ribatejanos, alentejanos, algarvios."

Mas, sendo todos portugueses, poucos são "nortenhos" ou "centrenhos", e para mais os que se dizem assim estão muito localizados em determinadas zonas geográficas.

Tudo isto só prova que o mapa de 5 regiões não tem pernas para andar: está demasiado afastado da realidade, das pessoas, do que é, afinal, Portugal!
Norte Sim, Já! disse…
Caríssimo,
pelo interesse e relevância do artigo, publiquei aqui.

Cumprimentos,
vap